quinta-feira, 28 de abril de 2011

Mantega expõe ao CDES que reservou mais 9 bi aos bancos

Na opinião do ministro, o investimento aumenta com a redução da demanda


O melhor na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) com a presidente Dilma, na terça-feira, foi a intervenção do presidente da CUT, Artur Henrique  “o Brasil tem contra si, contribuindo para valorizar o real, além da elevada taxa básica de juros – a SELIC -, a forte ascensão da liquidez internacional estimulando o ingresso de grande volume de capitais estrangeiros interessados em usufruir de elevados ganhos, em um país que apresenta poucos riscos. (…) Temos que buscar soluções para que esses recursos que hoje migram para rentistas, dirijam-se para a produção de mercadorias e serviços, gerando renda e emprego. (…) Não podemos aceitar a ideia de que é aumento de juros que combate inflação. O patamar de juros praticado no país é provavelmente a maior anomalia da economia brasileira”.

Diante de discursos aloprados (não encontramos palavra mais própria) como os do ministro Mantega e do presidente do BC, Alexandre Tombini, e dos comentários perfeitamente insignificantes do ministro Palocci, a intervenção do presidente da CUT pareceu um farol no meio de uma noite sem lua.
Já o presidente do BC declarou que “a nossa taxa de juros tem sido ajustada (…) de modo a fazer com que esse excesso de demanda seja eliminado”.

ESCASSEZ

A presidente Dilma já repelira essa ideia de jerico. Na reunião do CDES, ela afirmou que “os países emergentes (…) são pressionados por políticas de expansão intensa da liquidez internacional, geradora de desequilíbrios não só cambiais, mas, também, de desequilíbrios inflacionários. (…) um afluxo deste nível de liquidez sobre as economias em desenvolvimento, significa, necessariamente (…) uma grande pressão sobre o valor de todos os ativos”. E nem uma palavra sobre “excesso de demanda”, o que fala bem sobre a reconhecida inteligência da nossa presidente.

Temos 57 milhões de brasileiros que vivem com até um salário mínimo. Segundo o IBGE, 30,2% dos lares – 65,5 milhões de pessoas – ainda estão sob “insegurança alimentar”. Mas o sr. Tombini acha que no Brasil há “excesso de demanda” (isto é, de procura para o consumo) que necessita ser “eliminado”. Ele não acha que há dinheiro demais (R$ 195,369 bilhões em 2010, segundo o próprio BC) sendo passado aos bancos e outros especuladores, sobretudo externos, com a taxa de juros mais alta do mundo.

Tombini também não acha um problema a indústria nacional – produção e empregos dentro do país – devastada pelo câmbio distorcido que esses juros provocam, ao atrair um dilúvio de dólares que hipervalorizam artificialmente o real, provocando a invasão dos importados. O problema que ele vê é que os brasileiros querem consumir em “excesso”, malgrado milhões que não conseguem comprar um par de sapatos.

Daí, ele celebrou como sucesso da política econômica o “crescimento sustentável do sistema financeiro”. Literalmente: “A crise mostrou a necessidade de atuar com esses instrumentos para conter os riscos financeiros e permitiu o crescimento sustentável do sistema financeiro, mas sobretudo da economia global”. Ele está preocupado com a “economia global”.

Quanto à economia nacional, segundo disse, o que mostra que a demanda tem de ser reprimida é “a revisão da projeção do mercado para a inflação, divulgada pelo Boletim Focus” - isto é, o que dizem os especuladores, sequiosos por mais juros, sobre a inflação (que, aliás, está inteiramente dentro da meta aceita por ele).

O sr. Mantega iniciou sua exposição com as medidas para “moderar o crescimento” (sic), objetivo tão formidável que dispensa até fundamentação. Além da “reversão dos estímulos econômicos”, do “corte de R$ 50 bilhões nos gastos públicos”, há uma que é de cabo de esquadra: a “redução do gasto público para expandir o investimento”.

O gasto público faz parte da demanda, aliás, parte decisiva. O estímulo para expandir o investimento é, exatamente, a expansão da demanda – é para atender a demanda por produtos que se fazem os investimentos, o que é óbvio até para um simples quitandeiro: se a demanda está diminuindo, para que investir? Mas o sr. Mantega descobriu que os investimentos aumentam com a redução da demanda - isto é, com a redução do gasto público.

Nos slides que apresentou, Mantega se esmerou. Num deles está: “redução seletiva do consumo e não do investimento”. Resta saber para que alguém vai investir mais, se há cada vez menos consumo. Num outro slide: “aumento da massa salarial”. O que isso quer dizer? As pessoas querem mais salário para aumentar o seu consumo, não para reduzi-lo. Ou será que Mantega está propondo aumentar o número de trabalhadores com salários miseráveis? Mas, do ponto de vista do conjunto da economia, tanto faz: qualquer que seja a forma de aumentar a massa salarial, haveria aumento do consumo total.

Estamos diante de afirmações completamente incoerentes – e irresponsáveis. Assim, o ministro prevê que o crescimento do PIB sempre aumentará +0,5 pontos percentuais até o fim do atual mandato presidencial, exceto 2014 (4,5% este ano; 5% em 2012; 5,5% em 2013 e 2014).

Qual a base para essa previsão? Certamente, não é a política de “moderar o crescimento”. E, só por curiosidade, por que +0,5 e não +0,6 ou +0,4? E por que em 2014, ao contrário dos outros anos, o crescimento será igual ao do ano anterior? A base dessas previsões é nenhuma, exceto arrumar a média para que seja maior que a dos mandatos de Lula.

Porém, o ministro apresentou, finalmente, a prova de seu sucesso: “o resultado primário do governo central em março passado comparado com igual período de 2010, quando o país saiu de déficit de R$ 4,5 bilhões (março 2010) para superávit de R$ 9,1 bilhões (março 2011). Deste modo, apenas em três meses do ano em curso o resultado primário do governo central atingiu R$ 25,5 bilhões, bem acima dos R$ 22,9 bilhões do primeiro quadrimestre do ano passado”.

O superávit do “resultado primário” tem o nome de superávit primário. Como, hoje, todo mundo sabe que “superávit primário” é uma reserva de dinheiro público para pagar juros aos especuladores, fala-se em “superávit do resultado primário” e não em superávit primário.

DÓLAR

Com essa outra inovação – agora linguística – Mantega está se orgulhando de ter reservado R$ 9,1 bilhões para os bancos em março, isto é, R$ 13,6 bilhões a mais do que em março de 2010, quando o “resultado primário” ficou em R$ -4,5 bilhões. Não contente com essa vitória espetacular, mostrou aos conselheiros que em três meses deste ano conseguiu reservar mais para os bancos do que em quatro meses do ano passado (R$ 25,5 bilhões a R$ 22,9 bilhões). Realmente, é para isso que é preciso cortar os gastos públicos, não para aumentar o investimento.

Mas nada se comparou à sua abordagem do câmbio. Em nossa edição do dia 8 de abril, escrevemos que “o ministro afirmou que ‘se não fizéssemos nada, teríamos o dólar valendo R$ 1,50 ou menos’. É algo constrangedor lembrar que ele disse a mesma coisa quando o dólar estava chegando a R$ 1,70 e, depois, quando estava chegando a R$ 1,65. Esperemos que daqui a um mês a declaração não seja ‘se não fizéssemos nada, teríamos o dólar valendo R$ 1,40’.”

Pois é, leitor, agora que o dólar bateu em R$ 1,50, o ministro declarou, na terça-feira, 26 de abril, que “se não fosse isso [as suas medidas] o dólar já estaria abaixo de R$ 1,40”.

CARLOS LOPES

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