quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Mais verbas para a educação ou more funds for education?


Nenhum país, depois da virada para o século XX, conseguiu se desenvolver sem maciços investimentos no ensino público, especialmente no ensino universitário – assim como sem fazer da indústria nacional, privada e estatal, o centro da economia, impulsionando-a através dos investimentos públicos
Em recente encontro com estudantes, por ocasião do último Conselho Nacional de Entidades de Base (CONEB) da UNE, o ministro da Educação, nosso velho amigo Aloizio Mercadante, diante da intervenção de uma diretora da entidade, que apontou os problemas nas verbas para o ensino, em especial a não liberação do montante aprovado pelo Congresso, declarou que "não é verdade". E apresentou, ao modo de prova, que "a Folha de S. Paulo publicou que o Ministério da Educação foi o que mais gastou, 99% do orçamento".
O ministro não deveria confiar na "Folha de S. Paulo". Principalmente quando o tema é o seu Ministério. E, sobretudo, quando o único motivo da matéria da "Folha" é dizer que a presidente Dilma, em prol da "assistência social e ensino", diminuiu os gastos em infraestrutura (uma queda de 22% só nos gastos em Transporte, segundo "dados da execução do Orçamento pesquisados pela Folha ainda não oficiais" - seja lá o que isso quer dizer).
Sucintamente, é uma matéria de ataque ao governo da presidente Dilma, pois é evidente aonde se quer chegar: que os gastos com educação pública e assistência social, setores a que a reação adora dar dinheiro público, derrubaram o crescimento do país. Portanto, não se trata de um elogio ao governo. Nem ao ministro Mercadante.
O ministro, aliás, defendeu que os royalties do pré-sal sejam endereçados à Educação. Portanto, mesmo que tivesse liberado 99% das verbas aprovadas pelo Congresso para a Educação, ainda assim a situação seria periclitante.
Entretanto, vejamos quais são os dados oficiais – que vêm até novembro, pois os dados do último mês de 2012 ainda não foram divulgados.
Até 30 de novembro de 2012, o MEC havia liberado apenas 66,19% da dotação aprovada pelo Congresso (e atualizada pelo Tesouro), ou seja, a despesa liquidada foi de R$ 50.580.363.000, enquanto a dotação orçamentária era R$ 76.416.209.000 (ver tabela 1; os dados foram extraídos do "Relatório Resumido da Execução Orçamentária - Demonstrativo da Execução das Despesas por Função/Subfunção, janeiro a novembro de 2012").
Pode ser que o ministro estivesse se referindo às despesas do MEC com ensino (nem todas as despesas do MEC são com ensino). Mas é pouco provável porque os gastos do MEC com ensino foram 64,85% da dotação aprovada pelo Congresso. Portanto, fica até mais distante de 99%.
Então, vejamos a execução orçamentária pelo Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) até 31 de dezembro de 2012. O Siafi é uma espécie de livro-caixa do governo (e não um balanço, como são outros documentos do Tesouro).
Pelo Siafi, até o fim do ano passado, foram efetivamente pagos pelo MEC o correspondente a 73,37% das despesas aprovadas pelo Congresso. Ficou mais perto dos 99%, mas...
Depois de várias tentativas, descobrimos um jeito dessa conta chegar em 99%: somando a verba "empenhada" do Orçamento de 2012 com os "restos a pagar" que foram pagos (ou seja, com as despesas pagas que correspondem a orçamentos de outros anos): o resultado é, exatamente, 99,4% da verba aprovada pelo Congresso para o MEC no Orçamento de 2012.
EMPENHO
O único problema, como sabe o ministro, economista de velha cepa, é que verbas "empenhadas" não são gastos, nem pagamentos, nem investimentos. Na definição do Tesouro, são "valores do orçamento que já foram comprometidos com determinado gasto, ou seja, que já passaram pela primeira fase da execução orçamentária da despesa" (cf. "Relatório Resumido da Execução Orçamentária da União – Sintético", nov. 2012, p. 2).
Para os leitores que não estão acostumados (até porque não têm essa obrigação) ao vocabulário da contabilidade pública, eis uma breve exposição:
"A despesa pública pode ser mensurada nas distintas etapas da sua execução, que inclui, resumidamente, os atos de empenho, liquidação epagamento, explicitamente previstos na ‘Lei das finanças públicas’ de 1964. De maneira simplificada, pode-se afirmar que o empenho corresponde à reserva de dotação orçamentária para a execução da despesa e provê garantias ao fornecedor de que existe crédito orçamentário para atendê-la. A liquidaçãoocorre imediatamente após a entrega da mercadoria ou a conclusão do serviço, momento no qual o governo verifica os documentos que comprovam que o fornecedor cumpriu devidamente suas obrigações. O governo assume a existência do direito adquirido pelo credor por receber o pagamento (…). É nesta ocasião que há a transferência (formal) da propriedade do ativo fixo para a administração pública. O pagamento, por sua vez, é a última etapa, quando ocorre a emissão da ordem bancária de pagamento ou desembolso efetivo de recursos por parte da administração pública para saldar o compromisso com o credor" (C.H.M. dos Santos, R.O. Orair, S.W. Gobetti, A. dos Santos Ferreira, W.S. Rocha, H.L. da Silva, J.M. de Mello Brito, "Qual a taxa de investimento das administrações públicas no Brasil?", ANPEC 2011, grifos nossos).
Ou, senão, para explicitar ainda mais:
"Vale um breve exemplo para melhor esclarecimento. A execução de uma obra pela administração pública (no caso mais geral) se inicia com uma pré-etapa de preparação do edital e de realização da licitação. Finalizada quando se efetua o contrato, entre o governo e a empresa vencedora da licitação que ficará responsável pela obra, estabelecendo as condições e os cronogramas de obras e desembolsos. O empenho antecede o início da obra e ocorre quando há a emissão da ordem de serviço para que a empresa contratada dê início às obras. Já a liquidação ocorre após a verificação de que a obra foi concluída e as obrigações contratuais cumpridas, quando o governo assume formalmente o crédito para com a empresa e a propriedade do ativo fixo em questão. Em condições normais, o pagamento tende a ocorrer pouco tempo após a liquidação" (loc. cit., nota nº 9).
Em suma, um "empenho" é uma reserva contábil de recursos - e apenas isso. Somar verbas "empenhadas" como se fossem gastos ou investimentos é apenas ilusionismo de péssima categoria.
Nem vamos falar na soma dessas "verbas empenhadas" com os "restos a pagar" - pois estes não fazem parte do Orçamento do ano.
Realmente, o ministro não devia confiar em jornais onde, segundo dizem, não se sabe a diferença entre uma promissória e uma duplicata. Certamente, seria melhor confiar na HORA DO POVO, um jornal que sabe a diferença entre "verba empenhada", "verba liquidada" e "verba paga".
É verdade que, nas tabelas desta página, usamos "despesa liquidada" praticamente como sinônimo de "despesa paga", o que não é rigorosamente exato, mas trata-se de casos em que os documentos do Tesouro não diferenciam uma coisa da outra – e, é uma aproximação bastante razoável.
GASTOS
Mas vamos ao que mais interessa: de janeiro a novembro, o governo federal despendeu, com ensino superior, sua principal atribuição na área de Educação, R$ 14.854.292.440 (14 bilhões, 854 milhões, 292 mil e 440 reais).
Esta quantia, apesar de representar um tremendo esforço do ex-presidente Lula, que quadruplicou a verba do MEC e duplicou os recursos para o ensino universitário entre 2003 e 2010, inclusive acabando com a Desvinculação de Receitas da União (DRU) na área da Educação, ainda é muito pouco para um país do nosso tamanho, com os nossos recursos, com as nossas necessidades, e com um extenso sistema de universidades federais.
Para que não digam que estamos com má vontade, vamos somar uma complementação de R$ 586.071.000 - incluída sob a rubrica "Despesas custeadas com outras receitas para financiamento do ensino" -, mas vamos lembrar que essa quantia corresponde a apenas 41,17% da complementação aprovada pelo Congresso para o ensino universitário. Ou seja, até novembro fora liberada menos da metade dessa verba.
Assim, com essa soma, o governo despendeu R$ 15.440.363.440 até novembro, em ensino superior. Certamente, este não é o gasto total com as universidades federais, pois nem todo o gasto com elas é gasto com ensino. Por isso, fizemos um levantamento, nos dados do Siafi.
Conseguimos dados exatos de 57 instituições universitárias federais durante o ano de 2012. Devem faltar duas, segundo a conta da Andes durante a última greve de professores. Mas aquelas 57 universidades federais são uma amostra respeitável, até porque, entre elas, estão as principais instituições do país – e as principais em cada Estado.
[NOTA: Algo surpreendente na execução orçamentária é o pouco dinheiro que foi gasto com boa parte dos Centros de Educação Tecnológica do governo federal; porém, deixaremos a análise dessa parte para quando saírem os dados definitivos do Tesouro, correspondentes a 2012.]
A verba total realizada (isto é, gasta) pelo MEC com essas 57 universidades federais foi R$ 26.013.243.878 - ou seja, as despesas que não foram com ensino montaram a R$ 10,5 bilhões (sem dúvida, uma aproximação, mas com toda lógica).
Nesse cálculo não está incluída a verba dos hospitais universitários, porque não sabemos qual parcela, dentro dela, é despesa específica com ensino. No entanto, mesmo se a somássemos (+R$ 3.944.788.090, incluída a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares - EBSERH), não alteraria a qualidade do problema. Aliás, nos pareceu algo incrível que as 35 instituições hospitalares, das melhores do país, que constam do Orçamento, mais a EBSERH, tivessem tão pouca verba.
FUTURO
A questão mais estratégica é evidente: nenhum país, depois da virada para o século XX, conseguiu se desenvolver sem maciços investimentos no ensino público, especialmente no ensino universitário – assim como sem fazer da indústria nacional, privada e estatal, o centro da economia, impulsionando-a através dos investimentos públicos.
É quase cômico que alguns sujeitos que vivem berrando que a economia do país precisa de "inovações", que é preciso aumentar a "competitividade" ou a "produtividade", ao mesmo tempo sejam os mesmos que advogam a destruição, ou a esculhambação, da universidade pública e sua substituição por caricaturas de universidade, dirigidas por fundos especulativos estrangeiros.
Como é possível ter inovações, como sempre houve, sem universidades decentes, sem universidades públicas? Como, sem profissionais bem formados, haverá desenvolvimento tecnológico?
Obviamente, não haverá.
Nesse sentido, programas do tipo "Ciência Sem Fronteiras" são completamente inúteis, exceto para formatar mentes colonizadas.
É uma completa ilusão a de que os chineses ou japoneses passaram à produção de alta tecnologia (cerca de 40% das exportações chinesas, atualmente, é de produtos de alta tecnologia) porque aprenderam a fazê-los nas universidades norte-americanas.
Tanto a China, quanto antes, o Japão, só chegaram até aí por dar prioridade às suas universidades – e, de resto, às suas indústrias próprias. Vários autores já abordaram este assunto – inclusive aqui no HP, desde 1990. Portanto, há mais de 20 anos estudamos a questão.
O plano era gastar R$ 5 bilhões até 2015 para enviar 101 mil estudantes ao exterior. No entanto, até julho já se gastara R$ 2.450.536.775 com o "Ciência Sem Fronteiras" - e somente se chegara a ¼ do total de bolsas.
Com a originalidade de conceder anistia aos que resolverem não voltar ao Brasil – ou seja, o bolsista não é obrigado a devolver o dinheiro que o Estado gastou com ele. Ver a Portaria nº 141, de 28 de setembro de 2012, do presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Jorge Almeida Guimarães, onde ele decreta esse absurdo, inédito no Brasil, "considerando que a permanência de bolsista no exterior, após a titulação, desenvolvendo atividades técnico-científicas, pode ser de grande relevância para o país ou para a humanidade" (cf. Diário Oficial da União, terça-feira, 02/10/2012, pág. 8).
Por falar nisso, só algumas questões de detalhe: até agora, dos 40 países anunciados, 93,55% das 21.418 bolsas concedidas (não necessariamente implementadas) são em apenas 10 países: EUA (4.684 bolsas), Portugal (2.853), França (2.575), Espanha (2.356), Canadá (2.057), Reino Unido (1.804), Alemanha (1.653), Austrália (825), Itália (633), Holanda (596 bolsas). Não temos nada contra o turismo, mas o outro país com número apreciável de bolsas do Ciência Sem Fronteiras é o próprio Brasil (597 bolsas) – não sabemos se (já que a ciência é tão "sem fronteiras" que é preciso mandar o pessoal para além das fronteiras) alguém considerou que o Brasil é um país estrangeiro; ou se algum abnegado lembrou que estamos dentro das fronteiras do Brasil. Mas essa deve ser a parte boa do programa.
Enquanto isso, as bolsas para pós-graduação da Capes e do CNPq dentro do país beiram o ridículo, com alunos de mestrado recebendo R$ 1.350,00 e alunos de doutorado, R$ 2 mil. Já os do "Ciência Sem Fronteiras" percebem U$ 3.090 (R$ 6.254,47, ao câmbio da última segunda-feira) em nível de doutorado – e, convenhamos, para nada.
Assim, como, a la Machado, "tudo era confusão", compreende-se que o ministro Mercadante, grande ativista do "mais verbas para a educação" sob a ditadura, lance um novo e original programa, o "Inglês Sem Fronteiras" (??), e consagre o idioma de Bush, Obama e Jack, o Estripador (não o de Shakespeare), como "a língua das ciências internacionais" ("ciências internacionais"? Já que elas eram "sem fronteiras"...).
O amigo vai nos desculpar, mas há coisa mais importante – e mais interessante – para um ministro da Educação do Brasil se ocupar.
CARLOS LOPES
http://www.horadopovo.com.br/

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

80 anos da ascensão do nazismo


Por Augusto Buonicore, no sítio da Fundação Maurício Grabois:

Nunca um acontecimento na história do século 20 teve tanto impacto na elaboração tática do movimento socialista e comunista internacional quanto a ascensão dos nazistas ao poder na Alemanha, ocorrida em 30 de janeiro de 1933. Esta derrota estratégica do proletariado e das forças progressistas foi fruto mais dos erros da própria esquerda, do que dos acertos de Hitler e seus asseclas. O esquerdismo e o reformismo predominantes no seio das duas principais correntes do movimento socialista internacional, que se organizavam na Internacional Comunista e na Internacional Operária e Socialista (social-democrata), foram corresponsáveis por uma catástrofe de impacto planetário que custou dezenas de milhões de vidas humanas. A experiência alemã constitui-se numa lição que jamais poderá ser esquecida.

Em 1928 o Partido Social Democrata da Alemanha (PSDA) obteve uma grande vitória eleitoral e formou um novo governo ao lado do Partido Popular e do Partido de Centro – católico,representante da pequena-burguesia e da burguesia republicana alemã. O Partido Comunista também viu sua votação crescer. E a grande derrotada foi a extrema-direita. A República democrática alemã parecia mais fortalecida do que nunca.

A Alemanha ensaiava uma retomada do desenvolvimento econômico e a superação das crises que a atingiam sucessivamente desde o final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Esta situação criou um clima de otimismo entre parcelas importante dos trabalhadores. Mas este desenvolvimento era frágil e, em grande parte, sustentado pelos altos investimentos realizados pelo imperialismo estadunidense. Além disto, quase toda sua produção era destinada aos mercados externos, particularmente para os próprios Estados Unidos.

Apesar das aparências, a “paz social” e a democracia não eram sólidas. Existia ainda cerca de 1 milhão e meio de desempregados – fermento para a radicalização política. Neste clima, o governo social-democrata resolveu proibir as comemorações públicas do 1º de Maio. Na Prússia, o chefe da polícia e dirigente social-democrata Zörgiebel ordenou reprimir o ato promovido pelos trabalhadores comunistas, e o saldo foi 33 mortos e centenas de feridos – um acontecimento que ajudou a aumentar ainda mais o fosso existente entre socialistas e comunistas. Para os últimos a social-democracia e o fascismo passaram a ser considerados “farinha do mesmo saco”.

A crise da Bolsa de Nova Iorque, iniciada em outubro de 1929, teve efeito catastrófico na Alemanha. De repente, cessou todo ingresso de capitais estrangeiros e as portas do comércio internacional foram abruptamente fechadas. A fragilidade da economia alemã ficava assim claramente demonstrada. Centenas de indústrias faliram em pouco tempo e o índice de desemprego explodiu. No início de 1932 já existiam mais de 6 milhões de desempregados, o que representava cerca de ⅓ da força de trabalho do país.

Os grandes industriais queriam jogar o peso da crise nas costas dos trabalhadores e exigiram a diminuição de salários, o aumento da jornada de trabalho e a eliminação de direitos sociais. Uma das primeiras vítimas desta ofensiva conservadora foi o ministro das Finanças, o economista social-democrata Hilferding, destituído do cargo. O governo tentou fazer outras e maiores concessões à grande burguesia, como reduzir as pensões dadas aos desempregados, mas encontrou resistência de sua própria base parlamentar e dos sindicatos. E, em março de 1930, caiu o governo social-democrata. Melancolicamente ia chegando ao fim a República de Weimar, o curto período que vigorou a democracia parlamentar burguesa na Alemanha.

No lugar do social-democrata foi indicado um deputado do centro católico chamado Bruning. Não tendo maioria parlamentar, ele aproveitou-se de uma brecha na Constituição para governar através de decretos-lei. Dois meses depois de assumir, o governo dissolveu o Parlamento e convocou novas eleições para setembro de 1930.

O maior partido alemão continuava sendo o PSDA, que diante do novo governo conservador adotou uma “política de tolerância”. Comprometia-se a não fazer qualquer oposição, na medida em que ele se mantivesse dentro da legalidade e defendesse a República. Afinal, segundo os social-democratas, um governo Bruning ainda seria melhor do que o governo Hitler.

Durante a crise, os comunistas também conheceram um significativo crescimento. Entre 1928 e 1930 passaram de 54 para 77 deputados e, em 1932, este número subiu para 100. Aumentou rapidamente a quantidade de filiados ao PCA, com grande parte deles formada de desempregados e de jovens trabalhadores. O proletariado mais velho das grandes fábricas permaneceu sob a influência da social-democracia. Havia, assim, uma grave cisão nas fileiras da classe operária alemã.

A euforia dos comunistas levou-os a não tirar todas as consequências dos resultados eleitorais. A maior novidade não era o crescimento do PCA, mas a acentuada expansão da extrema-direita nazi-fascista. Esta elegera apenas 12 deputados em 1928, no auge da recuperação econômica alemã, e 107 em 1930. Nas eleições de julho de 1932 pulou para 230 deputados. Ou seja, obtivera bem mais que o dobro de votos que os comunistas.

A Internacional Comunista e a teoria do social-fascismo

O VI Congresso da Internacional Comunista se realizou em julho de 1928. Nele, predominou uma concepção sectária e estreita sobre a política de alianças. Abandonou-se, na prática, a política de Frente Única estabelecida nos congressos anteriores; e foi desautorizado o estabelecimento de acordos políticos com as direções dos partidos e sindicatos social-democratas. As alianças, agora, só poderiam se dar com as bases operárias destas organizações reformistas.

Às vésperas da tomada do poder pelos nazistas, o principal dirigente do PCA, Thaelman, afirmou: “uma aliança entre o PCA e o PSDA é impossível (...) por motivos de princípios”. Continuou ele: “Nós comunistas, que rejeitamos fazer qualquer coisa de comum com os chefes do PSDA, tornamos a declarar que estamos, em qualquer tempo, dispostos a uma ação antifascista com os camaradas social-democratas da Reichbanner (Bandeira imperial) e com as organizações subordinadas que queiram lutar”.

Na prática, o inimigo principal passou a ser a social-democracia. Já em 1924 Zinoviev, presidente da Internacional Comunista, chegou a definir a social-democracia como a “ala esquerda do fascismo”. Na mesma linha, Stálin afirmou: “a social-democracia é objetivamente a ala moderada do fascismo”. Em outro texto disse: “O fascismo e a social-democrata são, não inimigos, mas gêmeos”. O fato era que, historicamente, o fascismo não poderia se implantar sem destruir completamente a social-democracia. Os dois fenômenos foram, portanto, de naturezas bastante distintas. A confusão quanto a isto contribuiria para a catástrofe que se seguiria.

Nas resoluções do VI Congresso da Internacional Comunista (IC) podemos ler: “Segundo as exigências da conjuntura política, a burguesia utiliza tanto métodos fascistas como as alianças com a social-democracia. No entanto, não é estranho que esta, em particular em momentos críticos para o capitalismo, assuma feições fascistas. No transcurso de sua evolução a social-democracia revela tendências fascistas”.

O termo social-fascismo adquiriu força após o massacre no 1° de Maio de 1929. Em julho daquele ano, na X Plenária da IC, o termo apareceu oficialmente numa de suas resoluções. A XII Plenária, realizada em setembro de 1932, ainda superestimava a força da corrente revolucionária na Alemanha e subestimava o poderio nazista. Por isso, defendeu que a palavra de ordem dos comunistas deveria ser “Por uma Alemanha Socialista e Soviética!”. Nada se dizia sobre a necessidade de constituir uma frente única com a social-democracia contra o nazismo, nem propugnava palavras de ordem de transição em defesa da democracia ameaçada.

A subestimação do significado da ditadura fascista pode ser aquilatada pelo discurso do dirigente e deputado comunista Remmele no Reichstag, em 14 de outubro de 1931. Afirmou ele: “quando eles (os fascistas) estiverem no poder, a unidade da frente proletária será realizada e varrerá tudo”. Esta falsa ideia ainda seria mantida por um breve período após a tomada do poder pelos nazistas.

O avanço nazista e as esquerdas alemãs

No começo de 1932 ocorreu eleição para presidência da República. Comunistas e social-democratas saíram separados. Os comunistas obtiveram 5 milhões de votos. No entanto, os dois candidatos mais votados foram Hindenburg e Hitler. No segundo turno Hindenburg contou com o apoio declarado da social-democracia – o que lhe garantiu uma tranquila vitória. Os comunistas se abstiveram.

Em junho Hindenburg demitiu Brüning e indicou em seu lugar o barão von Pappen, político da ala direita do Partido de Centro Católico. Este revogou a interdição aos grupos paramilitares nazistas e dissolveu o Parlamento, visando a garantir maioria conservadora nas eleições. A direita no poder resolveu derrubar o governo social-democrata na Prússia, através de uma intervenção federal anticonstitucional; ou seja, através de um golpe de Estado.

O Partido Comunista, sentindo o perigo, propôs a realização de uma greve geral contra a intervenção. O Partido Social-Democrata não aceitou a proposta e capitulou sem luta. O estado da Prússia possuía um corpo policial armado de cerca de 90 mil homens, em grande parte formado por ex-operários socialistas. Existiam ainda os grupos de autodefesa comunistas chamados Combatentes da Frente Vermelha e os agrupamentos armados dos social-democratas, os Reichbanner. A resistência operária e popular poderia significar o início de uma guerra civil, aquilo que menos queriam as lideranças social-democratas. Acreditavam que qualquer resultado advindo da mobilização revolucionária das massas, vitória ou derrota, lhes seria desfavorável.

Von Papen dissolveu novamente o Parlamento e convocou eleições para novembro de 1932. Desta vez os nazistas sofreram uma importante derrota. De 13,7 milhões de votos obtidos em março cairiam para 11,7 milhões; de 230 deputados reduziriam para 196. Os comunistas subiram de 89 para 100 deputados. O PSDA baixou de 133 para 121 deputados. A somatória dos dois partidos operários ainda era maior do que a do Partido Nazista tomado isoladamente. Nos dias seguintes os nazistas conheceriam sérios reveses nas eleições para as assembleias legislativas estaduais.

Entre setembro e novembro de 1932 uma onda grevista tomou conta da Alemanha. Destacou-se a greve dos transportes de Berlim que paralisou a cidade. A manutenção do impasse político e o aumento das lutas operárias começavam a amedrontar o grande capital financeiro. Era preciso pôr fim a esta crise interminável. Era preciso instaurar a ditadura aberta. A grande burguesia passou a defender a indicação de Hitler para a chancelaria do Reich. Hindeburg então destituiu Von Papen e indicou Von Schleicher. Este, por sua vez, ficaria apenas dois meses.

Os comunistas, além de subestimar a proposta de frente única, tendiam a considerar todos os governos autoritários como fascistas. Os governos Brüning e Von Papen já eram definidos como fascistas. Esta confusão desarmava os trabalhadores. Afinal, que diferença existiria entre o governo Brüning-Papen e um governo Hitler? Nenhuma. Eram considerados variações de um mesmo tema: o fascismo. A própria social-democracia era definida como ala esquerda do fascismo. Perdeu-se de vista, assim, quem seria o inimigo principal a ser derrotado e isso impossibilitou a conquista de novos aliados, ainda que precários.

Essa confusão durou até que, em 30 de janeiro de 1933, o presidente constitucional Hindenburg nomeou Adolf Hitler para o cargo de chanceler. Assim, os bandidos nazistas chegavam ao poder dentro da legalidade burguesa, respeitando a Constituição de Weimar. Mais uma vez a social-democracia capitulou e recusou a proposta de realizar uma greve geral. Confortava-lhe a ideia de que Hitler houvesse chegado ao poder por vias constitucionais e não por um golpe de Estado, como era previsto. Afinal, os nazistas eram minoritários no novo governo formado por uma coalizão de vários partidos conservadores. Era preciso manter a ordem e a legalidade, diziam muitas lideranças socialistas. No fundo, esperavam ingenuamente derrotar a direita nas próximas eleições parlamentares.

O nazista Frick foi indicado para o Ministério do Interior e Göring para a mesma função no principal estado alemão, a Prússia. Sua primeira medida foi demitir todos os oficiais e policiais suspeitos aos olhos dos nazistas, e incorporar à polícia do Estado os membros das SA e SS, tropas de choque hitleristas. Em uma de suas primeiras ordens do dia, afirmou: “Os oficiais de polícia que utilizarem armas de fogo na execução de seu dever pode contar com todo o apoio, independentemente das consequências de seus atos”. Começava o reino do terror.

Na madrugada de 27 de fevereiro de 1933 o Parlamento Alemão (Reichstag) foi incendiado e a acusação recaiu sobre o Partido Comunista Alemão. Na mesma noite cerca de 5 mil comunistas foram presos, e vários assassinados. Montou-se um processo-farsa contra o PCA e a Internacional Comunista.

Em 5 de março, poucos dias após uma grande repressão aos comunistas, se realizaram novas eleições. As principais cidades alemãs foram tomadas de assalto pela propaganda nazista. Parecia que, da noite para o dia, haviam desaparecido os socialistas e comunistas. Não se via suas propagandas em parte alguma. O Partido Nazista conquistou 17.250 milhões de votos. No entanto, apesar da violenta repressão, a social-democracia elegeu 120 deputados e o Partido Comunista 81. O “perigo socialista” reaparecia e precisava ser extirpado de uma vez por todas. Mal acabou a apuração, no dia 9, o PCA foi colocado na ilegalidade. Vários dirigentes social-democratas também foram presos ou obrigados a se exilar.

Com a cassação de todos os deputados comunistas e de alguns social-democratas, os nazistas e seus aliados passaram a ter maioria no Reichstag e no dia 23 de março apresentaram a “Lei de Autorização” revogando de fato a Constituição ainda em vigor e autorizando o governo nazista a ditar leis, sem a necessária aprovação do Parlamento. Esta lei foi aprovada por 441 votos contra apenas 94 – isto era o que restava da bancada social-democrata.

O PSDA, buscando manter-se na legalidade a qualquer preço, fez concessões inadmissíveis. Concordou em expulsar de suas fileiras os judeus e não incorporar na sua direção os exilados. Tudo isso de nada lhe valeu. Em maio o partido e seus sindicatos foram colocados fora da lei, os deputados cassados e vários dirigentes presos. No dia 14 de julho foram dissolvidos todos os partidos políticos, salvo o Partido Nazista. A ditadura terrorista estava agora consolidada.

As lições da derrota: nascem as frentes populares

Mesmo após a vitória do nazismo, não havia por parte dos comunistas plena compreensão do que estava ocorrendo na Alemanha e continuavam com uma visão triunfalista, que não correspondia à realidade adversa. Em março um documento da Internacional Comunista afirmava: “a calma atual que se seguiu à vitória do fascismo é apenas um fenômeno transitório. O ascenso revolucionário na Alemanha crescerá inevitavelmente, apesar do terror fascista (...). A instalação da ditadura fascista aberta, destruindo todas ilusões democráticas das massas e libertando-as da influência social-democrata, acelera o ritmo do desenvolvimento da Alemanha em direção à revolução proletária.”. Para os comunistas, apesar de tudo, havia algo de positivo na vitória de Hitler: o fim das ilusões democráticas e o desmascaramento da social-democracia entre as massas. Um erro grave que, rapidamente, precisaria ser corrigido se a classe operária quisesse romper o cerco de ferro e fogo que se construía em torno dela.

Felizmente, em 1935, a Internacional Comunista realizou uma guinada de 180 graus na sua política e, no seu VII Congresso, passou a compreender melhor o real perigo que representava a ofensiva nazi-fascista e a advogar a constituição de amplas frentes de caráter democrático e popular contra essa ameaça. O nazi-fascismo passou a ser considerado o inimigo principal a ser derrotado.

O informe de Georgy Dimitrov, apresentado naquele encontro, se tornou um dos principais documentos do movimento comunista internacional e significou uma ruptura com o período anterior no qual predominava o esquematismo e o esquerdismo. Para ele, “a subida do fascismo ao poder não era uma simples mudança de um governo burguês, mas sim a substituição de uma forma estatal de dominação de classe da burguesia – a democracia burguesa – por outra das suas formas, a ditadura terrorista declarada. Ignorar essa diferença é um grave erro, que impede o proletariado revolucionário de mobilizar as mais amplas camadas de trabalhadores da cidade e do campo contra a ameaça de tomada de poder pelos fascistas, assim como tirar proveito das contradições existentes no seio da própria burguesia”.

A autocrítica comunista expressa no documento era bastante dura: “O fascismo chegou ao poder, antes de mais nada, porque a classe operária achava-se dividida, desarmada política e organicamente frente à burguesia que partia para a ofensiva. Triunfou também porque o proletariado se encontrava isolado dos aliados naturais, os camponeses e a pequena-burguesia urbana”. Continua ele: “Nas nossas fileiras (...) existia a inconcebível subestimação do perigo fascista que, até o presente momento, não foi liquidada (...). O esquerdismo entre nós já não é uma ‘doença infantil’, como dizia Lênin, mas um vício arraigado, e sem nos livrarmos dele não poderemos criar uma Frente Única. Na situação atual, o sectarismo orgulhoso, satisfeito da sua estreiteza doutrinária, satisfeito com seus métodos simplistas para tentar resolver problemas complicados sobre a base de esquemas cortados por um modelo pronto, distanciado da vida real das massas, entorpece nosso esforço de construir a Frente Popular”.

Dimitrov aproveita também para recolocar de maneira correta a relação dos comunistas com a democracia burguesa: “Nós (...) defendemos nos países capitalistas, palmo a palmo, as liberdades democrático-burguesas contra as quais atentam o fascismo e a reação. Nós não somos anarquistas e não nos pode ser, de maneira alguma, indiferente qual regime político impera num dado país; se a ditadura burguesa em forma de democracia burguesa ou a ditadura burguesa, na sua forma mais descarada, fascista. Sem deixarmos de ser partidários da democracia soviética, defenderemos palmo a palmo as condições democráticas arrebatadas pela classe operária durante anos de luta acirrada e lutaremos decididamente por ampliá-las. O proletariado de todos os países verteu muito sangue para conquistar as liberdades democrático-burguesas e, é óbvio, que lute com todas as suas forças para conservá-las”. Graças a esta nova política, advogada por Dimitrov, a Internacional Comunista, os comunistas puderam se colocar na vanguarda do movimento mundial contra o nazi-fascismo e esmagá-lo em 1945.

* Augusto Buonicore é historiador, secretário-geral da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e revolução burguesa: encontros e desencontros e Meu verbo é lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas, ambos pela Editora Anita Garibaldi.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Por que Lula não será candidato


Por Ricardo Kotscho, no blog Balaio do Kotscho:

Na falta de um candidato competitivo da oposição até agora, setores da mídia resolveram lançar dois candidatos do PT, Dilma e Lula, em mais uma tentativa de jogar um contra o outro.

Estão perdendo seu tempo. Dilma é a candidata de Lula à reeleição desde a sua vitória em outubro de 2010, quando já começavam as especulações na imprensa sobre a sua possível volta em 2014.

Numa das últimas conversas que tivemos no Palácio da Alvorada, logo após a vitória de Dilma, o então presidente Lula apresentou dois bons argumentos para justificar sua decisão de não mais disputar eleições.

"Em primeiro lugar, quem me garante que seria eleito? Em segundo lugar, se eleito, quem me garante que teria condições de fazer um bom governo e sairia com a mesma aprovação popular de agora?".

Podem chamar Lula de tudo, menos de burro. Nenhum outro presidente da República deixou o cargo com mais de 80% de aprovação depois de eleger para sucedê-lo sua ministra Dilma Rousseff, que nunca havia disputado uma eleição. Para que arriscar, se já havia passado para a História?

A alta aprovação popular de Dilma e de seu governo até agora é também uma vitória de Lula e nada indica que ele tenha mudado de posição após a nossa conversa no Alvorada.

Mil vezes ele já desmentiu a intenção de se candidatar, mas não adianta. Qualquer movimentação de Lula é apontada como tentativa de voltar em 2014.

Ainda nesta segunda-feira, este foi o tema mais tratado pelos jornalistas com os principais assessores do ex-presidente no Instituto Lula. Todos negaram que Lula tenha intenção de se candidatar na próxima eleição presidencial.

"Na disputa federal, Lula vai gastar toda sua energia para a manutenção da aliança entre PT, PMDB e PSB", disse o ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos e diretor do Instituto Lula, Paulo Vanucchi. Segundo o ex-ministro, Lula também não pretende disputar a eleição de 2018 e não se opõe a apoiar uma candidatura de aliados do PT.

Na mesma linha, o diretor-presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, também negou que Lula tenha qualquer plano de se candidatar novamente.

"A nossa candidata em 2014 chama-se Dilma Rousseff. Vamos trabalhar pela sua eleição, para que a gente continue neste governo extraordinário que, apesar das dificuldades, pode fazer muita coisa pelo Brasil.

O fato de Lula descartar qualquer candidatura, não quer dizer que ele tenha se aposentado da política.

Ao contrário, como um dos principais líderes políticos do país, Lula continua em plena atividade, como mostrou ainda hoje ao abrir o seminário sobre os rumos da América Latina promovido pelo seu instituto com a participação de membros do governo e autoridades convidadas de outros países da região.

Da mesma forma como não deixou de participar de debates e reuniões políticas aqui e no exterior, empenhando-se para valer na última campanha municipal, apesar do duro tratamento contra um câncer na laringe, Lula voltará a percorrer o país a partir de fevereiro para discutir com segmentos e grupos sociais as mudanças que ocorreram nos dez anos de governos petistas.

O que Lula quer é defender em contato direto com a população o legado do seu governo, duramente atacado pela mídia desde o julgamento do mensalão e com as revelações da Operação Porto Seguro.

Assim ele se prepara para ser, em 2014, o maior cabo eleitoral da candidatura de Dilma à reeleição. O resto é poesia ou má-fé.

O que o filme "Lincoln", de Spielberg, não diz sobre Lincoln




O filme “Lincoln”, de Steven Spielberg, que acaba de estrear no Brasil, narra como esse presidente de forte lembrança popular lutou contra a escravidão e pela transformação dos escravos em trabalhadores. O que a obra cinematográfica não conta, porém, é que Lincoln também lutou por outra emancipação: que os escravos e os trabalhadores em geral fossem senhores não apenas de sua atividade em si, mas também do produto resultante de seu trabalho.




O filme “Lincoln”, produzido e dirigido por um dos diretores mais conhecidos dos EUA, Steven Spielberg, fez reviver um grande interesse pela figura de Lincoln, um dos presidentes que, como Franklin D. Roosevelt, sempre apareceu no ideário estadunidense com grande lembrança popular. Destaca-se tal figura política como o fiador da unidade dos EUA, após derrotar os confederados que aspiravam à secessão dos Estados do Sul daquele Estado federal. É também uma figura que se destaca na história dos EUA por ter abolido a escravidão e ter dado a liberdade e a cidadania aos descendentes das populações imigrantes de origem africana, ou seja, a população negra, que nos EUA se conhece como a população afro-americana.

Lincoln foi também um dos fundadores do Partido Republicano, que em suas origens foi diretamente oposto ao Partido Republicano atual - este altamente influenciado hoje por um movimento – o Tea Party – chauvinista, racista e reacionário, por trás do qual existem interesses econômicos e financeiros que querem eliminar a influência do governo federal na vida econômica, social e política do país. O Partido Republicano fundado pelo presidente Lincoln era, pelo contrário, um partido federalista, que considerou o governo federal como avalista dos Direitos Humanos. E entre eles, a emancipação dos escravos, tema central do filme “Lincoln” e para o qual o presidente deu maior expressão. Terminar com a escravidão significava que o escravo passava a ser trabalhador, dono de seu próprio trabalho.

Lincoln, inclusive antes de ser presidente, considerou outras conquistas sociais como parte também dos Direitos Humanos e, entre elas, o direito do mundo do trabalho de controlar não só a atividade em si, mas também o produto resultante dela. O direito de emancipação dos escravos transformava o escravo em uma pessoa livre assalariada, unida – segundo ele – em laços fraternais com os outros membros da classe trabalhadora, independentemente da cor da pele. Suas demandas de que o escravo deixasse de sê-lo e de que o trabalhador – tanto branco como negro – fosse o dono não só de seu trabalho, mas também do produto de seu trabalho, eram igualmente revolucionárias. A emancipação da escravidão requeria que a pessoa fosse dona do seu trabalho. A emancipação da classe trabalhadora significava que a classe trabalhadora fosse dona do produto do seu trabalho. E Lincoln demandou os dois tipos de emancipação. O segundo tipo de emancipação, entretanto, nem sequer é citado no filme Lincoln. Na realidade, é ignorado. E utilizo a expressão “ignorado” em lugar de “escondido” porque é totalmente possível que os autores do filme ou do livro sobre o qual se baseia nem sequer conheçam a história real de Lincoln.

A Guerra Fria no mundo cultural e inclusive acadêmico dos EUA (que continua existindo) e o enorme domínio do que ali se chama a Corporate Class (a classe dos proprietários e gestores do grande capital) sobre a vida, não só econômica, mas também cívica e cultural, explica que a história formal dos EUA que se ensina nas escolas e nas universidades seja muito distorcida, purificada de qualquer contaminação ideológica procedente do movimento operário, seja socialismo, comunismo ou anarquismo. A grande maioria dos estudantes estadunidenses, inclusive das universidades mais prestigiadas e conhecidas, não sabe que a festa de 1º de Maio, celebrada mundialmente como o Dia Internacional do Trabalho, é uma festa em homenagem aos sindicalistas estadunidenses que morreram em defesa de trabalhar oito horas por dia (em lugar de doze), vitória que transformou tal reivindicação exitosa na maioria dos países do mundo. Nos EUA, tal dia, o 1º de Maio, além de não ser festivo, é o dia da Lei e da Ordem - Law and Order Day - (ver o livro People’s History of the U.S., de Howard Zinm). A história real dos EUA é muito diferente da história formal promovida pelas estruturas de poder estadunidenses.

As ignoradas e/ou escondidas simpatias de Lincoln
Lincoln, já quando era membro da Câmara Legislativa de seu Estado de Ilinóis, simpatizou claramente com as demandas socialistas do movimento operário, não só dos EUA, mas também mundial. Na realidade, Lincoln, tal como indiquei no começo do artigo, considerava como um Direito Humano o direito do mundo do trabalho de controlar o produto de seu trabalho, postura claramente revolucionária naquela época (e que continua sendo hoje) e que nem o filme nem a cultura dominante nos EUA lembram ou conhecem, que está convenientemente esquecida nos aparatos ideológicos do establishment estadunidense controlados pela Corporate Class. Na realidade, Lincoln considerou que a escravidão era o domínio máximo do capital sobre o mundo do trabalho e sua oposição às estruturas de poder dos Estados sulinos se devia precisamente a que percebia estas estruturas como sustentadoras de um regime econômico baseado na exploração absoluta do mundo do trabalho. 

Daí que visse a abolição da escravidão como a liberação não só da população negra, mas de todo o mundo do trabalho, beneficiando também a classe trabalhadora branca, cujo racismo ele via que ia contra seus próprios interesses. Lincoln também indicou que “o mundo do trabalho antecede o capital. O capital é o fruto do trabalho, e não teria existido sem o mundo do trabalho, que o criou. O mundo do trabalho é superior ao mundo do capital e merece a maior consideração (…). Na situação atual o capital tem todo o poder e há que reverter este desequilíbrio”. Leitores dos escritos de Karl Marx, contemporâneo de Abrahan Lincoln, lembrarão que algumas destas frases eram muito semelhantes às utilizadas por tal analista do capitalismo em sua análise da relação capital/trabalho sob tal sistema econômico.

Será surpresa para um grande número de leitores saber que os escritos de Karl Marx influenciaram Abraham Lincoln, tal como documenta detalhadamente John Nichols em seu excelente artículo “Reading Karl Marx with Abraham Lincoln Utopian socialists, Germam communists and other republicans” publicado em Political Affairs (27/11/12), e do qual extraio as citações, assim como a maioria dos dados publicados neste artigo. Os escritos de Karl Marx eram conhecidos entre os grupos de intelectuais que estavam profundamente insatisfeitos com a situação política e econômica dos EUA, como era o caso de Lincoln. Karl Marx escrevia regularmente no The New York Tribune, o rotativo intelectual mais influente nos Estados Unidos daquele período. Seu diretor, Horace Greeley, se considerava um socialista e um grande admirador de Karl Marx, quem convidou para ser colunista de tal jornal. Nas colunas de seu jornal incluiu grande número de ativistas alemães que haviam fugido das perseguições ocorridas na Alemanha daquele tempo, uma Alemanha altamente agitada, com um nascente movimento operário que questionava a ordem econômica existente. Alguns destes imigrantes alemães (conhecidos no EUA daquele momento como os “Republicanos Vermelhos”) lutaram mais tarde com as tropas federais na Guerra Civil, dirigidos pelo presidente Lincoln.

Greeley e Lincoln eram amigos. Na realidade, Greeley e seu jornal apoiaram desde o princípio a carreira política de Lincoln, sendo Greeley quem lhe aconselhou a que se apresentasse à presidência do país. E toda a evidência aponta que Lincoln era um fervente leitor do The New York Tribune. Em sua campanha eleitoral para a presidência dos EUA convidou vários “republicanos vermelhos” a integrarem-se a sua equipe. Na realidade, já antes, como congressista, representante da cidadania de Springfield no Estado de Ilinóis, apoiou frequentemente os movimentos revolucionários que estavam acontecendo na Europa, e muito em especial na Hungria, assinando documentos em apoio a tais movimentos.

Lincoln, grande amigo do mundo do trabalho estadunidense e internacional
Seu conhecimento das tradições revolucionárias existentes naquele período não era casual, e sim fruto de suas simpatias com o movimento operário internacional e suas instituições. Incentivou os trabalhadores dos EUA a organizar e estabelecer sindicatos antes e durante sua presidência. Foi nomeado membro honorário de vários sindicatos. Em sua resposta aos sindicatos de Nova York afirmou “vocês entenderam melhor que ninguém que a luta para terminar com a escravidão é a luta para libertar o mundo do trabalho, para libertar todos os trabalhadores. A libertação dos escravos no Sul é parte da mesma luta pela libertação dos trabalhadores no Norte”. E, durante a campanha eleitoral, o presidente Lincoln promoveu a postura contra a escravidão afirmando explicitamente que a libertação dos escravos permitiria aos trabalhadores exigir os salários que lhes permitissem viver decentemente e com dignidade, ajudando com isso a aumentar os salários de todos os trabalhadores, tanto negros como brancos.

Marx, e também Engels, escreveram com entusiasmo sobre a campanha eleitoral de Lincoln, em um momento em que ambos estavam preparando a Primeira Internacional do Movimento Operário. Em um momento das sessões, Marx e Engels propuseram à Internacional que enviasse uma carta ao presidente Lincoln felicitando-o por sua atitude e postura. Na carta, a Primeira Internacional felicitava o povo dos EUA e seu presidente por, ao terminar com a escravidão, haver favorecido a liberação de toda a classe trabalhadora, não só estadunidense, mas também mundial.

O presidente Lincoln respondeu, agradecendo a nota e dizendo que valorizava o apoio dos trabalhadores do mundo a suas políticas, em um tom cordial, que certamente criou grande alarme entre os establishments econômicos, financeiros e políticos de ambos os lados do Atlântico. Estava claro, a nível internacional que, como afirmou mais tarde o dirigente socialista estadunidense Eugene Victor Debs, em sua própria campanha eleitoral, “Lincoln havia sido um revolucionário e que, por paradoxal que pudesse parecer, o Partido Republicando havia tido, em suas origens, uma tonalidade vermelha”.

A revolução democrática que Lincoln começou e que nunca se desenvolveu
Não é preciso dizer que nenhum destes dados aparece no filme Lincoln, nem são amplamente conhecidos nos EUA. Mas, como bem afirmam John Nichols e Robin Blackburn (outro autor que escreveu extensamente sobre Lincoln e Marx), para entender Lincoln tem que entender o período e o contexto nos quais ele viveu. Lincoln não era um marxista (termo sobreutilizado na literatura historiográfica e que o próprio Marx denunciou) e não era sua intenção eliminar o capitalismo, mas corrigir o enorme desequilíbrio existente nele, entre o capital e o trabalho. Mas, não há dúvida de que foi altamente influenciado por Marx e outros pensadores socialistas, com os quais compartilhou seus desejos imediatos, claramente simpatizando com eles, levando sua postura a altos níveis de radicalismo em seu compromisso democrático. É uma tergiversação histórica ignorar tais fatos, como faz o filme Lincoln.

Não resta dúvida que Lincoln foi uma personalidade complexa, com muitos altos e baixos. Mas as simpatias estão escritas e bem definidas em seus discursos. E mais, os intensos debates que aconteciam nas esquerdas europeias se reproduziam também nos círculos progressistas dos EUA. Na realidade, a maior influência sobre Lincoln foi a dos socialistas utópicos alemães, muitos dos quais se refugiaram em Ilinóis fugindo da repressão europeia.

O comunalismo que caracterizou tais socialistas influenciou a concepção democrática de Lincoln, interpretando democracia como a governança das instituições políticas por parte do povo, no qual as classes populares eram a maioria. Sua famosa Expressão (que se converteu no esplêndido slogan democrático mais conhecido no mundo – Democracy for the people, of the people and by the people - claramente afirma a impossibilidade de ter uma democracia do povo e para o povo sem que seja realizada e levada a cabo pelo próprio povo. Daí vem a libertação dos escravos e do mundo do trabalho como elementos essenciais de tal democratização. Seu conceito de igualdade levava inevitavelmente a um conflito com o domínio de tais instituições políticas pelo capital. E a realidade existente hoje nos EUA e que detalho em meu artigo “O que não se disse nos meios de comunicação sobre as eleições nos EUA” (Público, 13.11.12)é uma prova disso. Hoje a Corporate Class controla as instituições políticas do país.

Últimas observações e um pedido
Repito que nenhuma destas realidades aparece no filme. Spielberg não é, afinal, nenhum Pontecorvo e o clima intelectual estadunidense ainda está estancado na Guerra Fria que lhe empobrece intelectualmente. “Socialismo” continua sendo uma palavra mal vista nos círculos do establishment cultural daquele país. E, na terra de Lincoln, aquele projeto democrático que ele sonhou nunca se realizou devido a enorme influência do poder do capital sobre as instituições democráticas, influência que diminuiu enormemente a expressão democrática naquele país. E o paradoxo brutal da historia é que o Partido Republicano se tenha convertido no instrumento político mais agressivo hoje existente a serviço do capital.

Certamente, agradeceria que todas as pessoas que achem este artigo interessante o distribuam amplamente, incluindo, em sua distribuição os críticos de cinema, que em sua promoção do filme, seguramente não dirão nada do outro Lincoln desconhecido em seu próprio país (e em muitos outros). Um dos fundadores do movimento revolucionário democrático nem sequer é reconhecido como tal. Sua emancipação dos escravos é uma grande vitória que deve ser celebrada. Mas Lincoln foi muito além. E disto nem se fala.


*Vicenç Navarro (Barcelona, 1937) é cientista social. Foi professor catedrático da Universidade de Barcelona e hoje dá aulas nas universidades Pompeu Fabra e Johns Hopkins. Por sua luta contra o franquismo, viveu anos exilado na Suécia. Este artigo foi publicado emhttp://blogs.publico.é/dominiopublico/6405/o-que-a-pelicula-Lincoln-não-dice-sobre-Lincoln/

domingo, 20 de janeiro de 2013

Canti Gregoriani "The Sound of Silence"

Rick Wakeman - Journey To The Centre Of The Earth, Full Concert

As oposições e suas batalhas


Por Marcos Coimbra, na revista CartaCapital:

O ano mal começou e a nova batalha das oposições, partidárias e extraparlamentares, já está em pleno andamento. Se a primeira quinzena de janeiro transcorreu assim, imagine-se o restante do ano. É fácil perceber o que as move e aonde pretendem chegar.

A espetacularização do julgamento do “mensalão” foi feita com o único objetivo de desconstruir a imagem do PT no plano moral. O que buscavam era marcar o partido e suas principais lideranças com o estigma da corrupção, a fim de erodir suas bases na sociedade.

Só quem acredita em histórias da carochinha levou a sério a versão de que a imprensa oposicionista tinha o desejo sincero de renovar nossos costumes políticos e promover a “limpeza das instituições”. Seus bons propósitos são tão verdadeiros quanto os de Pedro Malasartes, personagem de nosso folclore famoso pelo cinismo e a falta de escrúpulos.

Por maiores que tenham sido seus esforços, obtiveram, no entanto, sucesso apenas parcial na empreitada, como vimos quando as urnas da eleição municipal foram abertas. Os resultados nacionais e algumas vitórias, como a de Fernando Haddad, em São Paulo, mostraram que os prejuízos sofridos pelo PT em decorrência do julgamento ficaram aquém do que calculavam.

Essa frustração as levou ao ponto em que estão hoje. De um lado, a insistir no moralismo e na tentativa de transformar o “mensalão” em assunto permanente da agenda nacional. Querem forçar o País a continuar a debatê-lo indefinidamente, como se tivesse a importância de temas como a democracia, o desenvolvimento econômico, o meio ambiente e a educação.

De outro, a diversificar os ataques, assestando as baterias em direção a novos alvos, procurando atingir a imagem administrativa da presidenta e do governo Dilma. Por extensão, de todo o PT. Não chega a ser um projeto original. Nas disputas políticas, nenhuma novidade há em acusar os adversários, simultaneamente, de corrupção e incompetência. Em dizer que, além de se apropriar de recursos públicos, não sabem governar, e que não há, portanto, qualquer razão para apoiá-los, nem sequer o argumento do “rouba, mas faz”.

Neste início de ano, o discurso das oposições, em especial da armada midiática, é afirmar que o PT rouba e não faz.

Atravessamos os primeiros 15 dias de 2013 como se vivêssemos uma crise gravíssima e difusa, como se o Brasil estivesse na iminência da paralisia total. Quem acompanhou o noticiário só ouviu falar em problemas, gargalos e decepções.

É o inverso do que ela costuma fazer em janeiro, quando a maioria de seus leitores está de férias e pensa em outras coisas. Em vez das habituais reportagens amenas sobre a musa do verão e os preparativos para o carnaval, tudo que publicam tem um tom catastrófico.

Os mais radicais não escondem a satisfação com o fraco desempenho do PIB em 2012 e os problemas de abastecimento elétrico em diversas regiões. Ficaram algo tristes com as modestas tragédias naturais do começo do ano. Por enquanto, o que lhes resta é torcer por calamidades espetaculares.

“Pibinho”, crise de gestão, apagão, desindustrialização, inflação, desemprego, falta de ar refrigerado no Santos Dumont, a disparada no preço do tomate, tudo vai mal no Brasil, segundo a mídia oposicionista. Por culpa de Lula, que “não soube aproveitar a sorte” e “desperdiçou a herança de FHC”, e de Dilma, que é “centralizadora”, “estatista” e “antiquada”.

Batem em tudo que veem e, se não veem, inventam. Nos últimos dias, até o Bolsa Família entrou na linha de mira dos “grandes jornais”. Sem falar na raiva contra Hugo Chávez, a quem parecem detestar somente por ser amigo dos petistas – visto que nunca dedicaram aversão igual aos governantes de direita do continente.

São como os lutadores de boxe que não possuem em seu repertório um soco capaz de nocautear o adversário. Lembram os enfezados pesos-moscas orientais, que brigam desferindo a esmo diretos, cruzados, jabs e uppercuts – além de, vez por outra, golpes baixos. Funciona? Até agora, pode-se dizer que não. Apesar do coro negativista, as pessoas comuns continuam satisfeitas com o País e o governo, e esperançosas em relação ao futuro. Em recente pesquisa da Vox Populi, 68% dos entrevistados disseram esperar que a situação de suas famílias venha a melhorar nos próximos seis meses, contra 2% que temem que piore. E o mais provável é que os otimistas tenham razão.

Esta semana, outro patético esforço de mobilizar os “indignados” conseguiu colocar dez cidadãos na Avenida Paulista. Portavam cartazes pedindo “Basta!” Ficaram falando sozinhos.

Uma coisa é conseguir a adesão de meia dúzia de ministros do Supremo, a maioria já alinhada com a oposição. Outra é encher as ruas. Isso, ela nunca soube fazer.

E não consegue aprender.

O Fed, a moeda e as guerras dos EUA



MANUEL E. YEPE*
O fato de que uma elite invisível controle o governo dos Estados Unidos tem sido testemunhado desde os anos trinta do século passado por muitas personalidades em condições de fazê-lo, altos dirigentes do governo nominal incluídos.
O Fed [Federal Reserve, o Banco Central dos EUA] foi constituído como propriedade privada dos bancos membros, faz suas próprias políticas e não está sujeita a supervisão pelo Congresso ou o Presidente.
O Presidente Franklin D. Roosevelt assinalou em carta que escreveu a um assessor seu em 21 de novembro de 1933 que “a verdade da questão é, como você e eu sabemos, que o elemento financeiro tem possuído o governo desde os tempos de Andrew Jackson”.
Não por acaso afirmou-se que tudo o que se necessita para controlar efetivamente um governo é ter controle sobre o dinheiro da nação: um banco central com um monopólio da oferta de dinheiro e crédito.
O professor da Universidade de Georgetown, Carroll Quigley, que exerceu forte influência sobre o ex-presidente William Clinton, quando estudou nesse centro, considerava que o objetivo dos banqueiros que controlam os bancos centrais é “...criar um sistema mundial de controle financeiro em mãos privadas capaz de dominar o sistema político de cada país e a economia do mundo em seu conjunto...”.
Thomas Jefferson escreveu: “O Banco Central é a instituição mais mortalmente hostil aos princípios e a nossa Constituição... Se o povo norte-americano permite aos bancos privados controlar a emissão de sua moeda, primeiro pela inflação e depois pela deflação, os bancos e as corporações que crescerão em volta deles privarão o povo de todos seus bens até que seus filhos acordem sem teto no continente que conquistaram seus pais”.
Os Estados Unidos viveram sem um banco central até o início do século XX, quando, segundo o parlamentar Charles Lindbergh, “a desconfiança pela segurança do dinheiro provocou o pânico de 1907 e obrigou o Congresso a criar uma Comissão monetária nacional encabeçada pelo Senador Nelson Aldrich, sogro de John D. Rockefeller, Jr., que recomendou a criação de um banco central”.
Apesar de que a Constituição dos Estados Unidos assinala que só o Congresso deve ter a faculdade de cunhar moeda e regulamentar seu valor, em dezembro de 1913 foi aprovada a Ata da Reserva Federal, instituição constituída como propriedade privada dos bancos membros, que faz suas próprias políticas e não está sujeita a supervisão pelo Congresso ou pelo Presidente.
Embora seu papel fundamental seja o de estabilizar a economia e evitar situações de pânico no terreno financeiro, a grande depressão e numerosas recessões posteriores evidenciaram bem rápido que a Reserva Federal [Fed] produz inflação e aumenta a dívida federal quando assim o deseja, mas não aporta estabilidade.
O parlamentar Louis Mc Fadden, presidente do Comitê da banca e a moeda entre 1920 e 1931, advertiu então que “quando se aprovou a lei da Reserva Federal, o povo dos Estados Unidos não percebeu que se estava estabelecendo aqui um sistema de banca mundial. Um superestado controlado por banqueiros internacionais e industriais... atuando conjuntamente para escravizar o mundo... O Fed se esforça por ocultar seus poderes, mas a verdade é que o Fed usurpou o governo”.
Como supervisor e provedor das reservas, o Fed dá aos bancos acesso a fundos públicos, com o que estes aumentam sua capacidade de empréstimo.
Uma das faculdades mais importantes do Fed deriva de seu direito de comprar e vender valores do governo e proporcionar empréstimos aos bancos membros, pelo que também pode comprá-los. Isso lhe proporciona um mecanismo de empréstimos que incrementa a dívida pública para benefício dos bancos.
Como método para garantir o pagamento da dívida, se resolveu fazê-lo através de impostos à população. O “income tax” [imposto de renda] transladou a dívida à toda a população, mas tinha o ‘defeito’ de incluir entre os afetados os mais ricos, motivo pelo qual houve que legislar de forma tal que ficasse uma porta aberta para a evasão dos mais ricos e com essa finalidade surgiu, entre outros, o sistema das fundações isentas de impostos.
Tendo à sua disposição os meios para emprestar enormes somas ao governo (a Reserva Federal), o método para cobrar a dívida (os impostos) e um mecanismo para que os mais ricos possam evadir-se de tais impostos (as fundações), tudo o que vem faltando é a desculpa para que o governo peça novos empréstimos. E essa desculpa é proporcionada pelas guerras.

* Jornalista cubano especializado em política internacional. Escreve no Cubadebate

EUA bate recorde de suicídio de militares



   De acordo com informações do Pentágono, 349 soldados ativos do serviço militar, em todas as instâncias, cometeram suicídio em 2012, superando em 15% os 301 suicídios cometidos pelos membros das forças amadas americanas em 2011. A cifra supera as 295 baixas anunciadas pelas forças armadas no Afeganistão.
  Só no exército, em 2012, os suicídios chegaram a 182. Relatórios militares indicam que o exército americano, o maior contingente de soldados das forças armadas, cerca de 562 mil, possuem as maiores taxas, mais de 32 suicídios em cada 100 mil soldados.
  Entre os fuzileiros navais, com um efetivo superior a 202 mil, houve um incremento de 50% no número de soldados que cometeram suicídio, totalizando 48 em 2012, um índice próximo a 24 suicídios em cada 100 mil soldados. Já a marinha americana, com um efetivo de cerca de 323 mil soldados, atingiu 60 suicídios em 2012. As forças aéreas, com um efetivo de cerca de 330 mil, alcançou 59 suicídios em 2012. Tanto a força aérea quanto a marinha possuem taxas de suicídio muito próximas, cerca de 18 para cada 100 mil soldados.
  Em 2010, segundo dados da entidade dos Veteranos Americanos do Iraque e Afeganistão, os veteranos representam cerca de 20% dos 30 mil suicídios ocorridos nos EUA anualmente, que pese que apenas 1% dos americanos servem o exército. Segundo estimativas do Departamento de Veteranos das forças armadas dos EUA, um veterano comete suicídio a cada 80 minutos, ou seja, 18 veteranos ao dia.
http://www.horadopovo.com.br/