segunda-feira, 29 de abril de 2013

Veja ataca o PT e a democracia


Por Altamiro Borges

A edição desta semana da revista Veja é mais uma peça de propaganda das forças golpistas do país. Ela estampa na capa uma jovem mulher, representando o Poder Judiciário, sendo crucificada na estrela petista. A manchete é apocalíptica: “O ataque à Justiça”. A chamada é leviana: “Para escaparem da cadeia, os réus e os radicais do PT desafiam a Constituição e a harmonia entre os poderes”. Na reportagem interna, o panfleto da famiglia Civita sataniza a “República Bolivariana do Brasil”.

O motivo de tamanho terrorismo é a polêmica que se estabeleceu na semana passada entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) acerca de um projeto em tramitação sobre a fidelidade partidária. A Veja defende os ministros do STF, que não têm mandato popular e se metem em tudo, e ataca os deputados e senadores eleitos pelo povo.

A “reporcagem” é descaradamente mentirosa. Ela afirma que o suposto ataque à Justiça parte do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), que apresentou Proposta de Emenda Constitucional, a PEC-33, submetendo ao plenário do Congresso Nacional algumas decisões do STF, sobretudo as relacionadas a Ações Diretas de Inconstitucionalidade. O projeto do parlamentar é uma tentativa de resposta à crescente interferência do Judiciário em questões relativas ao parlamento. 

Em vários países do mundo, inclusive em paparicadas potências capitalistas, existem regras para a ação do Supremo – que não está acima das leis, do voto popular e de Deus. Mas para a revista Veja, que adora as ditaduras – sejam do Judiciário, dos milicos ou dos barões da mídia, em Honduras, no Paraguai, no mundo ou no Brasil –, a PEC do petista Nazareno Fonteles é uma aberração.

No editorial assinado pelo direitista e risível Eurípedes “Boimate” Alcântara, a PEC-33 é comparada à criação do Estado Novo durante o governo de Getúlio Vargas. A revista também apresenta as imagens de Cristina Kirchner, Hugo Chávez e Evo Morales – os presidentes que metem tanto medo na direita nativa e nos seus amos dos EUA. 

A manipulação é tão grotesca que a Veja evita destacar que a PEC-33 teve como relator um tucano, o senador João Campos (PSDB-GO), e que recebeu o apoio de 219 parlamentares de todos os partidos. Mais ainda: ela foi apresentada em 2011, muito antes do julgamento midiático do chamado “mensalão" - o que desmente a falsidade de que seria mais uma investida dos “réus e radicais do PT”.

A Veja não toma jeito. Ela é golpista e fascistóide. Ela ataca o PT, mas o seu alvo é a democracia. O triste é folhear esta e outras revistas da Editora Abril e encontrar tantos anúncios publicitários do governo Dilma e das empresas estatais. Parece masoquismo com dinheiro público!

domingo, 28 de abril de 2013

Foi o STF que investiu contra o Congresso



publicado em 26 de abril de 2013 às 20:09
Foi o Congresso que ameaçou, ou o STF que intimidou?
sex, 26/04/2013 – 13:00

A reação de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e de parlamentares oposicionistas à aprovação da admissibilidade da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de número 33, que define poder recursal do Congresso a leis declaradas inconstitucionais pelo STF, pode ser tirada da catalogação de fato político e inserida na lista de manipulação de informação. Com toda certeza, os ministros que estão reagindo desproporcionalmente a uma tramitação absolutamente trivial de uma emenda constitucional no Congresso, e os parlamentares que entraram com um mandato de segurança para a Câmara interromper uma tramitação de matéria constitucional, estão fazendo uso político desses fatos. Vamos a eles:

1. A emenda tramita desde 2011. Foi proposta pelo deputado Nazareno Fontelenes (PT-PI) em 25 de maio do ano passado e encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça em 06 de junho. O relator da matéria é o deputado João Campos (PSDB-GO) – um parlamentar da oposição. Não existe hipótese de a emenda ter sido uma armação de parlamentares governistas como uma retaliação ao Supremo, que condenou dois deputados que integram a CCJ e, na última semana, suspendeu a tramitação de um projeto que limita a criação de partidos no Senado. Deixando claro: os parlamentares da CCJ não tiraram uma emenda da cartola para aborrecer o STF nesse período em que se constrói um clima de conflito permanente entre Congresso e STF para validar decisões questionáveis daquela corte em assuntos de competência exclusiva do Legislativo – como a liminar dada pelo ministro Gilmar Mendes a uma ação do PSB, suspendendo a tramitação de uma lei no Senado, também na quarta-feira.

2.  Aliás, o fato de José Genoíno (PT-SP) e João Paulo Cunha (PT-SP) terem se tornado personagens dessa história comprova o uso político desse episódio. No ano passado, quando a emenda foi apresentada, Genoino sequer tinha mandato parlamentar.  Ele e Cunha apenas a votaram, como os demais integrantes da Comissão: não pediram a palavra, não defenderam a aprovação, nada. Apenas votaram a favor de um parecer de um parlamentar da oposição.

3. A PEC estava na agenda de votação da CCJ desde o início dos trabalhos legislativos, em fevereiro deste ano. Não foi agendada numa semana de conflito entre Congresso e Supremo para retaliar o Poder Judiciário simplesmente porque esperava a votação desde fevereiro.

4. A votação de admissibilidade de uma proposta de emenda constitucional, ou mesmo de lei, pela CCJ, não é uma apreciação de mérito. Quando o plenário da CCJ vota a favor da admissibilidade, não quer dizer que a maioria da Comissão concordou que essa emenda deve se tornar uma norma constitucional. Quando aprova a admissibilidade, a CCJ está dizendo que aquela proposta cumpre os requisitos de constitucionalidade para continuar a tramitação até chegar ao plenário da Câmara – onde, aí sim, o mérito da proposta será analisado, em dois turnos, para depois cumprir dois turnos no Senado. E apenas com três quintos do quórum de cada casa. Isto é: o primeiro passo da tramitação da PEC 33 foi dado na quarta-feira. Daí, dizer que o Congresso estava prestes a aprovar a proposta para retaliar o STF só pode ser piada, ou manipulação da informação.

5. Ainda assim, se uma Comissão Especial, lá na frente (se o STF não usar a força contra o Congresso para sustar a tramitação da matéria), resolver aprovar o mérito, e os plenários da Câmara e o Senado entenderem que é bom para a democracia brasileira estabelecer um filtro parlamentar para as decisões de inconstitucionalidade do STF, essa decisão apenas cumpriria preceitos constitucionais (embora Constituição esteja numa fase de livre interpretação pelos ministros da mais alta corte). Não precisa ser jurista para entender que a proposta tem respaldo na Constituição.  Foi com base em dois artigos da Carta de 1988 que os parlamentares votaram pela admissibilidade da PEC. O artigo 52, que fala da competência exclusiva do Senado Federal, diz, em seu inciso X, que o Senado pode “suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”. No artigo 49, determina que é da competência do Congresso Nacional “zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.

6. Diante dessas evidências constitucionais e da história da tramitação da PEC na Câmara, fica a pergunta: quem está ameaçando quem? É o Congresso que investiu contra o STF, ou o contrário?
Leia também:

Fonteles: PEC responde à “ferocidade autoritária” do Judiciário



publicado em 26 de abril de 2013 às 18:19
por Luiz Carlos Azenha
O deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), autor da PEC 33, reagiu hoje às críticas que recebeu de articulistas da grande mídia e do ministro do Supremo Tribiunal Federal, Gilmar Mendes.
Na Folha, por exemplo, a colunista Eliane Cantanhêde especulou que ele teria tramado uma dupla retaliação: contra a condenação dos réus do mensalão e a aprovação da união gay pelo STF.

Fonteles informou ao Viomundo que a PEC 33 tem dois anos de idade, ou seja, começou a tramitar muito antes das decisões mais recentes do STF.
Ele admite, porém, que a PEC nasceu de uma tentativa de frear invasão do Judiciário nas atribuições do Congresso.

“O Judiciário está violando a Constituição e invadindo a função legislativa já há muitos anos”, afirmou.

Citou exemplos: fidelidade partidária, verticalização das eleições, número de vereadores, cotas, células tronco embrionárias, aborto de anencéfalos, união homoafetiva, royalties do petróleo e PEC dos precatórios.

Mas, o que busca a PEC 33? Aumentar de seis para nove o número de votos necessários (entre onze ministros) para que o STF tome decisões sobre inconstitucionalidade, emendas constitucionais e súmulas vinculantes.

No caso de leis ordinárias ou complementares, os nove votos seriam suficientes.
No caso de súmulas vinculantes, o Congresso teria 90 dias para analisar a decisão do STF; se discordar, a súmula do STF se mantém mas deixa de ser vinculante, ou seja, deixa de ser imposta a tribunais inferiores.

No caso de emenda constitucional, a decisão do STF seria analisada pelo Congresso por um prazo máximo de 90 dias; em caso de discórdia, a decisão seria levada a consulta popular.

“Se um dia essa emenda vier a ser aprovada, é melhor que se feche o Supremo Tribunal Federal”, afirmou Gilmar Mendes a respeito da PEC, segundo o diário conservador Folha de S. Paulo.
Reagindo, o deputado disse que isso demonstra 

“como o Senado tem sido negligente com um ministro desses, que tem a esposa trabalhando no escritório do [advogado] Sergio Bermudes”, numa referência à possibilidade de cassação de Gilmar Mendes.

Fonteles disse que a PEC é uma forma de coibir a “ferocidade autoritária, quase fascista do Judiciário”, ao invadir a função legislativa.

Sobre a sugestão da colunista Cantanhêde de que, como “deputado cristão”, ele estaria se insurgindo contra decisões vistas como progressistas do STF — células tronco, aborto de anencéfalos e união homoafetiva, por exemplo –, o deputado disse que o STF é “um poder de origem monárquica”, que serve ao interesse conservador mas usa algumas de suas decisões para se apresentar como “moderno”.

Deu como exemplo duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs) movidas pelo ex-procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, a partir da mesma data, em 2005. Segundo o deputado, o STF decidiu sobre o uso de células tronco em pesquisas mas até hoje não se manifestou sobre os transgênicos, porque “mexe com os interesses da Monsanto”, a gigantesca transnacional do agronegócio.

O STF, segundo o petista, funciona em função das “bancas ricas de advogados, que só os ricos podem bancar”.
Trechos:

“Existem 60 milhões de processos acumulados parados nos tribunais do país, segundo o Conselho Nacional de Justiça. O que é que este pessoal quer mexendo na função dos outros se estão sendo negligentes, incompetentes e irresponsáveis no julgamento das causas, o que é seu dever constitucional?”

“Agora quer holofote? Vai atrás de voto, larga a magistratura, vai ser candidato, funda um partido e não se aproveite de uma conjuntura em que a mídia oligárquica que nós temos em boa parte deste país faz, junto com o Supremo, uma espécie de braço político auxiliar da oposição, que foi derrotada nas urnas”.



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O que o tucano relator da PEC 33 falou sobre a polêmica



publicado em 28 de abril de 2013 às 20:14
sugerido por Amália Renan Chaves, via Facebook

O SR. JOÃO CAMPOS (PSDB-GO. Sem revisão do orador.) — Sr. Presidente, apesar da exiguidade do tempo, vou procurar falar sobre dois assuntos, de forma muito breve. PEC nº 33, admitida, ontem, pela CCJ, de autoria do Deputado Nazareno Fonteles e da qual tive a honra de ser Relator.
Preocupa-me, porque setores da imprensa nem sequer leram o texto, tampouco alguns constitucionalistas, e se apressam em omitir opinião.

A PEC nº 33 não tira do Supremo Tribunal Federal nenhuma atribuição. Já ouvi manifestações, hoje, de que a PEC tira a atribuição do Supremo de julgar determinados crimes, dificulta o julgamento. Isso é uma falácia, uma mentira.

A PEC nº 33 não trata disso. A PEC nº 33 trata de estabelecer um quórum diferenciado para o julgamento de ação direta de inconstitucionalidade, que, hoje, é apenas a maioria absoluta.
Uma emenda constitucional, Deputado Amauri Teixeira, é aprovada nesta Casa e na outra, em dois turnos, por três quintos, um quórum qualificadíssimo. O Supremo pode considerá-la inconstitucional por metade mais um, ou seja, seis Ministros.

A PEC está elevando esse quórum, para ser mais qualificado, dada a importância da matéria.
Isso não fere a separação dos Poderes, o equilíbrio entre os Poderes, ao contrário, dá mais segurança jurídica e permite que o Supremo seja mais criterioso na avaliação da constitucionalidade ou não de uma matéria.

A PEC propõe que, nas hipóteses de emenda constitucional, o Supremo não possa suspender a eficácia monocraticamente. Observem: uma emenda constitucional, aprovada pela Casa, com os critérios conhecidos, pode ser contestada no Supremo por um Ministro, sozinho, que suspende os efeitos da emenda constitucional. Isso não me parece razoável.

Isso ofende o princípio da separação dos Poderes? Jamais. Isso ofende cláusula pétrea? Jamais. Isso tira a competência do Supremo? Nenhuma.
Então, estão fazendo um cavalo-de-batalha desnecessariamente. Estamos fortalecendo os pressupostos para a edição de súmula vinculante. Após isso, há algumas situações, que estão na PEC nº 33, do Deputado Nazareno Fonteles, que devem passar pelo crivo do Parlamento.

Esse ponto merece, sim, um debate mais acurado, com constitucionalistas, daí por diante. De outro lado, a PEC vai permitir um bom diálogo entre o Parlamento e o Poder Judiciário.

Vamos debater o princípio da separação dos Poderes; os mecanismos de freios e contrapesos; os princípios da legitimidade democrática; o ativismo judicial, que o Supremo vem praticando, principalmente depois de 2004, com intervenções indevidas na atividade do Poder Legislativo. Mas é um debate qualificado.

Temos certeza de que iremos aprimorar os pressupostos constitucionais de harmonia e de equilíbrio entre os Poderes. Então, quero fazer este breve registro, dada a exiguidade do tempo.
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E FIZ DO MEU JEITO...


"EU ENCAREI TUDO E CONTINUEI DE PÉ. E FIZ DO MEU JEITO"
EU AMEI, RI, CHOREI, TIVE MINHA FALHAS, MINHA PARTE DE DERROTAS..."
MAS NÃO SE AJOELHEI, E FIZ DO MEU JEITO...

As mãos dos EUA sobre a AL


Por Mark Weisbrot, no sítio da Adital:

Acontecimentos recentes indicam que a administração Obama intensificou sua estratégia de "mudança de regime" contra os governos latino-americanos à esquerda do centro, promovendo conflito de maneiras que não eram vistas desde o golpe militar apoiado pelos EUA na Venezuela em 2002.

O exemplo mais destacado é o da própria Venezuela na última semana. No momento em que este artigo está sendo impresso, Washington está mais e mais isolada em seus esforços para desestabilizar o governo recém-eleito de Nicolás Maduro.

Mas a Venezuela não é o único país vitimado pelos esforços de Washington para reverter os resultados eleitorais dos últimos 15 anos na América Latina.

Está claro agora que o afastamento do presidente paraguaio Fernando Lugo, no ano passado, também teve a aprovação e o apoio do governo dos Estados Unidos.

Num trabalho investigativo brilhante para a agência Pública, a jornalista Natalia Viana mostrou que a administração Obama financiou os principais atores do chamado "golpe parlamentar" contra Lugo. Em seguida, Washington ajudou a organizar apoio internacional ao golpe.

O papel exercido pelos EUA no Paraguai é semelhante a seu papel na derrubada militar, em 2009, do presidente democraticamente eleito de Honduras, Manuel Zelaya, caso no qual Washington dominou a Organização de Estados Americanos e a utilizou para combater os esforços de governos sul-americanos que visavam restaurar a democracia.

Na Venezuela, na semana passada, Washington não pôde dominar a OEA, mas apenas seu secretário-geral, José Miguel Insulza, que reiterou a reivindicação da Casa Branca (e da oposição venezuelana) de uma recontagem de 100% dos votos.

Mas Insulza teve de recuar, como teve de fazer a Espanha, única aliada importante dos EUA nessa empreitada nefanda, por falta de apoio.

A exigência de uma recontagem na Venezuela é absurda, já que foi feita uma recontagem das cédulas de papel de uma amostra aleatória de 54% do sistema eletrônico. O total obtido nas máquinas foi comparado à contagem manual das cédulas de papel na presença de testemunhas de todos os lados. Estatisticamente falando, não existe diferença prática entre essa auditoria enorme já realizada e a recontagem.

Jimmy Carter descreveu o sistema eleitoral da Venezuela como "o melhor do mundo", e não há dúvida quanto à exatidão da contagem.

É bom ver Lula denunciando os EUA por sua ingerência, e Dilma juntando sua voz ao resto da América do Sul para defender o direito da Venezuela a eleições livres.

Mas não apenas a Venezuela e as democracias mais fracas que estão ameaçadas pelos EUA.

Conforme relatado nas páginas deste jornal, em 2005 os EUA financiaram e organizaram esforços para mudar a legislação brasileira com vistas a enfraquecer o PT. Essa informação foi descoberta em documentos do governo americano obtidos graças à lei americana de liberdade de informação. É provável que Washington tenha feito no Brasil muito mais e siga em segredo.

Está claro que os EUA não viram o levemente reformista Fernando Lugo como um elemento ameaçador ou radical. O problema era apenas sua proximidade excessiva com os outros governos de esquerda.

Como a administração Bush, a administração Obama não aceita que a região mudou. Seu objetivo é afastar os governos de esquerda, em parte porque tendem a ser mais independentes de Washington. Também o Brasil precisa se manter vigilante diante dessa ameaça à região.

Thatcher-Reagan e o neoliberalismo: a contrarrevolução travestida de reforma e modernização


A virada de período histórico operada pelo fim da URSS, pela passagem à hegemonia unipolar dos EUA e pela hegemonia do modelo neoliberal, representou um duro golpe para a esquerda. Mais além da desaparição do sistema soviético – que, antes mesmo de se avaliar sua natureza, representava um contrapeso ao bloco imperialista –, a derrota da esquerda foi de dimensões muito maiores.

Em primeiro lugar porque a crise soviética não desembocou numa solução de esquerda – como esperavam os trotskistas e poderiam supor os social-democratas –, mas numa alternativa plenamente capitalista, de direita.

Em segundo lugar, porque trouxe com ela a desmoralização do socialismo, do Estado, da economia planificada, da política, dos partidos, das soluções coletivas, junto com a desqualificação da esquerda, do movimento sindical, do mundo do trabalho.

Alterou-se não apenas o cenário político, mas também o ideológico. Com a desaparição de alternativas, o liberalismo se impôs, carimbando seu sistema político como “a democracia”, a economia capitalista como “a economia”.

Mas a principal vitória ideológica do liberalismo renascido foi a desqualificação, como superado, de todo o ideário da esquerda, que até esse momento aparecia como a superação histórica do capitalismo. A desaparição da URSS era considerada como a negação de uma evolução histórica que levaria do capitalismo ao socialismo; surgia a teorização do fim da história, com a vitória do capitalismo e da democracia liberal.

Completou-se o quadro com a ruptura da aliança, na Europa, entre socialistas e comunistas, com aqueles aderindo ao neoliberalismo e estes ficando isolados e sem base importante de apoio popular. Na América Latina o fenômeno similar foi a adesão dos nacionalismos (mexicano, argentino) e da social-democracia (chilena, venezuelana, brasileira) ao neoliberalismo.

No plano ideológico, a direita revigorou-se, assumindo a bandeira das reformas e da modernização, agora identificadas com o mercado e contra o Estado. A esquerda ficou na defensiva, como se tivesse deixado de representar o futuro da humanidade, para representar o passado. O capitalismo assumiu ares de dinamismo, de eficácia, de modernização, enquanto o socialismo e o Estado foram projetados como arcaicos, estagnantes, antidemocráticos.

O auge do modelo neoliberal passou relativamente logo, a crise capitalista iniciada em 2008 se encarregou de terminar com o consenso das políticas econômicas neoliberais. Mas a ideologia que o acompanhou segue vigente: mercado, consumismo, soluções individuais, desqualificação da política – e, com ela, dos partidos, dos Estados e governos, dos parlamentos.

Ideologicamente, a esquerda segue na defensiva, porque não construiu uma interpretação contemporânea para disputar com a narrativa neoliberal. Mesmo os sucessos de governos latino-americanos não foram codificados em um modelo pós-neoliberal, para difundi-los. O prestígio do Lula por todo o mundo revela o potencial de uma proposta dessa ordem, mas ela não foi formulada, ainda que verbalizada pelo Lula e pela Dilma.

Vivemos um período de transição, entre um modelo velho que teima em sobreviver – e conta com o monopólio mundial dos meios de comunicação para isso – e um mundo novo, com avanços reais, mas ainda sem capacidade de formulação e menos ainda de sua difusão. 


Postado por Emir Sader às 12:10

EUA atacam ‘capitalismo de Estado’ da Ásia




Países asiáticos como China, Malásia, Vietnã e Cingapura levantaram sua econômicas com um modelo de ‘capitalismo de Estado’, em que órgãos públicos apoiam ativamente suas transnacionais. Mas esse modelo está agora sob risco diante das negociações do Acordo de Associação Trans Pacífico, um tratado comercial e de investimentos impulsionado pelos EUA e que é negociado à portas fechadas.



Numerosos livros e artigos têm se ocupado do contraste e da competição entre os atuais modelos econômicos asiático e ocidental. O exitoso modelo asiático de “capitalismo impulsionado pelo Estado” se vê agora ameaçado pelo Acordo de Associação Trans Pacífico (TPPA, na sigla em inglês).


Os países ocidentais têm, supostamente, um modelo de livre mercado baseado na competição entre empresas privadas, no qual o governo não intervém. E os países do leste asiático praticariam o “capitalismo de Estado”, no qual o governo tem um papel importante, colaborando com o setor privado nacional e no qual também numerosas empresas são total ou parcialmente de propriedade estatal.

Os países ocidentais fustigam cada vez mais o modelo asiático, argumentando que as empresas estatais contam com ajuda estatal, obtendo uma vantagem desleal frente às empresas estrangeiras que competem com elas.

China, Malásia, Vietnã e Cingapura são alguns dos países nos quais o Estado desempenha um papel fundamental. No Japão e Coreia do Sul, suas empresas nacionais cresceram até se transformarem em colossos mundiais com o apoio sistemático de seus governos. Para estes países, o chamado capitalismo de Estado (ou socialismo orientado ao mercado, no caso dos socialistas) tem funcionado bem graças a um desenvolvimento industrial e um crescimento econômico relativamente alto e contínuo.

Alguns países ocidentais tentaram frear, ou até eliminar o modelo asiático de capitalismo de Estado ou ajudado pelo Estado. Esta é uma atitude hipócrita, porque na Europa, Estados Unidos e Japão, o setor agrícola está fortemente subsidiado e protegido. Muitos de seus estabelecimentos agrários não poderiam sobreviver sem a ajuda determinante do Estado e dos altos impostos de importação. Além disso, vários de seus bancos e empresas industriais também estão subvencionados de variadas maneiras, inclusive mediante os resgates multimilionários por conta das recentes crises financeiras.

Mas isto não os impediu de atacar o modelo asiático. A última tentativa de botar-lhe freio foi através das negociações do Acordo de Associação Trans Pacífico. Este tratado sobre comércio e investimento do qual participam Estados Unidos, Canadá, Malásia, Cingapura, Vietnã, Brunei, Peru, Chile, Austrália e Nova Zelândia contém uma importante seção sobre as empresas públicas, impulsionada pelos Estados Unidos e Austrália. Como sua negociação se realiza em segredo, não se conhece ainda o texto da seção de empresas públicas, mas tudo permite pensar que muito provavelmente contenha controles para frear e dar forma ao comportamento de três tipos de empresas estatais.

Os Tratados de Livre Comércio (TLC) bilaterais recentemente concluídos pelos Estados Unidos contém um capítulo sobre a competição que se refere a dois tipos de empresas estatais. É provável que Washington proponha no Acordo de Associação Trans Pacífico algo similar ao que se estabelece no TLC com o Peru, por exemplo, em matéria de controles sobre os monopólios designados e empresas do Estado. Ali se diz que, na hora de comprar ou vender os bens ou serviços de um monopólio, os monopólios estatais atuarão exclusivamente de acordo com considerações comerciais, em particular com respeito ao preço, a qualidade, a disponibilidade e ao transporte. 

Sendo assim, deverão oferecer um tratamento não discriminatório aos investimentos, bens e serviços de outros membros do Acordo de Associação Trans Pacífico e não utilizarão sua posição monopólica para incorrer em práticas anticompetitivas através das relações com suas casas matrizes, filiais ou outras empresas de propriedade comum em um mercado não monopolizado, por tratar-se de práticas que afetam negativamente os investimentos de outros países. As empresas estatais oferecerão, igualmente, um tratamento não discriminatório na venda de bens ou serviços aos investimentos de outros países.

Mais importante ainda: Os Estados Unidos e a Austrália propõem um terceiro tipo de empresa pública que também estaria regida por controles. Segundo relatórios de imprensa, a Austrália introduziu o princípio de “neutralidade competitiva” para controlar as empresas estatais.
A forma em que se aplicará este princípio pode ser antecipada a partir das diretrizes do governo australiano sobre neutralidade competitiva, que se baseiam no conceito de “negócios de propriedade estatal”.

A empresa comercial de propriedade estatal que compita com empresas privadas pode obter vantagens que impeçam ao setor privado competir em igualdade de condições. De acordo com as diretrizes australianas, essas vantagens incluem isenções de impostos, financiamento mais barato da dívida (pela qualificação de baixo risco ou pelas garantias governamentais), não necessidade de uma taxa comercial de retorno e isenção de restrições reguladoras ou de gastos.

Para compensar estas vantagens, as diretrizes australianas estabelecem agora a forma em que as empresas estatais devem pagar os impostos em sua totalidade, como devem devolver ao governo central a diferença dos custos de seus empréstimos em comparação com os custos dos empréstimos do setor privado, o pagamento dos honorários das licenças equivalentes ao governo central e garantir que obtenham uma taxa de rentabilidade comercial.

É provável, pois, que o projeto do Acordo de Associação Trans Pacífico tenha controles para uma terceira categoria de empresas estatais, as entidades comerciais vinculadas ao governo que estejam envolvidas em atividades comerciais que competem com o setor privado. Os controles propostos poderiam estar nessa mesma linha, pela qual se recusariam as “vantagens” que têm as empresas vinculadas ao Estado, como as mencionadas nas diretrizes australianas.

Tradução: Liborio Júnior


Dias de Abril: o piloto sumiu?


Há três semanas, o conservadorismo comanda as expectativas do país. 

O carnaval do tomate e a furor rentista marcaram a segunda quinzena de abril. 

Deu certo. 

No dia 17, o BC elevou os juros.

Ato contínuo, vários indicadores desautorizaram as premissas da terapia ortodoxa. 

Os preços dos alimentos – não o único, mas um fator sazonal importante na pressão inflacionária – perderam fôlego. O do tomate desabou. 

Não apenas isso. 

O cenário internacional desandou.

Recordes de desemprego na Europa vieram se somar à deflação das commodities, ademais da decepção com a velocidade da retomada nos EUA.

Tudo a desaconselhar o arrocho pró-cíclico evocado pelos especialistas em incursões aos abismos e às bancarrotas. 

Há cinco anos eles advertem que a resistência do Brasil à crise é um crime contra o mercado. (Leia também: ‘O Brasil é um crime contra o mercado’)

Nenhuma voz do governo ou do PT soube salgar o diagnóstico conservador com a salmoura pedagógica das evidências opostas.

Dilma poderia ter ido à TV. É sua responsabilidade esclarecer a opinião pública quando o futuro do país esta sendo ostensivamente jogado na sarjeta das manipulações.

Não significa mistificar os problemas de uma transição macroeconômica difícil rumo a um novo ciclo de investimento. 

Mas, sim, separa-los de interesses que não são os da nação. 

As ferramentas macroeconômicas não tem partido. 

Mas a forma de combina-las, a dose e a direção, dependem de opções políticas mediadas pela correlação de forças. 

Um pedaço da correlação de forças se define no diálogo com a sociedade.

Disputar as expectativas, em certos momentos, é tão decisivo quanto ajustar as linhas de passagem entre um ciclo e outro. 

Um governo que toma decisões ancorado em diálogo direto com suas bases, e apoiado por elas, irradia uma capacidade de comando que desencoraja o assalto conservador. 

Se Lula ficasse mudo em 2008, o jogral pró-cíclico faria do Brasil um imenso Portugal . 

O quadro hoje é outro?

Sempre é outro. 

É para isso que existe governo. Se a história fosse estável e previsível , bastariam burocracias administrativas. 

Veio a terceira quinzena de abril. 

Enquanto o PT se preocupa com Eduardo Campos, o verdadeiro partido oposicionista alimentava um clima de dissolução institucional. 

É só aquecimento: o lacerdismo togado e seu diretório midiático podem muito mais. 

A pauta da ‘caça ao Lula’ voltou às manchetes.

Grunhida pela boca do casal Roberto Gurgel e esposa, sub-procuradora Claudia Sampaio. 

Estamos em linha com a nova tradição latino-americana.

A implosão institucional de governos progressistas tem no lacerdismo togado um laboratório de ponta no país.

São sucessivas as contribuições ao modelo.

Na desta semana, o STF desautorizou o Congresso a analisar a PEC sobre novos partidos, subtraindo espaço do Legislativo na divisão dos poderes. 

A ideia de um Judiciário que diga ao Congresso o que ele pode e o que ele não pode discutir e votar é estranha à democracia. 

Mas não ao método conservador, que pauta um Brasil cada vez mais explícito, à direita, em seus duetos e sintonias .

Respira-se a certeza da impunidade associada à supremacia asfixiante do poder de difusão conservador.

Avulta daí a progressiva desenvoltura de personagens que se dispensam do recato e da liturgia observada nos velhos conspiradores. 

Joaquim Barbosa se manifesta como uma extensão de Merval Pereira. 

E vice-versa. 

Gurgel acossa Lula e agasalha o líder de Carlinhos Cachoeira no Congresso, Demóstenes Torres, com uma aposentadoria de R$ 22 mil. 

E ninguém dá gargalhadas. 

Como diz o senador Requião, falta humor à crítica política. 

Falta também capacidade de se escandalizar.

Um delegado ex-integrante do aparato da ditadura diz que Otávio Frias e Sergio Fleury eram parceiros de teoria e prática. 

Tomavam chá das cinco no DOPS. 

Dá para acreditar? 

Dá para ter certeza de que as veladas ligações entre o dispositivo midiático e a ditadura precisam ser investigadas. Por uma comissão de verdade.

Quem se dispõe? 

Silêncio constrangedor.

O ministro Mercadante defende a Folha e o ‘seu’ Frias – como ele se refere ao falecido pai de Otavinho, em nota tocante. (Leia o artigo demolidor de Paulo Nogueira, do blog do Centro do Mundo; nesta pág.)

Toffoli, ministro do Supremo, dá ultimato à Câmara: os representantes do povo tem 72 horas para explicar o que estão pretendendo com a PEC-33 que determina que algumas decisões do STF sejam submetidas ao Congresso e eleva de seis para noves votos o quórum do Supremo ao invalidar emendas constitucionais do Legislativo. 

Paulo Bernardo alia-se ao oligopólio da mídia . 

A Secom sustenta a Globo. 

E o sub do sub do Banco Central vai discursar no Banco Itaú, espécie de diretório informal do PSDB. Prega o choque de juros.

O piloto sumiu.

Esse filme não é novo.

E nunca acaba bem.

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* Texto retificado e atualizado em 27/04, às 11hs31

GOVERNADOR RJ ESQUECE PROFESSORES



O golpe da informação


Por Mauro Santayana, em seu blog:

Há 48 anos, quando o Brasil vislumbrava reformas constitucionais necessárias a seu desenvolvimento, os Estados Unidos financiaram e orientaram o golpe militar. E interromperam uma vez mais um projeto nacional proposto em 1930 por Vargas. Os acadêmicos podem construir teses sofisticadas sobre a superioridade dos países nórdicos para explicar o desenvolvimento da Europa e dos norte-americanos e as dificuldades dos demais povos em acompanhá-los, mas a razão é outra. Com superioridade bélica, desde sempre, impuseram-se como conquistadores do espaço e saqueadores dos bens alheios, os quais lhes permitiram o grande desenvolvimento científico e militar nos séculos 19 e 20 e sua supremacia sobre o resto do mundo.

Pode-se ver a origem do golpe de 1964 mais próxima uma década antes. Em 1953, diante da resistência de Getulio, que quis limitar as remessas de lucros e criou a Petrobras e a Eletrobras para nos dar autonomia energética, a ação “diplomática” dos Estados Unidos cercou o governo. Com o aliciamento de alguns jornalistas e dinheiro vivo distribuído aos grandes barões da imprensa da época, construiu a crise política interna. Entre a lei que criou a Petrobras e a morte de Getúlio, em 24 de agosto de 1954, o Brasil viveu período conturbado igual aos três anos entre a renúncia de Jânio e 1964.

A propósito do projeto de Getúlio, seria importante a tradução no Brasil de um livro no qual essa operação é narrada em detalhes:The americanization of Brazil – A study of US cold war diplomacy in the third world, 1945-1954. Um estudo sobre a diplomacia norte-americana para o Terceiro Mundo em tempos de Guerra Fria. O autor, Gerald K. Haines, é identificado pela editora SR Books como historiador sênior a serviço da CIA, o que lhe confere toda a credibilidade.

Haines mostra como os donos dos grandes jornais da época foram “convencidos” a combater o monopólio estatal, até mesmo com textos produzidos na própria embaixada, no Rio. E lembra a visita ao Brasil do secretário de Estado Edward Miller, com a missão de pressionar o governo a abrir a exploração do petróleo às empresas norte-americanas. O presidente da Standard Oil nos Estados Unidos, Eugene Holman, orientou Miller a nos vender a ideia de que só assim o Brasil se desenvolveria. Mas o povo foi às ruas e obrigou o Congresso a impor o monopólio.
A domesticação dos meios de informação do Brasil começara ainda no governo Dutra. Os norte-americanos usaram as excelentes relações entre os intelectuais e jornalistas e o embaixador Jefferson Caffery, nos meses em que o Brasil decidira por aliar-se aos Estados Unidos na luta contra o nazifascismo, em benefício de sua expansão neocolonialista.
A criação da Petrobras levou os ianques ao paroxismo contra Vargas, e os meios de comunicação acompanhavam a histeria norte-americana. A estatal era vista como empresa feita com o amadorismo irresponsável dos ignorantes.

A morte de Vargas não esmoreceu os grupos que tentaram, em 11 de novembro do ano seguinte, impedir a posse de Juscelino. O golpe de Estado foi frustrado pela ação rápida do general Teixeira Lott. Em 1964, a desorganização das forças populares favoreceu a vitória dos norte-americanos, que voltaram a domesticar a imprensa e o Parlamento e manipularam os chefes militares brasileiros.

Os êxitos do governo atual e a nova arregimentação antinacional contra a Petrobras – agora com o pré-sal – devem mobilizar os trabalhadores que não estão dispostos a viver o que já conhecemos. Sabem que a situação internacional tende para a direita, e não podemos repetir apenas que o povo esmagará os golpistas. É necessário não só exercer a vigilância, mas agir, de forma organizada e já, para promover a unidade nacional em defesa do desenvolvimento de nosso país.