domingo, 21 de dezembro de 2014

Os comunistas venceram

Maurício Dias: 

Dentro de poucos dias, o Brasil dará um passo em direção à modernidade do Maranhão, hoje um estado nordestino em decadência. Os maranhenses estão prestes a perder a condição de súditos de uma oligarquia para se tornarem cidadãos de uma unidade federativa de fato.

Por Maurício Dias*, na Carta Capital


Reprodução Folha online
Em seu discurso de diplomação, Flávio Dino prometeu trabalhar para diminuir as desigualdades sociaisEm seu discurso de diplomação, Flávio Dino prometeu trabalhar para diminuir as desigualdades sociais
Pouco ou muito? Na prática, isso significará o fim da dinastia comandada por José Sarney, que, favorecido por fatalidade, no caso a morte de Tancredo Neves, tornou-se o 20º presidente do Brasil entre 1985 e 1990, por eleição indireta.

Demorou essa mudança de status do Maranhão. Uma demora angustiante, mas absolutamente normal em um país onde quase tudo ocorre em movimentos lentos, sem transformações bruscas. A história do Brasil, como anotou, insatisfeito, o jornalista republicano Silva Jardim (1860-1891), “parece puxada a charrete”.

No dia 5 de outubro, a charrete avançou um pouco mais rápido. O ex-juiz federal, ex-deputado federal e professor universitário Flávio Dino, também filiado ao PCdoB e filho de um ex-deputado cassado pela ditadura, acusado de ser comunista, pôde finalmente, abraçado ao pai e ao histórico líder camponês Manoel da Conceição, também vítima do regime militar, comemora: “Os comunistas venceram”.

Não se assuste, pessoal! Isso foi tão somente uma boa ironia dos vencedores com os adeptos de um mundo que ruiu. Tardou, mas aconteceu.

Aos 92 anos de vida, o PCdoB elegeu o seu primeiro governador, derrubando uma oligarquia quase cinquentenária. Mas ela mantém intactos alguns tentáculos poderosos. Ela domina, por exemplo, quase todo o sistema de comunicação do estado. Os Sarney, nesse capítulo, cederam um pouco aos aliados. A família Lobão é um deles. Representada no poder por Edison Lobão, ministro de Minas e Energia de Dilma, e o filho dele, alcunhado Lobinho, que, apoiado oficialmente pelo PT, perdeu a disputa para o governo estadual. Governava então Roseana Sarney.

Pouco antes da eleição, entrevistado pela tevê local, a Mirante, afiliada da Globo, Flávio Dino foi surpreendido com a pergunta inusitada do entrevistador: “Se vencer, o senhor vai implantar o comunismo no Maranhão?”

Em resposta à provocação, Dino prometeu implantar a democracia e mudar os porcentuais hediondos dos indicadores sociais alimentados pelo descaso dos governos dos últimos 50 anos. Ou seja, a família Sarney essencialmente.

Eis alguns exemplos: o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) está emparelhado com o Brasil de 1980. Lá está a segunda pior expectativa de vida do país e, também, o segundo maior índice de mortalidade infantil. Esse é um pequeno retrato do flagelo ao qual o IBGE acrescentou, na terça-feira (16) mais um dado: o Maranhão tem menos da metade da população com alimentação garantida.

O feito de Flávio Dino e aliados “não foi algo simples ou fácil e até desafiou a lógica política de um estado marcado pelo patrimonialismo que sustenta o poder familiar de José Sarney desde 1965”, anota o governador eleito.

A esperança não tinha morrido. Adormecia. Despertou então desse longo pesadelo. Os maranhenses, por quase 64% dos votos, “proclamaram a República”. É outra forma usada por Dino para comemorar a vitória, ocorrida numa das mais pobres regiões do país.

A vitória foi construída, segundo o governador eleito, e um terreno no qual “eram visíveis as rachaduras no bloco oligárquico, que teve dificuldades em definir o projeto e sentiu o peso da rejeição popular”.

O sentimento antioligárquico, manifestado em vários momentos no Maranhão, ampliou-se. A história dessa disputa é muito mais longa e variada. De qualquer forma, mesmo em algumas linhas, o desfecho será igual ao de um relato mais longo. O final feliz.


http://www.vermelho.org.br/

sábado, 20 de dezembro de 2014

POSSE PREFEITO DE ITAGUAI - LUCIANO MOTA





PROMESSAS DO PREFEITO DO PSDB NO DIA DA POSSE

Prefeito de Itaguaí RJ fala no dia de sua posse.
Prefeito Luciano Motta é suspeito de liderar uma quadrilha que assaltava os cofres públicos e envolvia secretários da prefeitura e empresários locais. Com base nas provas já coletadas da chamada "Operação Gafanhoto", os agentes cumpriram 11 mandados de busca e apreensão e dois de condução coercitiva. O roubo seria de até R$ 30 milhões por mês, através de licitações fraudulentas, contratos irregulares, "laranjas" e funcionários fantasmas. A receita mensal da prefeitura é estimada em R$ 90 milhões.

Prefeito playboy do PSDB sairá na Globo?

Por Altamiro Borges

Manchete do jornal carioca 'O Dia' desta sexta-feira (19): "PF acaba com a farra do prefeito playboy". Na foto da capa, a festança dos habitantes da pequena cidade de Itaguaí, na região metropolitana do Rio de Janeiro, e a legenda: "Moradores recebem com aplausos e até rojões os agentes que fizeram a devassa na prefeitura de Itaguaí. O prefeito Luciano Motta (PSDB) não foi encontrado... Conhecido por ostentar roupas caras, carro importado e até helicóptero, o tucano é acusado de chefiar esquema de desvios de R$ 30 milhões por mês". Será que o caso terá destaque no JN da TV Globo? Estadão, Folha e Veja darão manchete? Ou, na sua seletividade, a mídia tucana simplesmente abafará o escândalo?

Segundo as investigações da Polícia Federal, Luciano Motta é suspeito de liderar uma quadrilha que assaltava os cofres públicos e envolvia secretários da prefeitura e empresários locais. Com base nas provas já coletadas da chamada "Operação Gafanhoto", os agentes cumpriram 11 mandados de busca e apreensão e dois de condução coercitiva. O roubo seria de até R$ 30 milhões por mês, através de licitações fraudulentas, contratos irregulares, "laranjas" e funcionários fantasmas. A receita mensal da prefeitura é estimada em R$ 90 milhões. 

"Todo o material apreendido, como documentos que comprovam bens de alto valor adquiridos com dinheiro público, vai anexado aos autos como novas provas dos desvios", relatou o delegado Hylton Coelho, da Polícia Federal. Em setembro, na primeira fase da investigação, a PF já havia apreendido dois carros de luxo adquiridos pela quadrilha - inclusive uma Ferrari, avaliada em R$ 1,5 milhão. Na lista dos bens do grupo criminoso também havia um helicóptero Robinson R-66, cujo valor de mercado pode chegar a R$ 2 milhões. 

A suspeita de uso indevido de recursos públicos surgiu após denúncias anônimas. Um ex-segurança do prefeito se tornou peça-chave nas investigações. Ele ajudou com filmagens e fotos a comprovar parte do esquema que mostrava gastos exorbitantes de Luciano Motta. Ele teria adquirido dez ternos da grife alemã Hugo Boss num famoso shopping da Barra da Tijuca. Pela renovação do guarda-roupa foram gastos R$ 45 mil. A compra foi feita pelo ex-segurança. O jornal carioca descreve que o estilo de vida do prefeito tucano era o de um bon vivant

Na ação dos agentes da PF na quinta-feira, o prefeito playboy não foi encontrado. Ele sumiu da cidade. Será que aparecerá na mídia tucana? A conferir!

Dinheiro público sustenta barões da mídia


Por Paulo Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:

O que é pensar com cabeça tumultuada?

Considere o texto do jornalista Fernando Rodrigues, do UOL, sobre as despesas de estatais com publicidade, por exemplo.

Rodrigues gasta um artigo inteiro para analisar 17 milhões de reais de publicidade oficial que foram dar, em 2013, em sites que não pertencem às grandes empresas jornalísticas, como o 247, o Conversa Afiada e o GGN.

(O DCM não está na lista.)

E Rodrigues consegue ignorar coisas como os mais de 5 bilhões que caíram no colo da Globo entre 2002 e 2013. Isso com audiências sempre cadentes na tevê.

Não notou também a Abril. Mesmo com um jornalismo sempre destrutivo e desonesto em seu carro-chefe, a Veja, as estatais colocaram 500 milhões de reais em anúncios no período.

Fernando Rodrigues olhou o tostão e ignorou o milhão, ou bilhão, para usar a célebre expressão de Jânio Quadros.

O que levou Rodrigues a uma análise tão parcial?

Uma hipótese é que ele simplesmente não tenha enxergado o problema.

Outra hipótese é que ele tenha levado em conta sua carreira. Ele pode ter sentido que liquidaria suas chances de trabalhar na Globo – Globonews e CBN abrigam vários jornalistas com o mesmo perfil – se escrevesse o que tinha que ser escrito.

Pode ter pensado que mesmo no UOL as coisas poderiam se complicar, dado que os donos, os Frias, são sócios dos Marinhos no Valor Econômico.

Como quer que seja, ele foi nos pequenos e ignorou os grandes – os tubarões, como a eles se referiu Mujica ao falar da Lei de Meios que começa a ser discutida no Uruguai.

Publicidade oficial é uma discussão complexa, sem dúvida. Nos países mais avançados, ela se concentra em campanhas de claro interesse público.

No Brasil, em todas as esferas – federal, estadual e municipal – a propaganda oficial serviu, desde a ditadura militar, para enriquecer os donos das empresas em troca de cobertura favorável.

O apogeu disso se deu com a Globo na ditadura. Roberto Marinho transformou um pequeno jornal numa grande empresa comandada pela TV Globo graças às mamatas que lhe foram dadas em troca de apoiar o regime.

Não foi apenas propaganda copiosa, mas empréstimos em bancos oficiais e outros favores – sempre com o dinheiro público.

Com o PT houve uma mudança unilateral.

As estatais continuaram a anunciar intensamente nas grandes empresas de jornalismo.

Só que estas – que sempre deram em troca cobertura amistosa – passaram a atacar cada vez mais ferozmente a mão que as abastecia.

Nada disso foi notado por Fernando Rodrigues, e seria uma surpresa se fosse diferente.

SOROS COMPRA, NA BAIXA, MEGALOTE DE PETROBRAS

TESTEMUNHO FOGUEIRA SANTA: De Desempregado à Prefeito - Universo da Fé



MILAGRE COMPROVADO NA IGREJA UNIVERSAL

Para uma criatura descrente como eu, absolutamente céptico em relação às centenas de milagres apresentados todas as noites nos canais abertos de TV que se vendem aos modernos vendilhões dos templos protestantes, finalmente assisti a um milagre comprovado da Igreja Universal do Reino de Deus.
O cara chegou à fogueira santa desempregado, possuído pelo demônio e devendo 800 reais. Logo depois, segundo seu próprio testemunho no vídeo abaixo, conseguiu o milagre: deu 100 mil reais para a IURD e colocou um caminhão e um carro de luxo no altar.
Além disso, elegeu-se prefeito afirmando que iria estar a serviço de Jesus. E, beirando o fundamentalismo religioso, disse mais: “Acredito em um Deus vivo. Nesse mandato é Ele que está à frente, nos guiando. Ele é o Deus do impossível”

É por essas e outras que eu prefiro ser um quase ateu, graças a Deus.


http://muriqui-lacerda.blogspot.com.br/

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Decisão histórica: EUA anunciam reaproximação diplomática com Cuba

EUA, Cuba e a vitória do Brasil


Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

Depois de passar meio século em operações sombrias para derrubar o governo nascido da revolução de Sierra Maestra por todos os meios ao alcance do império, Washington tomou uma medida de acordo com o estágio de civilização criado pela formação dos Estados Nacionais, lá pelos séculos XVIII-XIX.

Anunciado ontem, o reatamento de relações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba tem uma utilidade suplementar no Brasil: coloca em seu devido lugar o anti-comunismo primitivo que fez uma grande aparição na da última campanha presidencial.






Tornou-se ainda mais agradável, agora, dar boas risadas diante do folclore diplomático que permitiu Aécio Neves, em pleno século XXI, atacar os “médicos cubanos” que tratam da população pobre do Brasil como se fossem agentes disfarçados do Comintern dos Partidos Comunistas dos anos 30.

Mais divertido ainda é lembrar o tom de ironia provinciana, empregado para falar dos investimentos - com retorno óbvio para o país - no porto de Mariel: “Finalmente a presidente Dilma inaugurou a primeira grande obra de seu governo, pena que em Cuba“.

Para os brasileiros, está claro que o porto de Mariel não foi apenas um bom negócio para empresas brasileiras - será o principal ponto de vendas de Cuba para os Estados Unidos, que irão crescer cedo ou tarde -, e ajudou a criar e manter empregos no país, e acima de tudo traduziu uma visão diplomática acertada.

Apesar de seu caráter essencialmente risível, que a colocou de braço dado com os exilados de Miami, a postura do PSDB refletiu o conservadorismo de matriz norte-americana que tornou-se fonte recente de inspiração de largas fatias do partido. Nascida nos ninhos à direita do Partido Republicano, essa visão alimenta o extremismo conservador dos exilados de Miami. Prega um tratamento agressivo do governo de Raul Castro, fecha portas a toda negociação produtiva e propõe o isolamento forçado do regime, inclusive pela manutenção de um embargo odioso, na perspectiva de uma restauração da economia de mercado capaz de eliminar vestígios e conquistas da revolução.

Numa postura em linha de continuidade com a escola diplomática civilizada, que prega o respeito a soberania dos povos como o princípio básico para a convivência pacífica entre países, o governo Lula-Dilma fez a aposta inversa. Cansou de tomar porrada de sábios que dão plantão na TV.

Vê-se agora quem estava com a razão - num debate que tem raízes em nosso passado político, também.

O rompimento dos Estados Unidos com o regime de Fidel Castro sempre será lembrado como um lance grave e decisivo na história do Continente. Está na origem do apoio de Washington ao ciclo de ditaduras militares latino-americanas, inclusive o golpe de 64 que derrubou João Goulart.

Convencido - de verdade - que a revolução de Fidel poderia transformar-se num exemplo a ser seguido em países de maior peso geo-político e potencial econômico, quebrando o domínio dos EUA sobre a região, a Casa Branca deu um curso de natureza colonial a sua diplomacia, aos negócios e às operações militares. Formulou estratégias de desenvolvimento dependente. Construiu programas para formação de lideranças políticas em suas universidades. Abriu o cofre para promover investimentos junto a aliados que se mostrassem fiéis e mobilizou agências de publicidade para garantir uma cobertura favorável nos jornais.

Acima de tudo, Washington abandonou os próprios pruridos democráticos, ajudando a erguer ditaduras notórias pela crueldade. O que estava em jogo, em toda parte, era enfraquecer a soberania de cada país - e era por esse critério que a Casa Branca escolhia aliados e inimigos.

No livro” João Goulart, “o historiador Jorge Ferreira explica que João Goulart não passou a ser considerado um inimigo regional por Washington em função de seu discurso à esquerda, nem por causa da reforma agrária, nem mesmo pelos interesses das empresas norte-americanas ameaçados pela lei de remessa de lucros. O problema, avalia o historiador, ocorreu em 1962, um ano depois da fracassada invasão da baía dos Porcos, promovida pela CIA. John Kennedy “escreveu uma carta a João Goulart, propondo a invasão da ilha, com a participação do militares brasileiros.” 

Contrariado, Jango respondeu que o Brasil sempre reconheceu a todos os países “independente de seus regimes ou sistemas de governo, o direito de soberanamente se autodeterminarem.” Indo um pouco além, Jango insistiu no “legítimo direito de Cuba se defender de possíveis agressões, partissem de onde partissem.” Em função dos mísseis soviéticos, Jango concordou com o bloqueio militar a Cuba mas sua oposição a toda intervenção militar levou Kennedy a se afastar definitivamente do presidente brasileiro. “A posição brasileira na crise dos mísseis foi intolerável para Kennedy,” escreve Jorge Ferreira.

Durante uma visita ao país, na mesma época, o Secretário de Justiça Robert Kennedy, irmão do presidente americano, propôs “financiamento em troca de alinhamento político.” Também disse que a Casa Branca temia que a política externa brasileira se tornasse “sistematicamente antiamericana”e, sem maiores pudores, reclamou em tom de acusação que Jango mantinha “comunistas” no governo. Também mostrou-se preocupado com o esforço do governo brasileiro em ampliar seu comércio com países do bloco socialista. Ofendido, Goulart deixou claro que eram assuntos que diziam respeito ao próprio país, “não comportando interferências de nações estrangeiras. ”

Medidas banais de cooperação de Jango, como uma estação de energia a óleo diesel que Goulart mandara de presente para os cubanos - uma espécie de porto de Muriel de meio século atrás, não é mesmo? - reforçaram no presidente norte-americano a certeza de que o próprio Jango se tornara “um perigo para a segurança nacional” dos Estados Unidos.

Não custa notar que essa postura independente não assegurou a Jango um tratamento preferencial por parte do governo cubano. Uma das crises mais desconcertantes daquele período envolveu a descoberta de que, apesar dos gestos simpáticos do presidente, Havana sustentava, com armas, dinheiro e treinamento, grupos armados que pretendiam iniciar guerrilhas contra seu governo.

Foi nesse ambiente que Washington e Havana romperam relações diplomáticas. Carlos Lacerda, o mais estridente adversário civil de Goulart, definiu a derrota da invasão da baia dos Porcos, apenas três meses depois da posse de Kennedy, como uma “catástrofe para o mundo livre”. Num texto escrito para apresentar um livro que reunia vários discursos do presidente americano, Lacerda apontou o dedo para Fidel e perguntou: “o que fazer diante deste provocador internacional?” Após o golpe de 64, como se sabe, o Brasil rompeu relações com Cuba, que só seriam retomadas após a democratização.

Não é difícil identificar as raízes ideológicas de quem passou os últimos anos no camarote de onde só partiam críticas a diplomacia brasileira, vamos combinar.

Cabe registrar, de qualquer modo, um dado interessante. Obama tomou posse falando em aproximar-se de Cuba e chegou a prometer novas relações no Continente num encontro diplomático em Trinidad-Tobago, um de seus primeiros eventos internacionais. Em seguida, recolheu-se à aquele universo morno que tem mercado seus dois mandatos.

O reatamento de relações diplomáticas merece aplauso, ainda que a preservação do embargo seja lamentável.

É obrigatório notar que, neste período, o Brasil consolidou-se como principal líder regional naquela parte da América que se encontra abaixo do Rio Grande. Enquanto o México era aplaudido pela adesão ao Nafta, o Brasil ocupou um lugar próprio, reconhecido pelos principais vizinhos. Tornou-se interlocutor e mediador de conflitos, ocupando um espaço que a diplomacia norte-americana deixara vazio. Aproximando-se de Cuba, Barack Obama faz um novo movimento no tabuleiro do continente americano. O futuro dirá as consequências deste lance.

Históricas declaraciones de Raúl Castro sobre las relaciones con EE.UU. ...





Compatriotas:


Desde a minha eleição como Presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros, já reiterou em várias ocasiões, a nossa vontade de apoiar o governo do diálogo respeitoso Estados Unidos, com base na igualdade soberana, para discutir diferentes temas reciprocamente sem prejuízo da independência nacional e da autodeterminação de nossos povos.

Esta é uma posição que foi expressa ao Governo dos Estados Unidos, público e privado, pelo camarada Fidel em diferentes épocas da nossa longa luta, com a abordagem de debater e resolver as diferenças através de negociações sem abrir mão de um de nossos princípios.

Heróico povo cubano têm demonstrado contra os perigos grandes, ataques, dificuldades e sacrifícios, é e será fiel a nossos ideais de independência e justiça social. Intimamente unidos nestes 56 anos de Revolução, temos mantido profunda lealdade para com os que caíram defender estes princípios desde o início de nossas guerras de independência em 1868.

Agora nós carregamos, apesar das dificuldades, atualizando nosso modelo econômico para construir um socialismo próspero e sustentável.

O resultado de um diálogo ao mais alto nível, incluindo uma conversa telefônica que tive ontem com o presidente Barack Obama, fez progressos na abordagem de algumas questões de interesse para ambas as nações.

Como Fidel prometeu, em junho de 2001, quando ele disse, vai voltar!, Chegou em nosso país hoje, Gerardo, Ramón e Antonio.

A alegria de suas famílias e todos os nossos povos, que se mobilizaram incansavelmente para esse fim, que se estende entre as centenas de comités e grupos de solidariedade; governos, parlamentos, organizações, instituições e personalidades que durante estes 16 anos e árduos esforços feitos exigidos para a sua libertação. Todos eles expressar nossa mais profunda gratidão e compromisso.

Esta decisão do Presidente Obama merece o respeito e reconhecimento do nosso povo.

Quero agradecer e reconhecer o apoio do Vaticano, e, especialmente, o Papa Francisco, a melhoria das relações entre Cuba e os Estados Unidos. Da mesma forma, o Governo do Canadá para as instalações criadas para a realização do diálogo de alto nível entre os dois países.

Por sua vez, decidimos lançar e enviar para os Estados Unidos para um espião cubano que serviu nessa nação.

Além disso, com base em razões humanitárias, hoje foi também retornou ao seu país cidadão norte-americano Alan Gross.

Unilateralmente, como é a nossa prática e estrita adesão ao nosso sistema legal, receberam benefícios correspondentes presos criminais, incluindo a liberação de pessoas para as quais o Governo dos Estados Unidos já manifestou interesse.

Da mesma forma, estamos de acordo para o restabelecimento das relações diplomáticas.

Isso não quer dizer que a principal coisa é resolvido. O bloqueio econômico, comercial e financeiro causado enorme humano e prejuízos econômicos para o nosso país deve cessar.

Embora as sanções foram convertidos em lei, o presidente dos Estados Unidos pode modificar seu aplicativo usando seus poderes executivos.

Propor ao Governo dos Estados Unidos tomar medidas para melhorar o clima de investimento bilateral e avançar para a normalização das relações entre os nossos países, com base nos princípios do direito internacional e da Carta das Nações Unidas.

Cuba reitera a sua vontade de manter a cooperação em organismos multilaterais, como as Nações Unidas.

Reconhecendo que temos diferenças profundas, principalmente sobre a soberania nacional, a democracia, os direitos humanos e política externa, reafirmo a disposição de discutir todas estas questões.

Apelo ao Governo dos Estados Unidos para eliminar os obstáculos que impedem ou restringem as ligações entre os nossos povos, famílias e cidadãos de ambos os países, em particular os relativos à viagem, mala direta e telecomunicações.

Progresso em intercâmbios sustentados mostrar que é possível encontrar soluções para muitos problemas.

Como já disse, temos de aprender a arte de viver, de forma civilizada, com as nossas diferenças.

Sobre estas questões importantes falaremos mais tarde.

Muito obrigado.

EUA e Cuba: As razões da mudança


Por Lamia Oualalou, no site Opera Mundi:

Troca de prisioneiros, normalização das relações diplomáticas, viagens facilitadas e flexibilização do bloqueio econômico: em poucos minutos, os presidentes dos EUA, Barack Obama, e de Cuba, Raúl Castro, acabaram com 53 anos de política externa norte-americana. A notícia repercutida no mundo inteiro é o resultado de 18 meses de negociações secretas entre Washington e Havana, com a ajuda fundamental do Papa Francisco. Ela reflete também a profunda mudança do quadro político doméstico nos Estados Unidos.

“Este ano, todas as pesquisas mostraram que a opinião pública norte-americana era favorável a mudanças importantes na política cubana de Washington”, explica Julia Sweig, diretora do programa de América Latina do Council on Foreign Relations (centro de estudos da política internacional dos EUA). Mais da metade dos americanos quer uma normalização das relações bilaterais, e se o apoio é maior entre democratas e independentes, esta é também a opinião da maioria dos eleitores republicanos.

transformação é mais sensível ainda na Flórida, que abriga a maior população cubano-americana: 63% dos habitantes do Estado apoiam a normalização, enquanto a média no país é de 56%. Mais de dois terços deles reivindicam o fim da proibição às viagens à ilha para todos os norte-americanos. Apesar da flexibilização introduzida dos últimos anos, este direito continuava reservado aos cubano-americanos.

Para Julia Sweig, “a população cubano-americana já não pode ser vista como um bloco monolítico que vota republicano e rejeita qualquer abertura em relação ao governo cubano”. Ela ressalta o fato dos políticos locais terem entendido o recado: um posicionamento mais liberal e pragmático em relação a Cuba pode ser fonte de popularidade e de votos.

A pressão dos países latino-americanos também teve um papel central. “Acho que Washington nunca entendeu a importância simbólica que sempre representou Cuba para América Latina, mas o que mudou na última década é que todos os países da região exigem uma mudança e o fim da política de isolamento de Havana”, considera Julia Sweig. “E esta pressão não vem só de Brasil, Chile também está falando alto, tal como México”, acrescenta.

Para Mark Weisbrot, co-diretor do Centro de Pesquisa Econômicas e Políticas (CEPR), “com a transição histórica dos últimos 15 anos, com governos de esquerda eleitos na maioria dos países da região, as regras e as normas mudaram, e muitos lideres latino-americanos, inclusive de direita, exigem que Cuba seja tratada de maneira igualitária”. Ele lembra a importância da presença dos representantes da ilha durante a próxima Cúpula das Américas.

Pela primeira vez na história, a próxima Cúpula das Américas, que acontecerá em abril de 2015, no Panamá, contará com a presença de Cuba. Com a expulsão da OEA (Organização dos Estados Americanos) em 1962, Havana não pode participar das edições anteriores que agruparam os 34 países membros da OEA, ou seja, todos os países das Américas menos Cuba. Em 2012, a última edição, em Cartagena, na Colômbia, provocou virulentos debates entre os Estados Unidos (apoiados pelo Canadá) e os demais Estados. “Foi decidido que seria a última reunião sem Cuba”, confiou Marco Aurélio Garcia numa entrevista exclusiva a Opera Mundi. “Agora a bola está com os EUA. Barack Obama terá que decidir se vai ou não”, continuou.

O presidente norte-americano acabou de confirmar sua participação à reunião, com a presença de Cuba. Para Julia Sweig, “não há duvida que a decisão de normalizar as relações com Havana vai ajudá-lo a melhorar as relações com América Latina”. 

Weisbrot ressalta a formação de grupos internacionais, como a Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe), que incluem Cuba, mas excluem os Estados Unidos, e da crescente influência de organizações regionais como a Unasul (União das Nações Sul-Americanas), como mais uma evidência de mudança regional. “A decisão de Obama também é uma clara derrota dos extremistas cubano-americanos que têm dominado a política dos EUA durante décadas, mais recentemente com o apoio de aliados neo-conservadores”, avalia o analista.

Weisbrot não considera, porém, que o anúncio de hoje signifique uma mudança profunda de paradigma. “Isso ajuda, mas temos que lembrar as novas sanções contra a Venezuela. A pergunta é: os EUA realmente abandonaram a estratégia que foi um fracasso durante os últimos 50 anos, ou apenas eles mudaram de adversário?”, pergunta.

Imágenes de la llegada a Cuba de los 3 héroes





A MÍDIA VASSALA AOS EUA NÃO MOSTRA
CHEGADA DE HERÓIS  A CUBA.
RECOMENDO LER O LIVRO,
"OS ÚLTIMOS SOLDADOS DA GUERRA FRIA" DE FERNANDO DE MORAES, 
ONDE ESTA A VERDADEIRA HISTORIA DESTE HERÓIS, O QUE FORAM FAZER NOS EUA, NA DEFESA DA REVOLUÇÃO.
VIVA O SOCIALISMO.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Relatório retrata tortura da CIA como política de Estado nos EUA


 Relatório Feinstein confirma em 480 páginas tortura, que incluiu espancamentos, privação de sono e waterboarding. Obama continua acobertando mandantes e torturadores
Uma década depois das nauseantes fotos de Abu Graib, um relatório do Senado dos EUA sobre a tortura da CIA entre 2002 e 2008, o relatório Feinstein, ou mais exatamente, seu resumo de 480 páginas, retoma a exposição do sadismo, covardia e depravação que se tornaram parte inseparável da intervenção do império em sua decadência. Assim, entre as atrocidades cometidas contra os 119 sequestrados de seus países e levados para prisões secretas da CIA no mundo inteiro e, depois, os que ainda estavam vivos, desovados em Guantánamo, são citadas espancamentos repetidos; privação de sono por até 180 horas, geralmente em pé e em posições forçadas e dolorosas; afogamento (waterboarding) repetido 183 vezes, até provocar vômitos e convulsões; “hidratação retal” e “exames anais”, confinamento por dias em um caixão, ameaça de estupro com cabo de vassoura, simulação de execução, roleta russa, nudez forçada, exposição a frio extremo e outros tipos de barbárie.
A íntegra do relatório – 6.300 páginas – não tem data para sair da obscuridade, se é que algum dia o será; em boa parte a publicação do resumo se deve à obstinação da senadora democrata Dianne Feinstein. 35.000 notas de pé de página do resumo detalham a sordidez. Como o então diretor de contra-insurgência Michael Hayden, dizendo que depois que os torturadores “convenciam” o preso de que “Alá dera luz verde para ele falar”, as “informações” saíam em profusão. Segundo o resumo, a “reidratação retal era um meio de controle de comportamento”.
No calabouço identificado como instalação “Cobalt” – no Afeganistão -, identificado em outras descrições como “Salt Pit”, os presos eram mantidos na completa escuridão, com barulho ensurdecedor, nus, por dias seguidos e, conforme um torturador da CIA, “literalmente pareciam como um cachorro foi enfiado no canil”. “Quando as portas das celas eram abertas, eles se encolhiam nos cantos”.
Antes de o resumo ser liberado, a CIA durante mais de um ano verificou com lupa cada documento e censurou tudo – o resumo está todo coberto com tinta negra nos nomes do torturadores, locais e países - , ainda assim, a Casa Branca reteve 9.400 páginas alegando “privilégio executivo”. Após todo esse encobrimento garantido por Obama, o secretário de Estado John Kerry ainda tentou no último minuto impedir a divulgação, alegando que iria “colocar em risco” os operativos norte-americanos no mundo inteiro.
Em outros episódios, os torturadores ameaçaram fazer mal aos filhos de um preso e violentar sua mãe; noutro caso, ameaçaram cortar a garganta da mãe do preso. Pelo menos um preso é identificado como tendo sido pego simplesmente para pressionar um parente preso. Seqüestrados que estavam com ossos quebrados – o pé, em um caso, noutro, a perna –foram forçados a ficar em pé por dias. Presos eram encapuzados e espancados de um lado para o outro de um corredor. Apesar do resumo falar em “ameaças de violações sexuais”, surge uma declaração sobre torturadores “que reportadamente haviam admitido assaltos sexuais”. Os presos sob privação extrema de sono chegavam a ter alucinações.
Presos eram pendurados em barras por dias; um preso foi “esquecido” por 17 dias algemado a uma barra. O peso Abu Hudhaifa foi submetido a 66 horas de privação de sono e banhos de água gelada “antes de ser solto porque a CIA descobriu que possivelmente não era a pessoa que se acreditara que fosse”. Gul Rahman não teve a mesma sorte: teve as roupas arrancadas e lhe enfiaram um capuz na cabeça. Depois de repetidamente espancado, foi acorrentado ao chão do calabouço, sendo encontrado depois morto por hipotermia. De acordo com a nota de pé de página 32, entrara de gaiato no navio: “outro caso de identidade errada”. Quatro meses depois, o oficial que deu a ordem que levou Rahman à morte foi recomendado para uma premiação de US$ 2.500 “por seu trabalho consistentemente superior”. As atrocidades e o desespero levaram muitos prisioneiros, segundo o resumo, a tentar o suicídio e auto-mutilação, como no caso de Majihd Khan, que tentou cortar os pulsos duas vezes e, depois, tentou cortar uma veia do pé.
O resumo não esclarece o que levou a CIA, com todo o seu know-how em matéria de tortura, tão extensamente desenvolvido em Guerras como o Vietnã e nos golpes de estado na América Latina em que deu aula da especialidade, e tendo podido apreender o melhor que a Gestapo tinha para ensinar, a contratar dois psicólogos com passagem pela Força Aérea, mas que não tinham qualquer experiência em interrogatório ou sobre a Al Qaeda, para o “novo método” de desestruturar gente. Talvez se pensasse que a fé islâmica significava um obstáculo de novo tipo. Mas a CIA asseverou que os dois psicopatas – James Elmer Mitchell e Bruce Jessen, codinomes ‘Svwigert’ e ‘Dunbar’ - tinham “uma expertise única”, o que os fez merecedor de um contrato de US$ 81 milhões, com a Agência terceirizando “virtualmente todos os aspectos do programa”. Até 85% dos operativos da prisão e tortura, incluindo “interrogadores”, “psicólogos operacionais” e pessoal de segurança, eram mercenários.
Os dois prisioneiros que são considerados emblemáticos dessa fase da tortura da CIA são Abu Zubaydah e Khalid Sheikh Mohammed, o KSM, supostamente autores intelectuais do ataque às torres gêmeas. Zubaydah foi a cobaia de todo o experimento. Foi colocado em “completo isolamento por 47 dias” e depois torturado quase 24 horas por dia, apesar de ferido a bala. Sofreu waterboarding e, entre outros tormentos, ficou 266 horas em confinamento num caixão. No waterboarding, teve espasmos, vômito e convulsões. Já KSM foi o recordista absoluto de afogamento, com 183 vezes.
APENAS UM RESUMO
E o resumo é apenas uma parte da tortura e das atrocidades. Como lembrou o jornalista Glenn Greenwald, em 2009 sabia-se que em torno de 100 presos haviam sido mortos pelo Pentágono e pela CIA. Desde que tomou posse, Obama protegeu os torturadores da CIA e os mandantes do governo W. Bush, que oficializaram e institucionalizaram a tortura. Da CIA, o único preso até hoje é o ex-analista John Kiriakou, por ter denunciado o waterboarding, condenado a 30 meses. Em 2008, o general Antonio Taguba, que denunciou o escândalo de Abu Graib, afirmou que “não há mais qualquer dúvida se o atual governo cometeu crimes de guerra. A única questão que permanece para ser respondida é se aqueles que ordenaram o uso da tortura serão levados aos tribunais”.
Nos últimos anos, a CIA, o stablishment e a mídia fizeram enorme esforço em exaltar o “sucesso” da tortura, o que o relatório Feinstein demonstra ser uma completa falsidade. Mas como Edward Snowden denuncia, nem que houvesse tal “eficiência”, ela “não tem lugar numa debate sobre o certo e o errado. Os EUA estão em profunda crise moral”.

ANTONIO PIMENTA
http://www.horadopovo.com.br/

O que quer a direita latino-americana?


Por Emir Sader, naRede Brasil Atual:

A direita latino-americana viveu momentos de euforia com a vitória dos Estados Unidos na guerra fria, com o fim da União Soviética, o triunfo da democracia liberal em uma parte majoritária do planeta e, igualmente, do modelo econômico neoliberal. A velha direita oligárquica buscava se renovar com teses liberais de mercado contra o Estado, os partidos e os movimentos populares.

O neoliberalismo tentava fazer com que a direita, que sempre havia representado o passado, tratasse de aparecer como “o novo”, o futuro, a superação de um passado em que a direita se sentia incômoda.

Para a América Latina todos esses fenômenos significaram a proliferação de governos que vinham da mais rançosa direita, assim como outros, originários de forças nacionalistas e da social democracia, assumindo o novo figurino representado pelo neoliberalismo.

Pretendiam, uma vez mais, apagar a demarcação entre direita e esquerda, fazendo convergir tudo para um modelo único ditadores como Pinochet, nacionalistas como Carlos Menem e social democratas como FHC. O pensamento único se traduzia em governos únicos.

As crise mexicana de 1994, brasileira de 1999 e argentina de 2001 liquidaram precocemente essa euforia da direita latino-americana, que foi seguida pela eleição de governos anti-neoliberais. A direita, que pretendia reinar soberana por muito tempo, deixou flancos abertos, a partir dos quais foi se reestruturando a esquerda latino-americana.

A crença que a retração do Estado da economia, a centralidade do mercado, o controle da inflação, seriam suficiente para a legitimidade dos novos tipos de governo no continente, fracassou. Não se davam conta que o principal problema dos países da região é a desigualdade social e que a falta de avanços neste tema impediria esses governos de consolidar-se.

Foi o que aconteceu com governos eleitos com a bandeira do controle da inflação, que em geral conseguiram se reeleger baseados neste mote, até se esgotarem e fracassarem. Foi assim na Argentina, Brasil, Uruguai, Venezuela, Equador e Bolívia, com particularidades em cada país.

Desprevenida, confiante na derrota da esquerda, a direita foi sendo derrotada naqueles países, porém, mais que isso, teve que se constituir, se consolidar e se reeleger a governos populares, que preencheram os vazios deixados pelos governos neoliberais. Sobretudo, privilegiaram o tema central do continente mais desigual do mundo, com suas políticas sociais.

Para isso, recuperaram o papel ativo do Estado, combatendo a centralidade do mercado, elaboraram políticas de integração regional e de intercâmbio Sul-Sul. Como resultado, países que vinham de profundas instabilidades políticas, como a Bolívia e o Equador, passaram a ter os governos mais estáveis e legítimos da sua história.

Um país como a Argentina, que havia sofrido a pior crise da sua história, na saída da política suicida de paridade da sua moeda com o dólar, pôde se recuperar, retomar o crescimento econômico, com grande distribuição de renda. O Brasil pôde sair de uma profunda e prolongada recessão provocada pelas políticas do governo de FHC, retomou um ciclo expansivo da sua economia, promovendo ao mesmo tempo o mais amplo processo de democratização social que o país já conheceu.

A direita, deslocada por esses governos, entrou em um desgastante processo de crise de identidade. O que fazer? Desconhecer os avanços realizados ou tentar incorporá-los? Prometer abandonar os cânones neoliberais ou voltar a promovê-los, contando com um eventual esquecimento que as pessoas pudessem ter do seu fracasso recente?

Ao que tudo indica pelo tipo de candidaturas que a direita promove em países como o Equador – um banqueiro –, a Bolívia e o Chile – grandes empresários –, ou jovens políticos que propõem o retorno ao neoliberalismo pura e simplesmente – como no Brasil, no Uruguai, na Venezuela – faltam ideias, imaginação e sobretudo compromisso com os avanços conquistados e com o futuro desses países.

O que quer a direita latino-americana, que se empenha tanto, valendo-se do que lhe resta – o monopólio dos meios de comunicação, o terrorismo econômico, as reiteradas denúncias de corrupção (dos outros) – para tentar retomar o governo? Está claro que a única coisa que a direita quer é desalojar as forças progressistas do governo, para abrir caminho para o retorno das grandes forças do poder econômico e midiático.

O que fariam no governo? Fica claro também que seriam processos de restauração conservadora, retomando os princípios do neoliberalismo – centralidade dos ajustes fiscais, diminuição do peso do Estado e de suas políticas sociais, rebaixamento do perfil dos processos de integração regional a favor de tratados de livre comércio com os Estados Unidos. Essas posições estão nos programas de todos os candidatos opositores nos países mencionados.

Tiveram, tem e seguirão tendo dificuldades para voltar a ganhar, justamente porque as profundas transformações postas em prática pelos governos que os sucederam, os diferenciam claramente da restauração conservadora. Podem encontrar carinhas lindas, jovens, aparentemente inovadores, mas que carregam o passado neoliberal, do qual não conseguem se livrar.

PINGOS NOS IS



Esse negócio de general de pijama vir falar nos "militares mortos pela esquerda" no período da ditadura é enrolação pra confundir desatento.
- Ué, mas não morreram militares em ações da esquerda armada naquele período?
Claro que sim. Como morreram jovens combatentes. Atenção: em combate.
E, desses, a esquerda não reclama. Morrer numa ação armada era um risco inerente à opção que fizeram.
O que a esquerda e todos os democratas reclamam, denunciam e acusam é a tortura, o estupro, o desaparecimento forçado. Aí, meus caros, é crime até pela Convenção de Genebra.
Os jovens de esquerda naquele período nunca prenderam, torturaram, estupraram ou deram sumiço em ninguém. Os agentes do estado, sim.
Então não venham confundir os mortos, seviciados e desaparecidos nos porões da ditadura com os outros, mortos em combate.
E, mesmo sobre os mortos em combate, mais uma coisa: quem começou aquela "guerra"?
Não foram os jovens. Até 64 eles estavam atuando em seus partidos, votando para presidente, enfim, integrados à vida política nacional. Com seus acertos e seus defeitos. Até que alguns generais quebraram a hierarquia (o Presidente da República é o chefe das FFAA), rasgaram a Constituição, derrubaram o presidente eleito, cassaram os partidos políticos, impediram eleições, implantaram a censura, prenderam e arrebentaram. Aqueles chefes militares romperam a normalidade. Agrediram a vida nacional. Começaram a "guerra".
À juventude restou lutar.
NOVAES BARRA

A cômoda desigualdade naturalizada


Por Clemente Ganz Lúcio, no site Brasil Debate:

“Passa mal a terra, de lestos males presa

Onde se acumula a riqueza e declinam os homens.”

Oliver Goldsmith, The Deserted Village (1770). Citado por Tony Judt, “Um Tratado sobre os Nossos Actuais Descontentamentos”

Para além do medo e da insegurança que pairam sobre a vida moderna, cresce a sensação de que há algo que segue mal. O que soma diminui e o que é mais nos faz menor! Cresce a desumanização no processo civilizatório. O trabalho urgente de reflexão complexa perde espaço para instantaneidades vaporizadas de um clique.

No pós-guerra (meados dos anos 1940), acelerou-se o processo que, no Ocidente, ocorria desde meados do século 19, de redução das desigualdades. Como escreveu Tony Judt, em Um Tratado sobre os Nossos Actuais Descontentamentos:

“Graça ao imposto progressivo, subsídios estatais para os pobres, fornecimento de serviços sociais e garantias contra infortúnios mais severos, as democracias modernas libertavam-se dos extremos da riqueza e pobreza.”

As sociedades foram incorporando à cultura econômica, social e política a intolerância à desigualdade, para a qual desenvolveram, como antídoto à insuficiência privada, os amplos sistemas de seguridade, proteção e promoção social.

Acreditou-se que era possível, progressivamente, avançar nesse caminho de redução das desigualdades, sem recuos, pois a democracia sustentaria o percurso e os resultados alcançados. Ledo engano!

Desde os anos 1970, o movimento de redução da desigualdade se inverteu em diferentes países. Como registra Judt, a título de exemplo, em 1968, o diretor-geral da GM recebia como remuneração e benefícios o equivalente a 66 vezes o salário médio do peão da fábrica. Em 2005, estima-se que essa equivalência saltou para 900 vezes! Que produtividade!

Estudo recente divulgado pela Oxfam revela que atualmente a desigualdade segue crescendo. A comparação da evolução da riqueza nos países que compõem o G20 indica que, no último ano, a riqueza desses países aumentou em 17 bilhões de dólares, 1/3 apropriada por 1% dos mais ricos, o equivalente a 6,2 bilhões de dólares.

Outro exemplo: nos EUA, no início da década de 1980, os 1% mais ricos se apropriavam de 8% da renda; em 2012, essa participação subiu para 19%. A Oxfam estimou que a evasão fiscal nos países em desenvolvimento promovida pelas grandes empresas é da ordem de 100 bilhões de dólares por ano, recursos suficientes para escolarizar todas as crianças do mundo quatro vezes!

A desigualdade é um fenômeno complexo de disparidades de renda e riqueza, de poder, de oportunidade, de condições, observada entre homens e mulheres, entre negros e não negros (ou com outro recorte racial ou populacional), entre países; entre continentes, entre regiões dentro dos países, entre os que vivem no centro e na periferia das cidades, entre o rural e o urbano, contra os deficientes, contra os povos indígenas.

A lista segue e é longa. Como insiste Judty: “A desigualdade é corrosiva. Ela apodrece as sociedades a partir de dentro… O legado da criação da riqueza não regulada é realmente amargo.

Será verdade que processos de redução da desigualdade levam as sociedades a quererem reduzi-la ainda mais? O processo de concentração da riqueza torna-a invisível ou uma “condição divina e natural da vida”. A subjetividade coletiva do mal-estar tem causa!

O desafio é descortinar as ilusões do crescimento, da prosperidade e da geração de bem-estar material.

Primeiro, porque o bem-estar material não é homogêneo (há enormes desigualdades de condições, capacidades e oportunidades); segundo, porque bem-estar material não conduz, necessariamente, à qualidade de vida; terceiro, porque bem-estar material e qualidade de vida estão predominantemente em desacordo com o equilíbrio ambiental; quarto, porque o bem viver é um paradigma que requer outro equilíbrio entre bem-estar material, qualidade de vida e sustentabilidade ambiental.

Recolocar a centralidade da igualdade de oportunidades, condições e capacidades para todos, ampliar os limites da regulação econômica dos mercados, qualificar o debate público sobre as escolhas coletivas e construir unidade em torno dessas questões são algumas das nossas tarefas!