quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Mantega aumenta em 10 bilhões confisco fiscal para pagar juros 


Em 12 meses já foram gastos R$ 224,76 bilhões com juros


O aumento, em R$ 10 bilhões, da “meta” de superávit primário deste ano, anunciada pelo ministro Guido Mantega, é tão irresponsável quanto as justificativas supostamente econômicas que acompanharam tal anúncio.

Segundo Mantega, esse aumento do confisco orçamentário para repassar dinheiro público aos bancos, sobretudo externos, e demais especuladores (pois é isso o que se chama “superávit primário”), vai nos preparar para a recessão dos países centrais, que agora até ele acha que vem por aí.

Pelo contrário, não será uma política recessiva até as entranhas que nos livrará de ser arrastados pela crise desses países. O que Mantega está fazendo é nos colocar em crise – pois sua minúscula cabeça colonizada não admite que o Brasil possa crescer, nem ficar fora da crise, se aqueles que ele considera seus donos estão imersos nela.

De quebra, o aumento do superávit primário é uma sinalização aos bancos dos países imperialistas – sobretudo dos EUA – de que podem contar com as finanças e a economia do Brasil como seu posto de repasto, seu terreno para saques e pilhagens, nesse momento difícil para eles. Em suma, e sendo mais rigoroso, é uma sinalização de que eles podem contar com Mantega.

É mais do que evidente, como disse a presidente Dilma quando foi anunciada a sua vitória nas eleições, que temos, nesse momento, de contar com o nosso mercado interno, com a nossa indústria, com a nossa economia, com as nossas próprias forças. Despejar mais dinheiro nos bancos externos, pendurar o país na crise dos outros, é, obviamente, o contrário de tudo isso.

Notemos que, de janeiro a julho, o confisco orçamentário para os juros, o “superávit primário”, aumentou 160,7% em relação ao mesmo período do ano passado (cf. Ministério da Fazenda, STN, “Resultado do Tesouro Nacional”, vol. 17, nº 7, agosto/2011, pág. 3).

Isto significa que o confisco foi 16,55% do dinheiro que o governo gastou em “despesas primárias” (Educação, Saúde, etc.), o que é a mesma coisa que dizer que R$ 66,92 bilhões foram subtraídos da verba destinada ao atendimento da população (cf. op. cit., Tabela A1).

No entanto, não foi somente isso o que o governo repassou, via juros, aos bancos e outros especuladores. O “superávit primário” é o confisco orçamentário das receitas primárias, isto é, da arrecadação de impostos, contribuições e taxas. Não inclui, por exemplo, as “sobras” (?) de caixa das estatais, que são, desde o governo Fernando Henrique, obrigatoriamente confiscadas para pagar juros.

Assim, 29,33%, mais de um quarto, dos gastos do governo de janeiro a julho - isto é, R$ 117,39 bilhões do governo federal e R$ 138,54 bilhões de todo o setor público – foram gastos com juros (cf. BC, “Relatório de Política Fiscal”, 26/08/2011, Quadro 2).

O que é 126,92% do que se gastou, no mesmo período, com juros em 2010 e 70,91% do que se gastou em todo o ano passado, elevando o gasto em 12 meses para R$ 224,76 bilhões somente com juros.

Somem-se a isso as colossais amortizações feitas no mesmo período e descobriremos que 68% dos gastos totais do governo, de janeiro a julho, foram repasses aos bancos (para as amortizações até julho, R$ 296,27 bilhões - pois houve um salto espetacular no último mês, com amortizações que chegaram, só em julho, a R$ 101,82 bilhões - ver a Execução Financeira do Tesouro Nacional, Tabela A4, no já citado “Resultado do Tesouro Nacional”).

Apesar dessas quase inacreditáveis amortizações em julho, devido aos juros a dívida pública total diminuiu apenas R$ 81,13 bilhões em relação ao mês anterior. Em julho, estava em 2 trilhões, 343 milhões e 666 mil reais. Portanto, com esses juros as amortizações somente estão servindo para passar mais dinheiro aos bancos, e não para reduzir efetivamente a dívida.

O sr. Mantega, evidentemente, acha que isso é pouco: quer aumentar em R$ 10 bilhões o desvio orçamentário para os juros.

Talvez o mais escandaloso seja ouvir certas autoridades, mais entusiasmadas do que galinhas antecipando a chegada do galo, dizendo coisas como “excelente, é um resultado muito positivo, o melhor da história” ou “felizmente o Brasil está apresentando resultados fiscais muito sólidos, mas é necessário sempre manter e aprofundar o cuidado para que continue assim”, como o secretário do Tesouro, Arno Augustin.
Quase dá vontade de aderir ao MST, que cercou o Ministério da Fazenda porque não consegue renegociar uma dívida da agricultura familiar, e dizer, como um de seus líderes, sobre o superávit primário recorde de julho: “está demonstrado para que o Estado existe no Brasil: para servir ao grande capital”.
Porém, o Estado tem que servir aos brasileiros. Exatamente por isso é que são inadmissíveis as idiotices – e o cinismo ansioso para se arrumar na vida - do sr. Mantega, segundo quem o aumento do superávit primário é para “abrir mais espaço para que os investimentos no Brasil continuem aumentando, garantindo, assim a geração de empregos e o crescimento da economia” ou que “esta é uma medida de conter aumento de gastos de custeio para que haja um contínuo aumento dos investimentos” ou que “à medida que se diminui ou se deixa de aumentar o gasto público, abre-se espaço para que haja uma queda da taxa de juros, quando o Banco Central entender que é possível”.
“Abre-se espaço” virou fórmula mágica para justificar qualquer absurdo, exatamente porque esses absurdos não abrem espaço para nada – até ocupam demasiado espaço nos cofres ou na contabilidade virtual dos bancos, sobretudo os estrangeiros.

Desde quando passar mais dinheiro do Orçamento aos bancos faz aumentar os investimentos? E desde quando a tendência atual é de aumento dos investimentos? Com a produtividade da indústria estagnada há seis meses devido à queda da produção, ocasionada pelos juros altos, pelo câmbio irreal e por medidas imprudenciais (desculpe, leitor), tudo aponta para uma queda nos investimentos, inclusive na taxa de investimento (isto é, nos investimentos em relação ao PIB).

Quanto a diminuir o custeio para aumentar os investimentos, isso é tão estúpido, e já falamos tanto dessa imbecilidade, que só resta dizer que não é coisa de gente séria: se o investimento pudesse ser feito à custa de destruir os investimentos passados (pois mantê-los é a função do que se chama “custeio”), dentro em breve estaríamos de volta à Idade da Pedra Lascada.

Porém, nada revela mais o vigarista do que a conversa sobre os juros: desde quando aumentar o superávit primário impediu aumento de juros ou, mais mentiroso ainda, fez os juros caírem? Todas as vezes em que se aumentou o superávit primário, os juros, pelo contrário, subiram (v., p. ex., o testemunho do ex-ministro José Dirceu sobre o período 2005-2006, HP, 14/05/2008).

O que tem até alguma lógica, do ponto de vista dos especuladores financeiros. Depois do governo elevar o confisco orçamentário para aumentar o repasse de juros, por que os bancos estrangeiros, que mandam no Banco Central, não iriam subir os juros?

Aliás, temos agora a instituição oficial – não mais oculta ou informal - de uma ditadura: a dos bancos estrangeiros, através do BC. Segundo Mantega, os juros vão cair “quando o Banco Central entender que é possível”. Já para o secretário do Tesouro, “quanto melhor for o resultado fiscal, melhores ficam as condições para que o Banco Central, dentro de sua autonomia, avalie qual política deve conduzir”.

De nossa parte, recusamo-nos a aceitar a deposição da companheira Dilma, que foi em quem nós votamos. Ninguém, e nenhuma lei, concedeu ao BC o poder de usurpar as funções da Presidência da República. Ninguém no BC foi eleito para escolher política alguma. E desde quando uma camarilha, dependente dos bancos externos até os cueiros, doida para se arranjar a serviço deles, tem autoridade para decidir o que o Brasil precisa ou não precisa?

CARLOS LOPES

Nenhum comentário: