quarta-feira, 30 de março de 2011

O orçamento dos EUA para 2012: como fomentar a guerra de classes

“Os orçamentos do Pentágono, da CIA e da Segurança Interna representam US$ 1,1 trilhão do déficit federal que a administração Obama prevê para o ano fiscal de 2012. Este gasto deficitário maciço serve apenas a um único propósito – o enriquecimento das companhias privadas que servem o complexo militar e de segurança. Estas companhias, juntamente com aquelas de Wall Street, são quem elegem o governo dos EUA”, afirma o ex-editor do Wall Street Journal e ex-secretário assistente do Tesouro dos EUA, Paul Craig Roberts, no artigo que publicamos hoje

PAUL CRAIG ROBERTS *

O novo orçamento de Obama é uma continuação da guerra de classe de Wall Street contra os pobres e as camadas médias. Wall Street não acabou conosco quando os banksters venderam os seus derivativos fraudulentos aos nossos fundos de pensão, arruinaram as perspectivas de empregos e planos de aposentadoria dos americanos, asseguraram um salvamento de US$700 bilhões à custa dos contribuintes, enquanto arrestavam os lares de milhões de americanos e sobrecarregavam o balanço da Federal Reserve [banco central] com vários trilhões de dólares de lixo financeiro em troca de dinheiro recém criado para escorar os balanços dos bancos. O efeito do “alívio quantitativo” da Federal Reserve sobre a inflação, as taxas de juro e o valor cambial do dólar ainda está para nos atingir. Quando o fizer, os americanos obterão uma lição do que é a pobreza.
 
As oligarquias dominantes atacaram novamente, desta vez através do orçamento federal. O governo dos EUA tem um enorme orçamento militar e de segurança. Ele é tão grande quanto os orçamentos do resto do mundo somados. Os orçamentos do Pentágono, da CIA e da Segurança Interna representam US$ 1,1 trilhão do déficit federal que a administração Obama prevê para o ano fiscal de 2012. Este gasto deficitário maciço serve apenas a um único propósito – o enriquecimento das companhias privadas que servem o complexo militar e de segurança. Estas companhias, juntamente com aquelas de Wall Street, são quem elegem o governo dos EUA.
 
Os EUA não têm inimigos exceto aqueles que os próprios EUA criam ao bombardearem e invadirem outros países e pela derrubada de líderes estrangeiros e instalação de fantoches americanos no seu lugar.
 
A China não efetua exercícios navais ao largo da costa da Califórnia, mas os EUA efetuam jogos de guerra junto às suas costas no Mar da China. A Rússia não concentra tropas nas fronteiras da Europa, mas os EUA instalam mísseis nas fronteiras da Rússia. Os EUA estão determinados a criar tantos inimigos quanto possível a fim de continuar a sangrar a população americana para alimentar o voraz complexo militar e de segurança.
 
O governo dos EUA gasta realmente US$ 56 bilhões por ano a fim de que os americanos que viajam de avião possam ser porno-rastreados e sexualmente tateados, de modo a que firmas representadas pelo antigo secretário da Segurança Interna Michael Chertoff possam ganhar grandes lucros vendendo o equipamento de rastreamento (scanning).
 
Com um déficit orçamentário perpétuo impulsionado pelo desejo de lucros do complexo militar e de segurança, a causa real do enorme déficit do orçamento dos EUA está fora de discussão.
 
O secretário de Promoção da Guerra, Robert Gates, declarou: “Se evitarmos as nossas responsabilidades na segurança global é para nosso perigo”. As altas patentes militares advertem contra o corte de qualquer dos bilhões de ajuda a Israel e ao Egito, dois funcionários de sua “política” para o Oriente Médio.
 
Mas o que são as “nossas” responsabilidades globais de segurança? De onde vieram? Por que a América ficaria em perigo se cessasse de bombardear e invadir outros países e de interferir nos seus assuntos internos? Os riscos que a América enfrenta são criados por ela própria.
 
A resposta a esta pergunta costumava ser que, do contrário, seríamos assassinados nas nossas camas pela “conspiração comunista mundial”. Hoje a resposta é que seremos assassinados nos nossos aviões, estações de comboios e centros comerciais por “terroristas muçulmanos” e por uma recém criada ameaça imaginária – “extremistas internos”, isto é, manifestantes contra a guerra e ambientalistas.
 
O complexo militar e de segurança dos EUA é capaz de criar qualquer número de falsas bandeiras a fim de fazer com que essas ameaças pareçam reais para um público cuja inteligência é limitada à TV, experiências em centros comerciais e jogos de futebol.
 
Assim, os americanos estão atolados em enormes déficits orçamentários que a Federal Reserve deve financiar imprimindo dinheiro novo, dinheiro que mais cedo ou mais tarde destruirá o poder de compra do dólar e o seu papel como divisa de reserva mundial. Quando o dólar se for, o poder americano também irá.
 
Para as oligarquias dominantes, a questão é: como salvar o seu poder.
 
A sua resposta é: fazer o povo pagar.
 
E isso é o que o seu mais recente fantoche, o presidente Obama, está fazendo.
 
Com os EUA na pior recessão desde a Grande Depressão, uma grande recessão que John Williams e Gerald Celente, assim como eu próprio, afirmaram que está se aprofundando, o “orçamento Obama” tem como objetivo programas de apoio para os pobres e os desempregados. As elites americanas estão se transformando em idiotas quando procuram repetir na América as condições que levaram à derrubada das elites analogamente corruptas na Tunísia e no Egito, e a desafios crescentes aos demais governos fantoches.
 
Tudo o que precisamos é de uns poucos milhões mais de americanos sem nada a perder, para trazer as perturbações no Oriente Médio para dentro da América.
 
Com os militares norte-americanos atolados em guerras lá fora, uma revolução americana teria ótima oportunidade de êxito.
Políticos americanos têm de financiar Israel pois o dinheiro retorna em contribuições de campanha.
 
O governo dos EUA deve financiar os militares egípcios para haver alguma esperança de transformar o próximo governo egípcio em outro fantoche americano que servirá Israel pelo bloqueio contínuo dos palestinos arrebanhados no gueto de Gaza.
 
Estes objetivos são de longe mais importantes para a elite americana do que as bolsas que permitem a americanos pobres obterem educação, ou água limpa, ou repasses financeiros comunitários, ou o programa de assistência em energia aos que auferem baixos rendimentos (cortado na mesma quantia em que os contribuintes americanos são forçados a dar a Israel).
 
Também há US$ 7,7 bilhões de cortes no Medicaid e outros programas de saúde ao longo dos próximos cinco anos.
 
Dada a magnitude do déficit orçamentário dos EUA, estas somas são uma ninharia. Os cortes não terão qualquer efeito sobre as necessidades de financiamento do Tesouro. Eles não interromperão a necessidade de imprimir dinheiro do Federal Reserve a fim de manter o governo dos EUA em operação.
 
Estes cortes servem apenas uma finalidade: reforçar o mito do Partido Republicano de que a América está em perturbação econômica por causa dos pobres. Os pobres são preguiçosos. Eles não querem trabalhar. A única razão porque o desemprego é alto é que os pobres preferem confiar na previdência estatal.
 
Um novo acréscimo ao mito da previdência estatal é que membros da classe média saídos recentemente de faculdades não querem os empregos que lhes são oferecidos porque os seus pais têm demasiado dinheiro e os rapazes gostam de viver em casa sem terem de fazer nada. Uma geração mimada, eles saem da universidade recusando qualquer emprego que não seja para começar como executivo principal de uma companhia entre as 500 maiores da Fortune. A razão porque diplomados em engenharia não conseguem entrevistas de emprego é porque não os querem.
 
Tudo isso leva a um assalto aos “direitos adquiridos”, o que significa Segurança Social e Medicare. As elites programaram, através do seu controle da mídia, uma grande parte da população, especialmente os que se consideram conservadores, a assimilar o conceito de “direitos adquiridos” ao de previdência estatal. A América está indo para o inferno não por causa de guerras externas que não servem a qualquer objetivo americano, mas porque o povo, que durante toda a sua vida pagou 15% das suas remunerações para pensões na velhice e cuidados médicos, quer “dádivas” nos seus anos de aposentadoria. Por que essas pessoas egocêntricas pensam que os trabalhadores americanos deveriam ser forçados, através de contribuições sobre suas remunerações, a pagar as pensões e cuidados médicos dos inativos? Porque os inativos não consomem menos e preparam a sua própria aposentadoria?
 
A linha da elite, e a dos seus porta-vozes contratados em “think tanks” e universidades, é de que a América está perturbada devido aos inativos.
 
Americanos em excesso tiveram os seus cérebros lavados a fim de acreditar que a América está em perturbação por causa dos seus pobres e inativos. A América não está perturbada porque coage um número decrescente de contribuintes a sustentarem os enormes lucros do complexo militar e de segurança, os governos fantoches americanos lá fora e Israel.
 
A solução da elite americana para os problemas da América não é simplesmente arrestar as casas dos americanos cujos empregos foram exportados, mas aumentar o número de americanos aflitos, de doentes, inativos e privados de tudo, e de diplomados nas universidades que não podem encontrar os empregos que foram enviados para a China e a Índia.
 
De todos os países do mundo, nenhum necessita de uma revolução tão urgentemente quanto os Estados Unidos, um país dominado por um punhado de oligarcas egoístas que têm mais rendimento e riqueza do que pode ser gasto durante toda uma vida.
 
* Ex-editor do Wall Street Journal e ex-secretário assistente do Tesouro dos EUA.

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