quarta-feira, 30 de março de 2011

Amorim: não votaria pelo envio de relator para o Irã


Indagado se votaria, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, pelo envio de um relator especial ao Irã, o ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou que “provavelmente não”. “Com os elementos de informação que tenho, eu não votaria”, disse. “Se quisermos ser absolutamente coerentes”, argumentou, “tem que mandar um relator especial para o Irã, outro para Guantánamo, outro para ver a situação dos imigrantes na Europa”. “Se você for agir dessa maneira, eu até poderia ser a favor, mas acontece que não é assim”, completou. As declarações foram feitas à BBC e à Folha de São Paulo.

“Quando se nomeia um relator você está cortando qualquer possibilidade de diálogo”, acrescentou Amorim. “As pessoas acham que sobre cada ação há apenas uma decisão moral. Não é. A decisão é também política, não no sentido de agir em interesse próprio, mas de saber se o resultado será o que você deseja”, ponderou. Para Amorim o apoio ao envio do relator especial dificultará a atuação do Brasil como mediador de conflitos. “Torna mais difícil, não só no lado nuclear, até no lado de direitos humanos”. “Você tem duas opções: ser aquele que conversa ou o que condena”, avaliou. ‘Se entrar na política condenatória, o Brasil pode esquecer o diálogo com Irã”, destacou Amorim.

“Todo mundo criticou o presidente Lula, mas se há alguma pessoa que teve influência na não execução da Sakineh Ashtiani [iraniana condenada à morte] foi ele”, lembrou o ex-chanceler. Ele mencionou também que o governo Lula obteve do Irã a libertação de uma francesa, Clotilde Reiss, acusada de espionagem, e outras concessões. “Se você começar a entrar numa política condenatória, pode esquecer o diálogo”.

Já sobre a Líbia, Amorim disse que “não teria votado diferente”. “A decisão [de abstenção] foi difícil e corajosa por ter sido tomada na véspera da visita do Obama”, avaliou. Ele apoia a abstenção brasileira dizendo que “o grande problema na operação é que não é só a zona de exclusão aérea. Você sabe onde começa, mas não onde acaba. O risco era acontecer o que está acontecendo, ataques que vão além”, denunciou. “Pelo que eu li, o discurso da embaixadora brasileira Maria Luiza Viotti na ONU foi muito correto, ela alertou para que a situação poderia se agravar”, ressaltou.

Perguntado se as diferenças entre as posições sobre o Irã e a Líbia representariam uma mudança na política externa brasileira, Amorim disse que não. “Uma coisa é um país que tem problemas graves, mas que você pode tentar conversar. Outra é quando você tem uma situação emergencial de morticínio de civis que precisa de uma ação imediata”, afirmou. “Tenho até medo de dar essa opinião, mas a única coisa que eu tenho dúvida, embora ache que não havia condição de votar de maneira diferente, é que a [primeira] resolução do Conselho de Segurança teria sido mais inteligente e mais eficaz se não tivesse fechado a porta para a saída de Kadafi”. “Vamos admitir que o Kadafi é uma fera. Se há uma fera, tem que dar uma saída para ela, se não, a reação pode ser pior. Não é uma questão moral, é uma questão prática. Se quiser investigar depois, é diferente. Se você tem esperança de uma solução rápida, menos custosa em termos de direitos humanos, você deixa uma saída”, afirmou o ex-chanceler.
 HP

Nenhum comentário: