sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Projeto que susta a recuperação do mínimo é aprovado na Câmara
Com 361 votos, proposta de R$ 545 para o salário mínimo passa mesmo com a rejeição das Centrais

A Câmara dos Deputados aprovou na quarta-feira (16) a proposta do governo que define o valor do novo salário mínimo em R$ 545. Este valor, que foi rejeitado pelas Centrais Sindicais, obteve 361 votos dos parlamentares. As Centrais Sindicais defendiam o valor de R$ 580, mas durante as discussões chegaram a admitir um acordo em torno de R$ 560. Não houve entendimento em torno da proposta de R$ 560 e ela obteve 120 votos.
A insistência do governo em manter o valor do salário mínimo sem aumento real foi apontada pelos sindicalistas presentes à votação como uma ruptura do acordo político de recuperação do salário estabelecido nos últimos anos entre as lideranças sindicais e o governo Lula.

FORMALIDADES

Os presidentes das seis principais Centrais Sindicais (CUT, CGTB, Força Sindical, CTB, UGT e Nova Central) ocuparam a tribuna da Câmara dos Deputados na terça-feira (veja matéria na página 5) para argumentar a favor da continuidade da política de valorização do salário mínimo. Segundo eles, ela é fundamental para sinalizar no sentido da continuidade do crescimento econômico do país. Para os sindicalistas, o aumento real do salário mínimo não representa ameaça de inflação, como apregoaram os representantes da equipe econômica do governo. “Porque não há inflação de demanda atualmente no Brasil”, argumentaram. Todos eles demonstraram fartamente que os aumentos de preços observados no início deste ano foram causados pela especulação internacional com as commodities e não por uma suposta demanda aquecida.
Outro argumento apresentado pelos trabalhadores durante as discussões é de que as contas públicas não sofrerão nenhum descontrole com o aumento do salário mínimo. Primeiro porque houve aumento da arrecadação este ano. O orçamento tinha sido feito com uma previsão de crescimento de 5%. Segundo estimativas, divulgadas nesta mesma quarta-feira pelo BC, ele será de 7,8%. Além disso, a previsão da própria Receita Federal para 2011 é de que a arrecadação continue a aumentar. Como dissemos na última edição, o secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, avaliou no dia 20 de janeiro que a arrecadação de 2011 deverá ficar 10% acima da obtida em 2010.
Além disso, a Seguridade Social, da qual faz parte a Previdência também não apresenta nenhum problema. Muito pelo contrário. Ela vem tendo superávits seguidos nos últimos anos. R$ 32,6 bilhões em 2009; R$ 40 bilhões em 2008; R$ 60,9 bilhões em 2007; R$ 50,8 bilhões em 2006 e R$ 62 bilhões em 2005. Ou seja, durante todo o período de aumentos reais do salário mínimo, a Seguridade Social foi superavitária. Não há argumento nenhum que justifique o atual arrocho no salário.
Em sua luta os sindicalistas enfrentaram a intransigência da base do governo, que, como deixaram claro o ministro Guido Mantega e o líder Cândido Vacarezza, está “determinado a sinalizar” aos “agentes do mercado” que não abre mão do arrocho. O fato de não aceitar a proposta de antecipação do reajuste previsto para 2012, feita pelo PDT, mostra que a intenção de Mantega é mesmo dar uma paulada no crescimento do país em 2011. Para isso ele anuncia que vai arrochar não só o salário mínimo, mas também o crédito e os gastos públicos [o ministro anunciou recentemente restrições ao crédito e um corte de R$ 50 bilhões do orçamento].
Além disso, as Centrais Sindicais tiveram que lidar com as manobras, as encenações e a demagogia da oposição. Esta bradou discursos vazios da tribuna por valores supostamente maiores, mas na prática trabalhou durante todo o tempo para impedir o aumento real do salário. A retirada de última hora do apoio do DEM e do PSDB à emenda, costurada pelo PDT, de um mínimo de R$ 560 através da antecipação da parte do reajuste previsto para 2012, deixou claro o caráter hipócrita da atuação de tucanos e demistas.
Apesar da crise internacional que derrubou o Produto Interno Bruto (PIB) de 2009 para um valor negativo de 0,6%, as bancadas governistas prenderam-se às formalidades para defender o arrocho do salário mínimo. Foram desonerados os impostos para as grandes empresas, reduzido os depósitos compulsórios dos bancos e injetado recursos em instituições financeiras em dificuldades, mas para os trabalhadores a proposta é o adiamento do aumento real do salário mínimo. O pretexto repetido à exaustão pelos líderes do PT e do governo na sessão da quarta-feira foi que não se podia romper o critério acertado com o governo Lula de repor a inflação corrente mais o PIB de dois anos. As Centrais Sindicais, que lotaram as galerias do Congresso, repetiram que o acordo tinha como meta uma política permanente de “recuperação” do salário. E para voltar, até 2023, ao valor original do salário mínimo, como era a idéia inicial, o aumento tem que ser superior a 100%. Por isso, para os sindicalistas, quem quebra o acordo é quem interrompe os aumentos reais, como está sendo feito agora. Além do mais, os trabalhadores insistiram que tinham o direito ao mesmo tratamento especial que foi dado a banqueiros e empresários.
A proposta de interrupção do acordo e do adiamento da recuperação do salário mínimo contou com os votos de toda a bancada do PMDB, do PSB, do PCdoB, do PMN, do PP, do PR, do PRB, do PSC. A bancada do PT (78 deputados) teve dois votos contra o adiamento, além do presidente da Câmara, Marco Maia, que dirigiu os trabalhos e não votou. A bancada do PDT, que teve uma forte atuação do deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força Sindical, pelo acordo em torno dos R$ 560, acabou dividida.

CRITÉRIOS

A bancada do PV, com o sindicalista Roberto Santiago também defendendo o valor de R$ 560, apresentou um grande número de abstenções. O PSDB manteve o seu tradicional descompromisso com o país e os trabalhadores e só fez demagogia durante toda a sessão. Fixou-se em no valor simbólico de R$ 600 e foi derrotado por 350 votos a 117. Já o DEM, que impediu o acordo em torno da antecipação para que o salário mínimo ficasse em R$ 560, se dividiu e não teve peso no resultado final da votação.
O projeto de lei do Executivo foi votado em regime de urgência e, além de manter os critérios de reajuste do salário mínimo acertados entre os trabalhadores e o governo nos anos anteriores, determina que nos próximos quatro anos a presidente Dilma Rousseff definirá o aumento do mínimo por decreto, “com base nos termos da lei aprovada”. O critério do reajuste pela inflação do ano acrescido do índice do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores ficou, portanto, mantido pelos próximos quatro anos. Aprovado na Câmara o projeto segue agora para o Senado Federal. Os trabalhadores prometem continuar a mobilização também no Senado em defesa do aumento real e da política recuperação do salário mínimo.
SÉRGIO CRUZ

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