sábado, 2 de julho de 2011

Sustentados pelo BNDES, franceses podem ter 65% do Pão de Açúcar

A transação anunciada na terça-feira (28) em São Paulo de fusão entre o Pão de Açúcar e o grupo francês Carrefour no Brasil tem um detalhe fundamental: a injeção de recursos por parte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), através da BNDESPar. Com o argumento de criar um “campeão nacional”, o BNDES irá injetar R$ 3,91 bilhões, 85% do necessário. Os R$ 690 milhões restantes (15%) virão de um fundo do BTG Pactual.

Em caso de aprovação do negócio, será criada a holding Novo Pão de Açúcar (NPA), com o Carrefour (matriz) ficando com 50%, o grupo francês Casino com 15%, BNDES com 18%, Abílio Diniz com 8,5%, BTG Pactual com 3,2% e o restante com o mercado. Ou seja, os franceses - Carrefour e Casino - ficariam com 65% do capital. No final das contas, o Pão de Açúcar continuará uma companhia francesa, em nada se parecendo com o que o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, costuma chamar de “inter-nacionalização de grupos nacionais”. A NPA já está sendo chamada de “AmBev do varejo”.

A nova empresa concentrará quase um terço do varejo no Brasil. O setor que movimentou R$ 201,6 bilhões em 2010. O Pão de Açúcar respondeu por 17,9% das vendas (considerando Casas Bahia e Ponto Frio), a seguir veio Carrefour com 14,4% e em terceiro o Walmart, com 11%.

Além do dinheiro do BNDES, para o negócio ir adiante é necessária a concordância do grupo Casino, que possui a maior participação acionária atual do Pão de Açúcar e que iria assumir o seu controle em 2012. Ao que parece, de sócio minoritário e já com data marcada para perder o controle do Pão de Açúcar, Diniz pretende ficar no mesmo nível que o grupo Casino - e sem meter a mão no bolso.

Resta saber se o grupo francês vai aceitar a proposta, da qual teve conhecimento na última hora. Em comunicado, afirmou que a proposta estruturada “em segredo e de forma ilegal” tem como objetivo “frustrar a disposição do acordo de acionistas” do Pão de Açúcar e “indiretamente expropriar do Casino o direitos de controle adquiridos e pagos no ano de 2005”.

É no Brasil onde o Casino tem maior faturamento no mundo. Na França, sede do grupo, tem apenas 12% das vendas no varejo, bem distante dos 60% do Carrefour.

A proposta de fusão com o Pão de Açúcar, com participação majoritária, pode ser a redenção do combalido Carrefour, que projeta uma queda de 35% no resultado operacional na França, com as vendas desacelerando. No ano passado, o Carrefour anunciou um rombo de 550 milhões de euros nas contas no Brasil. Na terça-feira, em Paris, informou que o faturamento atual no Brasil é de 12,4 bilhões de euros, incluindo a rede Dia, e que se a fusão for aprovada passaria para 30 bilhões de euros.

O presidente do PMDB, senador Valdir Raupp (RO), criticou a possibilidade de o BNDES participar da fusão. Para ele, o banco deveria ajudar empresas do país, não “lojas de varejo” que já têm um alto faturamento. “Tem que pegar esse aporte de R$ 4 bilhões e injetar em outras empresas. O BNDES já financiou grupo frigorífico quebrado. O Brasil não precisa disso, o consumidor não precisa disso”, frisou.

A participação do BNDES no acordo Pão de Açúcar/Carrefour está entre suas três maiores operações de participação, juntamente com a criação da JBS Friboi e da compra da BrT pela Oi, ambas um verdadeiro fiasco. Para o frigorífico, o volume liberado já soma R$ 7,5 bilhões, com o BNDES tendo 22,36% de participação na JBS. Para a compra da BrT, os recursos liberados foram R$ 6,9 bilhões entre participação e empréstimos.

A concentração preocupa fabricantes de eletroeletrônicos, alimentos e bebidas, que temem perder de barganha nas negociações dos preços.

CUT: “não é papel do BNDES patrocinar monopólios”

O movimento sindical também se posicionou contra a operação. “A CUT (Central Única dos Trabalhadores) é contra a utilização de recursos do BNDES em operações de fusão de empresas do setor privado. É preciso ficar claro, de uma vez por todas, que não é papel do BNDES patrocinar negócios bilionários como o que vem sendo discutido entre os grupos varejistas Pão de Açúcar e Carrefour. Quem ganha com isso? Qual o beneficio para a sociedade? Essa concentração em verdadeiros monopólios não vai fazer com que os preços aos consumidores sejam cada vez mais elevados?”, questionou o presidente da CUT, Artur Henrique.

Para o dirigente Sindical, “o BNDES, financiando, em parte, com recursos do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, tem um papel fundamental que é ser um instrumento de financiamento de longo prazo para todos os segmentos da economia, com políticas realmente focadas nas dimensões social, regional e ambiental, como diz o site do banco. Se trata de discutir que modelo de desenvolvimento queremos para o Brasil. Ampliar os investimentos no social, na economia solidária, nas micro e pequenas empresas, no desenvolvimento regional faz parte desse debate”.

Força e Fecomerciários condenam “fusão predatória”

As direções da Força Sindical e da Fecomerciários divulgaram nota sobre a fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour: “A fusão pode ser o início de uma concentração predatória, que poderá gerar monopólio no setor varejista.

A união das empresas criará uma gigante que dominará praticamente um terço do varejo supermercadista brasileiro. Claro indício de que haverá concentração, gerando potencial anticompetitivo”.

Nenhum comentário: