sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

FASCISMO E RESISTÊNCIA NO EUA


Em "Criminalizing Dissent in America", afirma o autor: Os EUA patinam em terreno escorregadio para a plena tirania. A liberdade está pendurada por um fio. Abaixo, a tradução integral do texto

STEPHEN LENDMAN*


Os Estados Unidos têm uma sórdida história repressiva. De violação, entre outros, dos direitos garantidos pela Primeira Emenda.

[NOTA DO HP: O texto da Primeira Emenda da Constituição dos EUA é "O Congresso não fará nenhuma lei sobre religião ou proibindo seu livre exercício, ou restringindo a liberdade de expressão ou de imprensa, ou o direito do povo de pacificamente se reunir e exigir do governo que corrija injustiças."]

As leis sobre sedição e sobre os estrangeiros, de 1798, restringiram as liberdades da Primeira Emenda.

O mesmo fizeram, em 1919, os "Palmer raids" anti-comunistas, o Comitê Especial para Atividades Anti-americanas, em 1934, o seu sucessor, o Comitê da Câmara para Atividades Anti-americanas (HUAC), as repressões do secreto COINTELPRO do FBI, o Anti-Terrorism and Effective Death Penalty Act, de 1996, o USA Patriot Act, de 2001, e outras medidas pós 11 de setembro.

[N.HP: Os "Palmer raids" foram prisões e deportação de homens e mulheres apenas por suas convicções, promovida pelo procurador-geral do governo Wilson, Mitchell Palmer, que nomeou para a tarefa o até então desconhecido J. Edgard Hoover; o COINTELPRO (iniciais de "programa de contra-inteligência" em inglês), foi uma série de operações ilegais e clandestinas – censura da correspondência, incêndios e assassinatos - contra opositores, realizadas pelo FBI, e seu então diretor, o mesmo J. Edgard Hoover, entre 1956 e 1971.]

Essas e outras medidas estenderam a vigilância do governo, corroeram o direito de habeas-corpus, formalizaram tribunais militares, permitiram confissões extraídas por tortura, e instituíram a violência para a segurança nacional.

O FBI, com seus "perfis de terroristas", pode investigar qualquer um, por qualquer razão. Pode trabalhar cooperativamente com a polícia local ou por conta própria. Os protestos de rua podem ser criminalizados. O direito dos Estados Unidos de divergir está em perigo.

A 28 de Outubro de 2011, o juiz Russell Canan, do Tribunal Superior do Distrito de Colúmbia [Washington], decidiu que oito Veteranos Pela Paz (VFP) eram culpados por "falha em obedecer" e "bloquear/incomodar". Foram multados em 150 dólares. Poderia ter sido muito pior.

Os réus citaram o direito da Primeira Emenda de exigir do governo a reparação de injustiças. Fundado em 1985, os Veteranos Pela Paz (VFP) se opõem a guerras patrocinadas pelos EUA, com o objetivo de ajudar a terminá-las.

Eles também querem que as leis nacionais e internacionais sejam obedecidas, e que acabem os crimes de guerra e contra a Humanidade. Durante os procedimentos processuais, Richard Duffee fez petições para que peritos legais internacionais testemunhassem no julgamento. O juiz Canan negou as petições. Os acusados vão recorrer da sentença.

Em fevereiro passado, os membros do Comitê Nacional Democrata escolheram Charlotte, na Carolina do Norte, para sediar a convenção nacional do partido em 2012.
Chamada de "a Wall Street do Sul", as autoridades da cidade redigiram uma regulamentação municipal, fazendo do acampamento em local público uma "perturbação da ordem pública". A regulamentação também proíbe "substâncias nocivas", cadeados e outros equipamentos de camping potencialmente capazes de impedir o tráfego e criar preocupações de segurança pública. Até o final de janeiro, espera-se que ela seja aprovada.

O prefeito de Charlotte, Anthony Foxx, declarou que a regulamentação não tem como alvo grupos específicos, dizendo:
"Ao contrário de muitas cidades que têm regulamentos bem elaborados para disciplinar as atividades de protesto, nossos regulamentos locais têm brechas que necessitam ser preenchidas."

No entanto, um memorando, expondo a regulamentação, declara:

"Além disso, os recentes problemas relacionados a acampamentos em locais municipais, aumentaram a necessidade de rever se a cidade quer regular esta atividade durante a Convenção Nacional Democrata."

Um vereador da cidade, declarou que, uma vez aprovada a regulamentação, acabarão as estadias durante a noite do Occupy Wall Street. A North Carolina’s National Lawyers Guild [N.HP: equivalente à seção estadual da Ordem dos Advogados] citou questões constitucionais e o possível "aumento da confrontação entre os manifestantes e a polícia".
Luis Rodriguez, um organizador do Occupy Wall Street, disse que todo mundo chama a Convenção Nacional Democrata em Charlotte de "ground reduce to zero" [N.HP: "ground zero" é o epicentro de uma explosão]. "Todo mundo quer estar lá. Nós estamos estimando que irão milhares da comunidade do Occupy". Foi proposto organizar uma convenção alternativa.
Tampa sediará a Convenção Nacional Republicana de 2012. Milhares de policiais farão a segurança das áreas onde se realizará a convenção. As autoridades esperam até 15.000 manifestantes na cidade.

As autoridades locais e federais têm planos de contingência para qualquer coisa. A Homeland Security (DHS) [N.HP: Departamento de Segurança Interna do governo dos EUA] chama as convenções nacionais, assim como as reuniões do G-8/G-20, do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial, e semelhantes, de "eventos especiais de segurança nacional".

A 18 de Janeiro, a câmara de vereadores de Chicago apreciará as medidas anti-protesto do prefeito Rahm Emanuel. Grupos próximos ao Occupy declaram que os dispositivos são para desencorajar o discurso político que é garantido pela Constituição. Esses dispositivos reduzem a duração das manifestações a duas horas e dobram a multa por detenções.

Outras providências restringem os organizadores de passeatas e permitem aos funcionários da cidade arrecadarem multas punitivas. O comissário de polícia de Chicago também poderia substituir os oficiais federais e das agências estatais responsáveis pela aplicação da lei em cada jurisdição, incluindo o FBI, a DEA, o ATF [Bureau of Alcohol, Tobacco, Firearms and Explosives], a polícia do Estado de Illinois, o Procurador-geral de Illinois, o Departamento de Justiça, o procurador do Estado no condado de Cook, e outros.

A coordenação de esforços federais e locais tem como alvo os manifestantes do Occupy Wall Street.

As medidas de Chicago propõem uma escalada na repressão. O Occupy Wall Street e outros manifestantes são os alvos. Assim como os direitos fundamentais.

PISANDO NOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS

As medidas repressivas pós 11 de setembro corroeram os direitos constitucionais. Capitalizando uma janela de histeria, poderes incontrolados foram concedidos ao executivo.

Os dispositivos do USA Patriot Act comprometeram o processo legal, a liberdade de associação, e as garantias contra investigações e prisões sem razão. Elas também autorizaram poderes de vigilância incontrolados para acessar registros pessoais, controlar transações financeiras, bem como registros estudantis, médicos e outros.

Praticamente todas as garantias constitucionais foram derrubadas. Pela primeira vez, o "terrorismo interno" virou um crime federal, aplicável a cidadãos dos Estados Unidos e a estrangeiros. As violações legais criminais são consideradas atos terroristas internos se elas aspirarem a "influir (na política do governo) por intimidação ou coerção (ou) intimidar ou coagir a população civil".

Em outras palavras, as manifestações não-violentas contra a guerra ou por justiça no mundo, as ambientais ou o ativismo pelos direitos dos animais, a desobediência civil, e a oposição de qualquer espécie, podem ser chamadas de "terrorismo interno", inclusive as manifestações do Occupy Wall Street.

Sem que o cidadão seja ouvido ou avisado previamente, o Patriot Act, seção 806, permite às autoridades confiscar ou congelar os bens dentro do país ou no exterior de qualquer entidade, indivíduo ou organização, acusados de engajar-se no planejamento, apoio, dissimulação ou autoria de atos, chamados de terrorismo interno ou internacional, contra os EUA. Mesmo manifestações não-violentas estão incursas.

Outras rudes disposições dão às autoridades amplo espaço para distorcer a lei perversamente e vantajosamente. Como resultado, qualquer pessoa associada a atividades que sejam chamadas de terrorismo pode ser alvo, verdadeiro ou não.

Sem precedentes no escopo, foi concedida uma ampla gama de poderes ao Executivo. Supervisão judicial e do Congresso com algum significado estão ausentes.

Em março de 2006, o Congresso renovou a maioria dos poderes do Patriot Act. A 19 de maio de 2011, três dos principais dispositivos foram prorrogados por outros quatro anos. Eles incluem:

(1) Permissão ilimitada de escuta secreta.

(2) Autorização ao governo para ter acesso a "qualquer item tangível", inclusive registros e transações financeiras, registros estudantis e médicos, conversações telefônicas, e-mails e outros usos da Internet, e o que quer que seja é passível de vigilância.

(3) Permissão para vigilância de organizações e indivíduos alegadamente suspeitos, mesmo sem evidência de ligação a terrorismo ou cumplicidade para cometê-lo.

Os dispositivos do Animal Enterprise Terrorism Act, de 2006, também podem ter como alvo o Occupy Wall Street e outros manifestantes. Projetado principalmente contra ativistas dos direitos dos animais, ele aplica-se a outras causas, atividades de protesto, e todas as formas de desobediência civil.

Além disso, com repressão tão extrema, qualquer coisa pode ser chamada de terrorismo ou de atividades conectadas com ele, ameaçando a segurança nacional.

Em setembro de 2010, agentes do FBI invadiram casas e escritórios de ativistas contra a guerra em Chicago e Minneapolis. Seguiram-se intimações do Grande Júri [N.HP: No sistema judicial dos EUA, o Grande Júri é a instância que decide se há razões para que um acusado seja submetido a julgamento.].

Em junho, a decisão da Suprema Corte no processo Holder v. the Humanitarian Law Project [projeto de lei humanitária], condenou o discurso não-violento e a defesa da causa como "coordenados com (ou) sob a direção de" grupos terroristas estrangeiros de designação ilegal.

As garantias da Primeira Emenda não se aplicam. Occupy Wall Street e outros manifestantes podem ser chamados de terroristas. Pode-se seguir a detenção indefinida em prisões militares.

Os direitos de cidadania também estão ameaçados, se a legislação apresentada passar no Congresso.
Chamada de Enemy Expatriation Act [Lei de Expatriação de Inimigos], ela permite que Washington casse sumariamente a cidadania de americanos por engajar-se em, ou dar propositadamente e materialmente apoio, a hostilidades contra os EUA. Nenhuma prova para corroborar a acusação é necessária. Em outras palavras, condenações judiciais justas, de acordo com a lei, não se aplicam.

UM COMENTÁRIO FINAL

Os EUA patinam em terreno escorregadio para a plena tirania.
A liberdade está pendurada por um fio. Qualquer pessoa que desafiar o poder de Estado é vulnerável. Garantias constitucionais não se aplicam.

A autoridade do diktat presidencial substituiu-as. A lei marcial assoma, se assim ordenado. Os manifestantes não-violentos estão ameaçados.

* Nascido em Boston, Stephen ve Lendman é administrador de empresas, formado em Harvard, com mestrado na University of Pennsylvania Wharton School; é analista de mercado e empresário. Hoje, reside em Chicago.

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