quarta-feira, 4 de novembro de 2009

CARTÃO CORPORATIVO E "MÍDIA ESGOTO"

CARTÃO CORPORATIVO E "MÍDIA ESGOTO"


por ALTAMIRO BORGES

O jornalista Luis Nassif, numa série imperdível no seu blog sobre os podres da revista Veja, cunhou a expressão “jornalismo esgoto”. Ela se encaixa perfeitamente na nova ofensiva patrocinada pela mídia hegemônica para fustigar o governo Lula.


Agora o mote são os chamados cartões corporativos usados pelo presidente, ministros e outros servidores para efetuar gastos cotidianos. O terrorismo midiático já decapitou a ministra Matilde Ribeiro, da Igualdade Racial, e chamuscou criminosamente a imagem dos ministros Orlando Silva, dos Esportes, e Altemir Gregolin, da Pesca. Mas o alvo é bem maior.

A escalada agressiva do denuncismo se volta diretamente contra o próprio presidente Lula, que às vezes se finge de morto diante dos ataques da oposição de direita e da mídia e cede às pressões. O jogo é pesado e gera corrosivas conversas nas ricas camadas médias – que, segundo recente pesquisa, ainda endeusam a mídia e preferem pensar com a cabeça dos seus donos. A ofensiva confunde até parcelas progressistas da sociedade.


A marcha udenista é arrasadora e intensa e pode resultar, segundo líderes da oposição liberal-conservadora, numa nova crise política e na instalação de outra CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). É tudo o que a direita golpista, confusa e rachada, deseja para desgastar o governo Lula num ano eleitoral.

Ausência de informações sérias

Nesta brutal ofensiva, o que menos vale é a informação imparcial e a justa fiscalização do poder público. O objetivo não é denunciar os abusos e deslumbramentos dos governantes, visando a sua correção – como afirmam alguns ingênuos ou oportunistas –, mas sim fortalecer a oposição de direita. A mídia hegemônica sequer informa os seus leitores e telespectadores que o uso dos cartões corporativos ou de outros afins é comum no mundo todo. Autoridades governamentais – assim como executivos das empresas capitalistas, jornalistas vestais da ética e até intelectuais “quimicamente puros” – costumam viajar, hospedar-se em hotéis e marcar contatos para tratar de assuntos de interesse político, profissional ou acadêmico.


Frente às despesas corriqueiras, o cartão corporativo é um avanço, que, evidentemente, necessita sempre de ajustes. Ele foi criado em 2001, na gestão de FHC, devido às denúncias da falta de controle dos gastos. Antes, um ministro recebia a quantia em dinheiro, depositava na sua conta, pagava as despesas e depois apresentava a nota. Não havia qualquer transparência. Através do decreto nº. 5.355, de janeiro de 2005, o governo Lula ainda procurou regulamentar melhor o uso do cartão. Segundo o decreto, ele pode ser usado na “aquisição de materiais e contratação de serviços”, na compra de passagens aéreas, locação de veículos e no pagamento de hotéis, refeições e diárias de viagem. É proibido utilizá-lo em viagens internacionais.


Maior transparência e fiscalização



Outro importante avanço é que atualmente todos os dados das despesas estão disponibilizados na internet, através do Portal da Transparência, implantado em 2004. É possível acompanhar os gastos dos 11.510 servidores da administração federal que possuem o cartão corporativo, segundo balanço de dezembro de 2007. As despesas ainda são fiscalizadas pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Diante das recentes denúncias, o governo decidiu apertar mais o cerco. Um novo decreto restringe a conta “tipo B”, que ainda previa saques em dinheiro, e limita gastos em viagens.


Segundo Luiz Navarro, secretário da CGU, “o cartão é uma instrumento moderno, que permite melhor controle do que o velho talonário de cheques. O aumento das despesas acontece simultaneamente à redução do volume de pagamentos feitos pelo sistema antigo (tipo B)”. Mesmo assim, ele defende a manutenção dos saques em dinheiro para os casos inevitáveis, como o dos servidores do Incra, Ibama e Funai, que operam em zonas rurais, e para ações sigilosas da PF e da Abin. Por fim, ele lembra que “a imprensa e a sociedade hoje podem acompanhar fácil e completamente tudo isso graças à política de transparência pública adotada pelo atual governo. Até 2004 essa possibilidade simplesmente inexistia”.



Mídia tucana e gastos de FHC


Estas e outras informações, decisivas na formação da opinião pública, não têm destaque nos noticiários. Além de tratar o tema como um escândalo político, a mídia hegemônica esbanja parcialidade. Ele sequer informou os seus inocentes úteis que o relatório da Controladoria Geral da União (CGU), divulgado em janeiro, atesta que a despesa total com o cartão corporativo situa-se entre 0,002% e 0,004% das despesas totais do Poder Executivo – uma mixaria comparada ao que é gasto com os juros pagos aos rentistas (R$ 174 bilhões em 2007) ou mesmo aos R$ 1,04 bilhão gastos em publicidade oficial na mídia mercenária.



O “jornalismo esgoto” e descaradamente tucano também não deu manchetes aos dados da CGU sobre os gastos do governo FHC com suprimento de fundos (que envolvem os cartões corporativos). Eles foram de R$ 213,6 milhões, em 2001, e de R$ 233,2 milhões, em 2002. No governo Lula, eles foram reduzidos e mantêm-se, nos últimos cinco anos, a média anual de R$ 143,5 milhões. Segundo a CGU, as despesas só superaram este patamar em 2007, atingindo R$ 176,9 milhões, devido às despesas da Abin na segurança dos jogos Pan-americanos, à realização de dois censos do IBGE e à intensificação das operações da Polícia Federal. Elas representaram 82,4% do aumento dos gastos com cartões.


Blogueiros e o sumiço dos pragmáticos



Tamanha manipulação da “mídia esgoto” tem gerado a justa revolta dos que ainda prezam pela ética e pelo oficio do bom jornalismo. Bem diferente de certos políticos pragmáticos, que temem a ditadura midiática, fogem do debate de idéias e cedem às pressões, alguns blogueiros partem para o contra-ataque. Renato Rovai, editor da revista Fórum, critica inclusive o presidente Lula. “Ao deixar a ex-ministra Matilde Ribeiro sendo massacrada pelos meios de comunicação até ser obrigada a entregar o cargo para saciar a sanha de setores da mídia, o governo cometeu mais uma dos seus estúpidos erros políticos na relação com a oposição midiática... Ao oferecer aliados para saciar a fome dos opositores, em geral o que se faz é aumentar o apetite desses”.



Diante desta passividade, os blogs dão munição para ajudar na batalha de idéias. Lembram, por exemplo, que a filha de FHC, que era funcionária da presidência, utilizou um avião da FAB para vistoriar as fazendas do pai e nunca prestou contas da despesa; que outro filho, Paulo Henrique, gastou R$ 10 milhões dos cofres públicos para montar um stand numa feira na Alemanha; e que ministros tucanos, como José Serra e Raul Jungmann, fizeram viagens de turismo com verbas públicas. O Onipresente até pesquisou o Portal da Transparência para investigar o uso do cartão corporativo por seguranças de FHC – a lei garante a regalia aos ex-presidentes. Somente em 6 de agosto de 2007, o servidor Eduardo Sacillotto encheu quatro vezes o taque do carro de FHC.


Serra e os jantares no Fasano



Eduardo Guimarães, do blog Cidadania, adverte que está em curso uma nova guerra da mídia contra o governo Lula. “Os cartões corporativos, a CGU e o Portal da Transparência constituem uma fonte inesgotável de ‘matéria prima’ para a mídia acusar o governo. Cada compra feita e devidamente registrada será tratada como se fosse gasto pessoal do membro do governo... Não importa se era assim, se é assim em qualquer parte e se continuará sendo assim. O que importa é dizer ao povo: ‘enquanto você come pescoço de frango, o Lula come picanha argentina”. Ele propõe a imediata mobilização dos “sem mídia” para denunciar que “as contas do governo Serra são uma caixa preta e que ele, ao contrário de Lula, não tem coragem de expô-las”.


Já o jornalista Luiz Antonio Magalhães, que não morre de amores pelo governo Lula, afirma que “a histeria da grande imprensa com os gastos nos cartões corporativos é apenas mais uma forma de jogar para a torcida e de apostar no udenismo rastaqüera para tentar prejudicar a imagem do governo. O problema é que talvez a opinião pública esteja uma pouco mais madura do que os jornalões imaginam. Ela já sabe que

Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2ª edição).

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