terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Dilma informa a empresários que indústria está crescendo


Discurso aconteceu no 8º Encontro Nacional da Indústria

Os empresários brasileiros são muito educados. Nós, também. Por isso, preferiríamos omitir os 37 minutos e 10 segundos que a presidente Dilma gastou em seu discurso no Encontro Nacional da Indústria (ENAI), na quarta-feira. Mas, infelizmente, somos um jornal – e função de jornal é informar aos leitores sobre os fatos. Além disso, se os empresários aguentaram até o fim a arenga presidencial, por que nós não poderíamos fazer um sacrifício semelhante? Então, vamos lá.
Talvez algum empresário vindo de Marte – ou adjacências – tenha gostado muito de saber que, ao contrário dos outros países da Terra, com suas “baixas taxas de crescimento”, “nada mais diferente que a realidade do Brasil”, com “um mercado interno dinâmico, estímulo fundamental para o crescimento de nossa produção” e onde “os indicadores da economia persistem positivamente mostrando a continuidade de uma trajetória sustentável de crescimento (...). Estamos colecionando conquistas e avanços” e tudo porque “foram muitas as medidas e as decisões tomadas em favor da indústria brasileira. Ouso dizer que em poucos momentos da nossa história o desenvolvimento da indústria esteve tão presente, tão no centro das atenções e das preocupações do governo. (…) Temos garantido créditos para a indústria em condições adequadas de prazo e custo. (…) permitindo manter uma relação e uma trajetória sustentada de crescimento da produção industrial”.
A “trajetória sustentada de crescimento da produção industrial” é a seguinte: em 2010, último ano do governo Lula, ela crescera +10,5%. Em 2011, ela caiu para 0,3%. Em 2012, continuou afundando e foi para -2,7% (menos 2,7%). Agora, está em apenas 1,6%, de janeiro a outubro.
Como consequência desse massacre, o PIB, que crescera 7,5% em 2010, caiu para 2,7% em 2011, 1% em 2012 e agora tem a medíocre perspectiva de chegar, talvez, a 2,2% este ano, uma taxa inferior a de quase todos os países do mundo, assim como as de 2011 e 2012.
Em apenas dois anos de governo Dilma, a participação da indústria de transformação no PIB caiu 3 pontos percentuais (3 p.p.) em relação ao último ano do governo Lula (2010) - e continua caindo.
O valor adicionado na indústria caiu de +10,4% (2010) para +1,6% (2011), -0,8% (2012) e, até setembro deste ano, estava em apenas +1,2%.
A preços constantes (ou seja, descontando a inflação) o valor da produção industrial encontra-se no mesmo nível do terceiro trimestre de 2008, isto é, no mesmo nível de cinco anos atrás.
Será que tudo isso aconteceu – e continua acontecendo – pelo cuidado extremoso do governo Dilma para com a indústria?
Nem aquele presidente que, sob a ditadura, disse que o Brasil era uma ilha de paz e tranquilidade num mar tormentoso seria capaz de tal conclusão. Talvez o empresário que veio de Marte tenha se convencido, após ouvir a presidente.
Porém, os empresários brasileiros não têm a menor condição de ignorarem sua própria vida, depois de três anos de política hostil à indústria, em síntese, de política anti-industrial.
Não é possível, pela repetição ad nauseam da palavra “competitividade”, fazer a mágica de convencer os empresários de que são eles os culpados por essa situação de calamidade. Dizer que são as empresas nacionais, ou os empresários, que não são “competitivos”, é acusar essas empresas e empresários das consequências da sua própria política anti-industrial – e, ao mesmo tempo, recitar uma deslumbrada litania às multinacionais que desindustrializam o país sob a proteção do governo.
Que indústria é “competitiva” com juros altíssimos, câmbio artificialmente a favor das importações, estímulo à desnacionalização das empresas, cortes nos investimentos, gastos e financiamentos públicos, omissão completa diante da desindustrialização, privilégios reiterados aos bancos e multinacionais e restrição do mercado, através de uma escamoteada contenção salarial?
O problema da nossa indústria, ao contrário do que a presidente falou, não é “se inserir no quadro econômico internacional”, pois isso ela já está há muito. O problema da nossa indústria, pelo contrário, é que ela está sendo destruída dentro do seu próprio país por asfixia meramente financeira, com seu mercado – o mercado nacional, o mercado interno – sendo ocupado por importações diretas ou indiretas (produtos montados a partir de componentes importados) totalmente desnecessárias. Como ser “competitivo” lá fora se a sua base, aqui dentro, está sendo ocupada pelos supostos “concorrentes”?
É, aliás, um escárnio chamar monopólios multinacionais de “concorrentes”: monopólios não concorrem, apenas usam seu maior poder financeiro para quebrar aqueles que realmente concorrem. Daqui se pode depreender a fraude dessa “competitividade” que só serve para atribuir aos empresários e trabalhadores nacionais uma incompetência que não é deles. Não existe “competitividade” onde não existe competição.
A parcela do consumo interno de produtos industriais ocupada por importações aumentou 13,3% no governo Dilma, segundo dados da FIESP. No terceiro trimestre deste ano, esta parcela, denominada “coeficiente de importação”, estava em 24,7%. Quase toda a expansão do consumo (82,4% dessa expansão) fora ocupada pelas mercadorias importadas e apenas 17,6% pela indústria nacional.
Essa invasão bárbara – ou, melhor, imperialista – não foi provocada por qualquer “falta de competitividade” da indústria nacional, mas pela política do governo.
Da mesma forma, o estado semicalamitoso das exportações. Diz a Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (FUNCEX): “No acumulado do ano até outubro, todas as classes de produtos registram variações negativas nos índices de preços de exportação (...). Faltando apenas dois meses para o encerramento do ano, é certo que os preços das exportações brasileiras deverão registrar queda pelo segundo ano consecutivo” (cf., FUNCEX, Boletim de Comércio Exterior, ano XVII, n° 11, nov. 2013).
Enquanto isso, as importações:
“... o quantum de importação de todas as categorias de uso registrou crescimento de dois dígitos, na comparação com setembro. Os índices de importação foram os mais elevados do ano para as categorias de bens intermediários, bens de capital, bens de consumo duráveis e bens de consumo não duráveis, de tal maneira que o índice da importação total alcançou, também, um valor recorde em 2013” (idem).
Não são os empresários que levaram a essa desastrosa “inserção no quadro econômico internacional”. A política do governo forçou a isso. É dispensável mais uma ladainha, dessa vez aos santos de Bali, Doha e da OMC, por um acordo que nem existe, como está na declaração assinada pelo governo brasileiro. Só em julho de 2014 ele será discutido pelo Conselho Geral da OMC (para que não restem dúvidas, reproduzimos o original dessa declaração: “The text adopted in Bali is not final, although the substance will not change. It will be checked and corrected to ensure the language is legally correct, aiming for the General Council to adopt it by 31 July 2014”).
Talvez a presidente Dilma tenha lido a declaração, mas tenha esquecido.

CARLOS LOPES

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