terça-feira, 8 de novembro de 2011

BRICS não aceitam no G-20 convite para doar 1 trilhão a bancos da UE



Em troca de quê os BRICS iriam colocar 1 trilhão de euros para tapar as crateras dos bancos falidos - ainda por cima, sabendo que, mesmo com esse trilhão, 75% do rombo continuaria descoberto? 



A União Europeia, mais precisamente, a “zona do euro” - pois nem todos os países da UE aceitaram o euro como moeda – é uma “zona dos bancos”. Nesta mesma página, publicamos um interessante (e agudo) artigo, aparecido no “Le Monde”, de Gérard Filoche e Jean-Jacques Chavigné, ambos do Partido Socialista francês, onde essa questão é claramente exposta.

Em suma, esses dois autores mostram que a “zona do euro” (e, inclusive, a União Europeia) é hoje constituída, inclusive na letra da lei, em função de garantir a pilhagem dos bancos – antes de tudo, alemães e franceses, mas também os norte-americanos, protegidos pelo estatuto de “livre circulação de capitais” – sobre os países que compõem essa zona.

O que torna explicitamente estúpido, além de canalha, as acusações à Grécia e outros países que foram, e estão sendo, devastados por esses bancos. A Grécia ou Portugal não são a causa da crise europeia – cuja origem, aliás, está na crise dos EUA. Eles são as vítimas, devido a serviçais internos, da alienação da sua soberania em prol de alguns monopólios financeiros.

Porém, o resultado é que o delírio financeiro passou a ser a doutrina oficial na Alemanha e na França – que, sobretudo a primeira, mas também a segunda, são os países predominantes da UE e da “zona do euro”. Foi o que se pôde constatar na reunião do G-20 e nos dias que a precederam.

Alguém, que não tivesse lido os jornais nos últimos dias, conseguiria acreditar que o plano de Frau Merkel e Mr. Sarkozy era, na reunião do G-20, obter 1 trilhão de euros da China, do Brasil, e dos demais Brics, para “salvar” (?!) os bancos da Alemanha e da França?

Pois assim era, por mais absurdo que pareça. Nas semanas que antecederam a reunião, nos jornais franceses e alemães, em todas as declarações do governo ou de banqueiros, essa era a expectativa. Certamente, havia também os que riam dessas esperanças alucinadas - e eram tratados como réprobos pela mídia, pelos governos e por outros componentes da criadagem dos bancos.

CRATERAS


Mas, em troca de quê os Brics iriam colocar 1 trilhão de euros para tapar as crateras dos bancos falidos - ainda por cima, sabendo que, mesmo com esse trilhão, 75% do rombo continuaria descoberto?

Ora, muito simples e muito óbvio, disse a brilhante Valérie Pécresse, porta-voz do governo Sarkozy: se a França e a Alemanha estiverem bem economicamente, a China, o Brasil, a Rússia, etc., também estarão. Por isso, segundo ela, interessava aos Brics perder dinheiro – 1 trilhão de euros – na goela insaciável dos bancos. Aliás, de acordo com a porta-voz, era do nosso maior interesse realizar essa atraente operação.

Literalmente, isso é uma repetição do que disse Obama, na reunião de Seul do G-20, em novembro passado, ao explicar que as superemissões predatórias de dólares realizadas pelos EUA eram algo que “não é bom apenas para os Estados Unidos, é bom para todo o mundo. Quando todas as nações fazem a sua parte, todos nos beneficiamos de um maior crescimento”.

Se, para Obama, a nossa parte é permitir que os EUA nos saqueiem, para Merkel e Sarkozy a nossa parte é dar diretamente o nosso dinheiro – o que, aliás, ao final e ao cabo, é a mesmíssima coisa. A diferença é que a Alemanha e a França não emitem dólares, isto é, não são os EUA, o que, em vez de sinistro, torna tudo somente ridículo, como se dizia, de um ridículo atroz.

Mas não é por acaso que a porta-voz de Sarkozy repetiu o malsinado Obama. Apenas reflete o fato de que os bancos da França e da Alemanha foram arrastados para o afundamento pelos bancos dos EUA e continuam agarrados aos últimos. Todos eles, a começar por aqueles que até os governos de seus países consideram, publicamente, em perigo imediato, atolaram nos pacotes de derivativos provenientes dos EUA. É o caso do Crédit Agricole (no último balanço, US$ 1,6 trilhão em ativos), do BNP Paribas (US$ 1,9 trilhão), do Société Générale (US$ 1,2 trilhão) e do Commerzbank (US$ 738 bilhões).
Boa parte – provavelmente a maior - desses ativos astronômicos, que somariam mais de US$ 5 trilhões só para esses quatro bancos, é papelada, apenas papelada, só papelada, e nada mais que papelada. Na verdade, e a rigor, sempre foi papelada, e nunca deixou de ser papelada – apenas, agora acabou a alucinação financeira que dava a esses papéis algum valor fictício.

ESPOLIAÇÃO


Para sustentar esse tipo descomunal de vigarice – e espoliação - é que Merkel, Sarkozy et caterva queriam 1 trilhão de euros dos Brics. No jornal econômico francês “Les Echos”, houve quem fizesse a previsão de que a China iria colocar um terço das suas reservas no fundo de bailout dos bancos da UE.

Logo, substituiu-se a anterior alucinação financeira por outra: a de que os Brics salvariam os bancos europeus colocando 1 trilhão de euros num poço sem fundo denominado, pomposamente, Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF). Estamos diante de um sistema que vive de alucinações, porque hoje os monopólios financeiros, de tanto impor alucinações aos incautos, se tornaram, eles mesmos, alucinados. Ainda mais quando estão no meio de um pântano de areia movediça, como é, para eles, a atual crise.

A resposta de um dos representantes dos Brics, o presidente russo Dmitry Medvedev, não foi isenta de alguma verve: “A Europa deve se ajudar a si mesma, e a União Europeia tem tudo para isso hoje - a autoridade política, os recursos financeiros e o apoio de muitos países”. Afinal, não era isso o que eles diziam para a Rússia depois de 1992?

Mais rascante (o que, no caso, é uma virtude) foi a presidente Dilma: “Não tenho a menor intenção de fazer nenhuma contribuição direta para o fundo de estabilização europeu, até porque nem eles [os europeus] têm”. O que é a pura verdade.

Já o presidente da China, Hu Jintao, teceu algumas considerações filosóficas, mais acacianas do que confucianas, sobre a importância da Europa. Desde a primeira Guerra do Ópio, perder dinheiro “ajudando” a Europa é algo que sensibiliza profundamente os chineses...

A presidente Dilma avaliou que a reunião foi um “sucesso relativo”. Não há como discordar da presidente, quando o G-20 decidiu rejeitar uma transfusão de sangue para alguns cadáveres.

Diante disso, o valente Sarkozy, no G-20, resolveu, além da Grécia, atacar o Uruguai, nosso co-irmão do Mercosul. Realmente, o problema da França são os bancos uruguaios...

CARLOS LOPES


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