sábado, 22 de maio de 2010

A ELITE DO PODER FINANCEIRO

O texto que publicamos hoje é uma condensação do ensaio “The Financial Power Elite”, publicado no último número da revista “Monthly Review”, fundada por Paul Sweezy e Leo Huberman. Seu principal interesse é a exposição da concentração financeira nos EUA durante a crise atual, embora os autores também exponham a história dessa concentração desde o final do século XIX
JOHN BELLAMY FOSTER E HANNAH HOLLEMAN
Você está me dizendo que o êxito do programa [econômico] e a minha reeleição dependem do FED e de um maldito punhado de negociantes de títulos?
Presidente Bill Clinton (1)
Só duas vezes no século passado – depois do Pânico Bancário de 1907 e depois da Quebra da Bolsa em 1929 – a revolta contra as elites financeiras dos EUA atingiu os níveis de hoje. Uma pesquisa da Time no final de outubro de 2009 revelou que 71% do público era a favor de impor limites às gratificações dos executivos de Wall Street; 67% queriam que o governo forçasse cortes no pagamento dos executivos nas empresas de Wall Street que receberam dinheiro do bailout federal; e 58% achavam que Wall Street exercia demasiada influência sobre a política de recuperação econômica do governo (2).
Em janeiro de 2009, o presidente Obama capitalizou a raiva crescente contra os interesses financeiros, chamando de “vergonhosos” os exorbitantes bônus bancários, subsidiados com dinheiro dos contribuintes através do bailout, e ameaçou com novas regulamentações. O jornalista Matt Taibbi abriu seu artigo de julho de 2009 na Rolling Stone com: “A primeira coisa que você precisa saber sobre o Goldman Sachs é que ele está em todo lugar. O banco de investimento mais poderoso do mundo é um grande polvo-vampiro com seus tentáculos em torno da face da humanidade, drenando sangue implacavelmente para qualquer coisa que tenha cheiro de dinheiro”. Simon Johnson, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, publicou um artigo no Atlantic, em maio de 2009, intitulado: “O Golpe Silencioso”, criticando a tomada pela “oligarquia financeira americana” de posições estratégicas dentro do governo federal, dando “ao setor financeiro poder de veto às políticas públicas” (3).
A Comissão de Inquérito da Crise Financeira, estabelecida por Washington em 2009, foi encarregada de examinar “as causas, internas e globais, da atual crise financeira e econômica nos Estados Unidos”. Seu presidente, Phil Angelides, comparou sua tarefa à das audiências Pecora na década de 30, que expuseram os excessos especulativos e os delitos de Wall Street. As primeiras audiências, em janeiro de 2010, começaram com os CEOs [chief executive officer: administrador-chefe] de alguns dos maiores bancos de Estados Unidos: Bank of América, JP Morgan Chase, Goldman Sachs e Morgan Stanley (4).
Entretanto, o governo federal continuou o seu programa de salvar os bancos, alimentando-os por funil com trilhões de dólares, através de fusões de capital, garantias de empréstimos, subsídios, compras de ativos tóxicos, etc. Esta é uma época de falências bancárias recordes, mas também de rápida concentração financeira, em que, no cume do sistema financeiro, as empresas já “grandes demais para falir” estão se tornando ainda maiores.
TRUSTE DO DINHEIRO
A raiva contra a existência de um “truste do dinheiro” que governava a economia dos Estados Unidos, atingiu vastas proporções no fim do século XIX e início do século XX. Foi a época em que banqueiros de investimento fizeram o parto de monstros industriais, lançando a nova era do capitalismo monopolista. Em troca, os bancos de investimento obtiveram o que o economista marxista austríaco Rudolf Hiferding, no seu grande trabalho, Capital Financeiro (1910), chamou “os lucros de promotor” (5). Na fusão prototípica do período, a criação em 1901 da U.S. Steel Corporation, o cartel de corretores que o J.P.Morgan & Co. reuniu para lançar as ações no mercado, recebeu uma participação em ações de US$ 1,3 milhão e mais US$ 60 milhões em comissões, das quais o J.P.Morgan & Co. recebeu US$ 12 milhões (6).
O Pânico Bancário de 1907, durante o qual o próprio J.P. Morgan interveio, na ausência de um banco central para estabilizar o setor financeiro, levou à criação em 1913 do Federal Reserve System, com o objetivo de dar liquidez aos bancos durante uma crise. Mas isso levou também a acusações, primeiro feitas em 1911 pelo deputado Charles A. Lindbergh (o pai do famoso aviador), de que havia um “truste do dinheiro” dominando as finanças e a indústria dos EUA. Woodrow Wilson, então governador de Nova Jersey, declarou: “o grande monopólio neste país é o monopólio do dinheiro”.
Em 1912, uma investigação com o objetivo de descobrir a verdade por trás da questão do trust do dinheiro foi lançada pela Comitê da Câmara sobre Bancos e Moeda, presidido por Arsene Pujo, da Louisiana. O Comitê Pujo descobriu que 22% do total dos recursos bancários do país estavam concentrados em bancos e trustes com sede na cidade de Nova Iorque. Ele publicou informações, expondo as linhas de propriedade financeira e controle, enfocando particularmente o extenso império financeiro-industrial de J.P.Morgan, ressaltando as cadeias entrelaçadas de diretoria, através das quais esse controle era exercido. Ele apontou o que via como um “grupo secreto” associado ao trio formado por Morgan, no J.P.Morgan & Co., George F. Baker, no First National Bank, e James Stillman, no National City Bank [NOTA DO TRADUTOR: Stillman dirigia o banco fundado por William Rockefeller, irmão de John D. Rockefeller], bem como vários outros bancos e empresas que eles controlavam. Conjuntamente, o grupo secreto mantinha 300 diretorias em mais de cem corporações. O Comitê Pujo denunciou que o objetivo da extensa rede de propriedade e direção não era tanto investimento, mas o controle das finanças e da indústria dos EUA. Ele concluiu que havia uma “estabelecida e bem definida identidade e comunidade de interesses entre uns poucos líderes das finanças, criada e mantida através da propriedade de ações, das diretorias entrelaçadas, das sociedades e transações em contas conjuntas, e outras formas de domínio sobre bancos, trustes, ferrovias, corporações industriais e de serviço público, que resultaram numa concentração grande e rapidamente crescente do controle do dinheiro e do crédito nas mãos desses poucos homens”.
Embora, ao final, o Comitê Pujo tivesse pouco efeito no Congresso, aumentou a preocupação com o trust do dinheiro e o papel dos banqueiros de investimento. A mais contundente acusação baseada nessas revelações foi feita por Louis Brandeis em O dinheiro dos outros (1913), onde escreveu: “O elemento dominante em nossa oligarquia financeira é o banqueiro de investimento. Bancos associados, trustes e companhias de seguro de vida são suas ferramentas… O desenvolvimento de nossa oligarquia financeira seguiu… linhas com as quais a história do despotismo político nos familiarizou: usurpação, por meio de intrusão gradual mais do que por atos violentos, sutil concentração de funções distintas, muitas vezes escondida longamente… Foi por processos como esses que César Augusto tornou-se dono de Roma” (7) [N.T.: Brandeis foi, depois, nomeado pelo presidente Wilson para a Corte Suprema].
O crash da Bolsa em 1929 e a Grande Depressão levaram novamente a investigações sobre o trust do dinheiro. Em seu discurso de posse, Franklin Roosevelt declarou que “os mercadores do dinheiro fugiram de seus altos assentos no templo de nossa civilização. Devemos agora restaurar neste templo a antiga verdade”. Em 1932, o Comitê do Senado sobre Bancos e Moeda iniciou uma investigação de dois anos sobre o mercado de títulos e sobre o sistema financeiro em geral, conhecida como audiências Pecora, devido ao nome do último chefe da assessoria do comitê, o dinâmico Ferdinand Pecora. Como fez a Comissão Pujo, a investigação Pecora apontou as atividades especulativas dos bancos de investimento filiados aos principais bancos. Também destacou as diretorias interligadas que formavam uma complexa rede cujo centro era um punhado de interesses financeiros, dos quais J.P.Morgan & Co. e Drexel & Co. são especialmente significativos. A investigação Pecora concluiu que o país estava sendo posto “sob controle dos financistas”. Essas audiências levaram diretamente à fundação da Securities and Exchange Commission [N.T.: o equivalente norte-americano da CVM, para fiscalização das bolsas de valores] e, um ano depois, à aprovação pelo Congresso do Glass-Steagal Act, que estabeleceu, entre outras coisas, a separação entre bancos comerciais e de investimento. O sentimento popular da época foi, talvez, melhor sintetizado pelo deputado Charles Truaux, de Ohio, que declarou, em relação ao Securities and Exchange Act, de 1934: “Sou favorável a esta lei, porque ela fará alguma coisa com o mais sanguinário bando de escroques e vampiros que já sugou o sangue da humanidade” (8).
BANCOS TEDIOSOS
O período após a Grande Depressão até a década de 70, foi chamado por Paul Krugman de “a era dos bancos tediosos”. Nos anos 60, o poder relativo do setor financeiro no capitalismo dos EUA declinou. Os bancos de investimento, que tinham sido tão importantes no seu apogeu nas décadas iniciais do século XX, decaíram em poder e influência.
Frequentemente, o crédito pela “era dos bancos tediosos” é dado à regulação das finanças associada ao Glass-Steagall Act e ao Securities and Exchange Act. Entretanto, na realidade, a relativa estabilidade financeira desses anos, e o afastamento do controle financeiro exercido pelos bancos, tem muito mais a ver com o crescimento maciço das gigantescas corporações industriais, no que foi chamado de “a era dourada” da expansão do capitalismo pós-Segunda Guerra Mundial. Essas corporações gigantescas produziram enormes superávits econômicos e puderam bancar sua expansão na maior parte com base em suas próprias finanças internas. John Kenneth Galbraith afirmou em American Capitalism (1952): “Enquanto os bancos, como símbolo do poder econômico, passavam para as sombras, seu lugar era tomado pela corporação industrial gigante” (9). Entretanto, seria mais preciso dizer que o que emergiu depois da década de 20 foi a “coalescência”, sob o capitalismo monopolista, do capital bancário e industrial, como sugerido tanto por Lenin quanto por Veblen (10)
ANOS 70 E 80
Apesar de crises financeiras periódicas, começando com a falência da Pennsylvania Central Railroad, em 1970, o Estado interveio em cada crise como o emprestador de última instância, procurando sustentar o sistema financeiro. O resultado, em décadas, foi o crescimento maciço de um sistema financeiro no qual jamais houve cobrança forçada das dívidas, levando a crises financeiras maiores e a intervenções estatais mais agressivas. Uma indicação do fracasso em erradicar forçosamente as dívidas, apesar das repetidas crises de crédito, e do resultante crescimento da pirâmide financeira, é o aumento sem precedentes históricos da participação dos lucros financeiros (isto é, os lucros de corporações financeiras), que subiu de 17% do total de lucros corporativos internos em 1960 para um pico de 44% em 2002. Apesar de que a parcela de lucros financeiros caiu para 27% até 2007 (em parte devido a ganhos nos lucros industriais nesse período), permaneceu estável à medida em que a crise se aprofundava, e recuperou-se nos primeiros três trimestres de 2009 para 31%, bem acima de seu nível de antes da crise – graças à ajuda federal (e devido ao fato de que os lucros industriais continuaram atolados na recessão). Ver gráfico nesta página.

Formas cada vez mais exóticas de inovação financeira (toda espécie de futuros, opções, derivativos, swaps) apareceram, junto com o crescimento de todo um sistema bancário oculto, fora dos balanços dos bancos. A revogação do Glass-Steagall Act, em 1999, apesar de não ter sido em si mesma um grande evento histórico, simbolizou a dimensão total da desregulamentação que tinha então sido feita generalizadamente. O sistema tornou-se cada vez mais complexo, opaco e ingovernável.
De acordo com o estudo “Grupos de Interesse na Economia Americana”, levado a cabo por Paul Sweezy para a agência do New Deal, o National Resource Committee (publicado no seu relatório de 1939, “A estrutura da Economia Americana”), os cinquenta maiores bancos nos EUA, em 31 de dezembro de 1936, detinham 47,9% da média de depósitos de todos os bancos comerciais em 1936. Isso permaneceu inalterado (pelo menos na superfície) até 1990, quando as cinquenta maiores holdings bancárias dos EUA detinham 48% de todos os depósitos nacionais (11).
CONCENTRAÇÃO
Entretanto, o final da década de 80 e o início da década de 90 foram geralmente considerados como um período de crise para os bancos dos EUA.
Isso também levou ao aumento de falências e fusões bancárias de 1990 a 2007, o que alimentou a concentração e a centralização, à medida em que os bancos buscaram economias de escala e a condição de “grandes demais para falir” dentro da economia (supostamente, a garantia de ajuda do governo federal numa crise). No total, os EUA viram cerca de 11.500 fusões de bancos de 1980 a 2005, uma média 440 fusões ao ano. Além disso, o tamanho das empresas fundidas elevou-se a passos de gigante. Em janeiro de 2004, o J.P.Morgan Chase decidiu comprar o Bank One, formando uma holding bancária com US$ 1,4 trilhão em ativos (atrás, na época, apenas do Citigroup, com ativos de US$ 1,6 trilhão) (12).
A concentração financeira se acelerou ainda mais em decorrência da Grande Crise Financeira que começou em 2007. Números recordes de falências bancárias, e as maiores empresas, as principais beneficiárias da ajuda governamental, procuraram segurança no aumento de tamanho, esperando manter seu status de “grandes demais para falir”.
Dos quinze maiores bancos comerciais dos EUA em 1991 (Citicorp, BankAmerica, Chase Manhattan, J.P. Morgan, Security Pacific, Chemical Banking Corp, NCNB, Manufacturers Hanover, Bankers Trust, Wells Fargo, First Interstate, First Chicago, Fleet/Norstar, PNC Financial, and First Union – com ativos totais de US$ 1,153 trilhão), somente cinco (Citigroup, Bank of America, JPMorgan Chase, Wells Fargo, and PNC Financial - com ativos totais de U$ 8,913 trilhões) sobreviveram como entidades independentes até o final de 2008.
Os bancos de investimento de Wall Street sofreram as maiores transformações. Em 1988, as empresas líderes na oferta de dívida corporativa, títulos baseados em hipotecas, direitos de propriedade e obrigações municipais, eram Goldman Sachs, Merrill Lynch, Salomon Brothers, First Boston, Morgan Stanley, Shearson Lehman Brothers, Drexel Burnham Lambert, Prudential-Bache, and Bear Stearns. No final de 2008, apenas duas dessas nove permaneceram independentes: o Goldman Sachs e o Morgan Stanley, ambos transformados em holdings bancárias, de forma a abrigá-las sob o guarda-chuva da ajuda do governo federal.
Na verdade, o nível global da concentração financeira é muito maior do que aquele que pode ser visto, olhando-se apenas os grandes bancos, já que o que surgiu nos últimos anos são conglomerados financeiros, centralizados em bancos e seguradoras, e engajados num amplo espectro de transações financeiras que dominam a economia dos EUA, inclusive compromissos que estão fora do balanço. Os dez maiores conglomerados financeiros dos EUA em 2008 detinham mais de 60% dos ativos financeiros do país, em comparação com apenas 10% em 1990. O J.P.Morgan Chase agora detém US$ 1 de cada US$ 10 de depósitos bancários no país. O mesmo com o Bank of América e o Wells Fargo. Esses três bancos, mais o Citigroup, agora emitem quase uma de cada duas hipotecas, e respondem por dois de cada três cartões de crédito. Como diz Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s Economy: “O oligopólio se fortaleceu” (13).
Notas:
1 Clinton citado em Bob Woodward, The Agenda (New York: Simon and Schuster, 1994), 73.
2 Henry Kaufman, The Road to Financial Reformation (Hoboken, NJ: Wiley, 2009), 153; “What’s Still Wrong with Wall Street?” Time Magazine, October 29, 2009, 26.
3 Obama Calls Wall Street Bonuses “Shameful,” New York Times, January 29, 2009; Matt Taibbi, “The Great American Bubble Machine,” Rolling Stone, July 13, 2009, http://rollingstone.com; Simon Johnson, “The Quiet Coup,” May 2009, http://theatlantic.com.
4 Paul Angelides, “Opening Remarks,” Financial Crisis Inquiry Commission, Washington, D.C., September 17, 2009.
5 Rudolf Hilferding, Finance Capital (London: Routledge and Kegan Paul, 1981), 128-29.
6 Jerry W. Markham, A Financial History of the United States (Armonk, New York: M.E. Sharpe, 2002), vol. 2, 12-13; Paul M. Sweezy, “Investment Banking Revisited,” Monthly Review 33, no. 10 (March 1982), 6.
7 U.S. House of Representatives, 62nd Congress, Report of the Committee Appointed Pursuant to House Resolutions 429 and 504 to Investigate the Concentration of Control of Money and Credit, February 28, 1913 (Pujo Committee), 55, 129; Markham, A Financial History, vol. 2, 47-54; Louis Brandeis, Other People’s Money (New York: Frederick A. Stokes Co, 1914), 1-4.
8 Markham, A Financial History, vol. 2, 173-86. The most detailed study of the various financial interest groups in the U.S. economy conducted during the New Deal period was “Interest Groups in the American Economy” by Paul M. Sweezy, published as Appendix 13 of Part 1 of the National Resources Committee’s report, The Structure of the American Economy (Washington, 1939). Later reprinted in Paul M. Sweezy, The Present as History (New York: Monthly Review Press, 1953), 158-88.
9 John Kenneth Galbraith, American Capitalism (Boston: Houghton Mifflin, 1953), 108.
10 V.I. Lenin, Imperialism (New York: International Publishers, 1939), 47; Veblen, Absentee Ownership, 227; Paul M. Sweezy and Harry Magdoff, The Dynamics of U.S. Capitalism (New York: Monthly Review Press, 1972), 143.
11 Sweezy, The Present as History, 167; Kenneth J. Stiroh and Jennifer P. Poole, “Explaining the Rising Concentration of Banking Assets in the 1990s,” Federal Reserve Board of New York, Current Issues in Economics and Finance 6, no. 9 (August 2000), 2.
12 Loretta J. Mester, “Some Thoughts on the Evolution of the Banking System and the Process of Financial Intermediation,” Federal Reserve Bank of Atlanta, First and Second Quarters 2007, 67-68.
13 Henry Kaufman, The Road to Financial Reformation (Hoboken, New Jersey: John Wiley and Sons, 2009), 97-106, 234; Floyd Norris, “To Rein in Pay, Rein in Wall Street,” New York Times, October 30, 2009; David Cho, “Banks ‘Too Big to Fail’ Have Grown Bigger,” Washington Post, August 28, 2009.



Em 21 de maio de 2010 00:06, aylton neves escreveu:
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A elite do poder financeiro (2)
Continuação da edição anterior
Os personagens da administração Obama encarregados de política e regulação financeira incluem os principais ex-funcionários do Citigroup. Chase (agora parte do JPMorgan Chase), Goldman Sachs, Merrill Lynch (agora parte do Bank of América), Lehman Brothers, Barclays e Hartford Financial, assim como outras empresas de serviços financeiros
JOHN BELLAMY FOSTER E HANNAH HOLLEMAN
Uma questão crítica atualmente é a extensão na qual tais elementos financeiros chegaram a dominar setores estratégicos nos EUA – e como isso afeta a capacidade do Estado de agir de acordo com as necessidades públicas. A influência dos interesses financeiros é invariavelmente maior no Departamento do Tesouro. Andrew Mellon, banqueiro e terceiro homem mais rico dos Estados Unidos durante o início do século XX, foi secretário do Tesouro de 1921 a 1932. Mais recentemente, Bill Clinton escolheu como seu primeiro secretário do Tesouro o co-presidente da Golman Sachs, Robert Rubin. George W. Bush escolheu com seu terceiro secretário do Tesouro o presidente do Goldman Sachs, Henry Paulson.
Ao analisar a penetração da elite financeira nos corredores do poder do estado (particularmente naquelas áreas onde seus próprios interesses especiais estão envolvidos), a administração Obama merece um escrutínio especial, já que a eleição presidencial ocorreu em meados da Grande Crise Financeira, que levou ao que veio a ser conhecido como a Grande Recessão. Um salvamento do setor financeiro já estava a caminho na administração Bush, e foi expandido sob a nova administração. A escolha de funcionários para lidar com a crise financeira foi, portanto, de longe a maior e mais urgente questão enfrentada pela equipe de transição de Obama logo após a eleição. Foram esses funcionários os responsáveis pela gestão do TARP (o Troubled Asset Relief Program – Programa de auxílio a ativos problemáticos). Desde a eleição de Franklin Roosevelt em 1932 uma situação similar não se havia apresentado.
As escolhas feitas pela equipe de Obama a este respeito estão ilustradas na Tabela, (ver ao final do texto) que apresenta posições selecionadas relacionadas a finanças na administração, e as conexões com o setor financeiro dos indivíduos que preencheram estas posições. Os resultados mostram que os personagens selecionados para desenvolver e executar a política federal relativa às finanças foram em grande parte convocados entre os executivos dos conglomerados financeiros. A evidência indica também que existe uma forte rede com várias ligações com o Goldman Sachs e o antigo secretário do Tesouro Robert Rubin.
PROJETO GRAMM-LEACH-BILLEY
O feito mais notável de Rubin como secretário do Tesouro sob Clinton foi o estabelecimento de bases para a aprovação da Lei de Modernização dos Serviços Financeiros de 1999 (também conhecida como Projeto Gramm-Leach-Billey), que revogou a Lei Glass-Steagall de 1933. Rubin renunciou em maio de 1999 e foi substituído por seu suplente, Lawrence Summers, atualmente consultor-chefe em economia de Obama. Entretanto, em outubro de 1999, Rubin ressurgiu para ajudar a negociar o acordo final na Gramm-Leach-Billey entre a Câmara, o Senado e a administração Clinton. Poucos dias depois de ter sido fechado o acordo, ele anunciou que havia aceito uma posição como consultor sênior (na equipe de três pessoas do presidente do banco) no Citigroup – um dos principais beneficiados pela revogação da Glass-Steagall. Em seu novo emprego, Rubin foi agraciado com uma base salarial anual de US$ 1 milhão e bônus adiados para 2000 e 2001 de US$ 14 milhões anuais, mais opções em 1999 e 2000 para participação acionária de US$ 1,5 milhão no Citigroup. Ele acabou por ganhar US$ 126 milhões em dinheiro e ações na década seguinte.
Summers apoiou decisivamente Rubin em sua campanha de desregulamentação financeira durante a bolha do final dos anos 90, e foi ele mesmo bem compensado em seus esforços. Recebeu US$ 5,2 milhões em 2008 como diretor em meio-período do fundo de hedge D.E. Shaw, e US$ 2,8 milhões por palestras que fez no mesmo ano no JPMorgan Chase, Citigroup, Merrill Lynch, Goldman Sachs e outras instituições financeiras.
O secretário do Tesouro, Timothy Geithner, ex-chefe do Federal Reserve de Nova Iorque, é um protegido de Rubin/Summers, como vários outros na administração. (Geithner foi substituído em 2009 como presidente do Federal Reserve Bank de Nova Iorque por William Dudley, que, antes de sua seleção pela comissão de diretores do Fed de Nova Iorque – chefiado pelo antigo co-presidente de Rubin no Goldman Sachs – foi economista-chefe, associado e gerente no Goldman Sachs). Neal Wolin [subsecretário do Tesouro], até 2008 um funcionário importante no conglomerado de seguros Hartford, hoje secretário-adjunto do Tesouro sob Obama, durante a administração Clinton supervisionou uma equipe de advogados do Tesouro responsável pela revisão da legislação que revogou a Glass-Steagall. Michael Froman, assistente-substituto da Presidência, era o chefe da equipe de Rubin no Tesouro, e o seguiu no Citigroup, onde tornou-se diretor-gerente, depois unindo-se à administração Obama. Ele havia conhecido Obama através de seu trabalho na Harvard Law Review, e apresentou Obama a Rubin.
Os personagens da administração Obama encarregados de política e regulação financeira incluem os principais ex-funcionários do Citigroup. Chase (agora parte do JPMorgan Chase), Goldman Sachs, Merrill Lynch (agora parte do Bank of América), Lehman Brothers, Barclays e Hartford Financial, assim como outras empresas de serviços financeiros. Desta forma, nas reuniões com a administração, os representantes dos maiores interesses financeiros frequentemente se encontram face a face com seus antigos colegas/executivos (e algumas vezes competidores).
FUSÕES
O fato de o Fed estar encarregado de ser o emprestador de última instância acaba por colocá-lo na posição de socializar as perdas financeiras (e de privatizar os ganhos).
As coisas ficam ainda mais complicadas pela existência dos “grandes demais para falir”. Devido a interesses financeiros, isso dá um grande incentivo para as fusões, a fim de assegurar o status automático para o salvamento. Isso tanto aumenta os lucros das firmas vistas como tendo obtido o status de “grande demais para falir” (o que lhes dá “economias de escala” derivadas de sua maior garantia), quanto cria o que é chamado de “risco moral”, já que é mais provável que firmas assim assumam riscos maiores. Juntamente com a tendência geral para a financiarização, o “grande demais para falir” gera condições que ameaçam sobrecarregar a função do Estado como emprestador de última instância.
Uma camada adicional de complexidade e incontrolabilidade é adicionada pelo que Yves Smith, fundador do influente site financeiro Naked Capitalism, chamou de “o coração das trevas”: o sistema bancário oculto, ou o buraco negro de inovações financeiras desreguladas (ou desreguláveis), que inclui conduítes bancários (tais como veículos de investimento estruturado), repôs (acordos de recompra), credit default swaps (troca de inadimplência de crédito), etc. O sistema é tão opaco e permeado de riscos que quaisquer restrições impostas ameaçam desestabilizar todo o castelo de cartas financeiro. No máximo, são feitas tentativas para escorar os grandes bancos, esperando que eles funcionem como âncoras para estabilizar o sistema. Não obstante, isso é tornado quase impossível pelo tamanho assustador do sistema bancário oculto aos quais os principais bancos estão conectados: os compromissos extra-balanços contábeis dos principais bancos comerciais dos EUA em 2007 montavam a trilhões de dólares.
O lobby financeiro norte-americano, enquanto isso, não se deterá por nada para assegurar que a economia do cassino possa continuar do jeito que é atualmente, sem interferências ou mesmo as mais leves concessões. As compensações aos executivos ilustram esse ponto. Em 2000-08, Wall Street pagou mais de US$ 185 bilhões em bônus. Antes de se tornar secretário do Tesouro, Henry Paulson, em 2005, recebia um salário de US$ 600 mil como presidente executivo da Goldman Sachs, mais US$ 38,2 milhões em outras formas de compensação (US$ 70,3 milhões anualmente).

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