quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Para Hillary, Irã só foi democrático sob a ditadura imposta pelos EUA

País com maior arsenal atômico e o único que já perpetrou ataques nucleares contra outro povo, os EUA tentam “demonizar” o Irã para impedí-lo de desenvolver tecnologia nuclear para uso civil. Sobre as bombas de Israel, apenas o silêncio de Hillary

Segundo a secretária de Estado Hillary Clinton, a “pressão” dos EUA contra o programa nuclear civil do Irã não é porque os EUA querem manter o monopólio das armas nucleares sobre a região do planeta mais rica em petróleo, mas porque o Irã “está virando uma ditadura militar” e a Guarda Revolucionária manda mais que “o líder religioso”, “o presidente” e “o parlamento”.

E a gente que não sabia que ela se preocupava tanto com o aiatolá Khamenei, o presidente Ahmadinejad e o presidente do parlamento, Laranjani. A propósito, a inusitada resposta foi dada a uma estudante de Doha, que perguntou porque os EUA pressionavam tanto o Irã, que não tinha armas nucleares, e nada fizeram sobre Israel, com enorme arsenal atômico há décadas. (Sobre isso, silêncio total de Hillary). Ela estava em giro na região, onde o Pentágono já instalou um “guarda-chuva” de mísseis no Kuwait e outros três diminutos protetorados. Foi também conversar com o governo da Arábia Saudita sobre mais sanções contra o Irã, assunto já acertado com a Inglaterra e a França, e para o qual tentam atrair Moscou.

O Irã tem todo o direito a desenvolver seu programa nuclear pacífico, assim como cabe ao povo iraniano e a mais ninguém decidir sobre seu futuro e instituições. E logo quem pretendeu dar aulas de democracia: o país que instaurou a ditadura do xá na década de 50, com um golpe organizado pela CIA. Foi, aliás, nas comemorações do 31º aniversário da revolução que varreu o xá, na semana passada, que o presidente Ahmanidejad anunciou que o Irã estava iniciando o enriquecimento de urânio a 20% - o grau de enriquecimento para produção de isótopos para tratamentos médicos.

Também disse que o país tinha capacidade para “enriquecer a 80%” – que já permitiria ter armas nucleares -, mas, como ressaltou, o Irã não tinha planos para desenvolver a bomba atômica. Milhões de iranianos participaram nas ruas das comemorações.

PERMUTA

A discussão com a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), sobre a permuta de urânio enriquecido pelo Irã a 3,5% por urânio importado a 20% continua em impasse, porque não são atendidas condições mínimas de Teerã, como a troca se dar em território iraniano e de forma escalonada, garantindo que a operação do reator para isótopos medicinais não seja interrompida. Como manifestou o presidente Lula, durante sua visita à Alemanha no final do ano passado, se os EUA e a Rússia quiserem de fato pressionar o Irã, deveriam começar por diminuir de modo significativo os próprios arsenais nucleares. Na reunião com a chanceler Ângela Merkel ele assinalou ainda que “a coisa melhor e mais barata para todos nós é contarmos com as negociações e termos paciência, muita paciência”. Para o presidente brasileiro, “não é apropriado tratar o Irã como se fosse um país insignificante e fortalecer a pressão sobre o Irã todos os dias”.


HIROSHIMA

Por sua vez, o presidente Ahmanidejad reagiu com certa cintura ao comentário de madame Hillary sobre a “ditadura militar no Irã”. “Não levamos os comentários dela a sério”. Como ele destacou, “o orçamento militar dos EUA é 80 vezes maior” que o do Irã. Caridosamente, sequer se referiu ao fato de os EUA serem o único país do mundo que já usou bombas atômicas contra outro povo, em Hiroshima e Nagazaki, e tem em sua “doutrina de guerra” ataques nucleares “preventivos” contra países desarmados.

O supremo líder religioso, o aiatolá Khamenei, foi menos protocolar sobre a missão da secretária de Estado. “Os que transformaram o Golfo Pérsico em depósito de armas para bombear o dinheiro dos países da região mais uma vez enviaram seus agentes para vagabundearem na área e repetirem as mesmas mentiras”, registrou a agência de notícias Fars. “Mas até agora ninguém lhe deu crédito”, afirmou o religioso, acrescentando que os EUA “sempre pisotearam os direitos dos países da região”. “Todos sabem que o verdadeiro Estado belicista é a América, e que eles invadiram o Afeganistão e o Iraque e agora estão acusando a República Islâmica”.

Ao mesmo tempo que Hillary e o Pentágono reiteravam a urgência de acelerar as sanções contra o Irã, o porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, em entrevista no dia 11 afirmou que o governo dos EUA “não acreditava” que o Irã tivesse capacidade para produzir urânio enriquecido “a 20%”. Ele disse que o programa iraniano “tinha sofrido uma série de problemas ao longo do ano” e que a declaração de Teerã “era baseada na política, não na Física”. Comentário que, mesmo com a intenção de atribuir um blefe ao Irã, na verdade revela a falta de embasamento nas acusações contra o país.

ANTONIO PIMENTA



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