sexta-feira, 11 de junho de 2010

RITMO CHINÊS É INVENÇAÕ PARA BLOQUEAR CRESCIMENTO DO PAÍS.

Para isso, BC tratou logo de aumentar os juros

Ulysses Guimarães, que era sábio, disse uma vez que jabuti não sobe em árvore; se está lá, é porque alguém o colocou. Na quarta-feira, as manchetes e títulos da mídia serrista eram jabutis arbóreos: uma festa em torno do crescimento do PIB. Teriam eles se transformado em lulistas convictos da noite para o dia? Talvez isso aconteça no dia em que os jabutis começarem a subir em árvores por moto próprio.

O macróbio Estadão apareceu com: “Expansão de 9% do PIB só perde para China”. A “Folha de S. Paulo” saiu com “PIB tem maior alta desde 1996”. No “O Globo”, o Ali Kamel não se segurou e abriu o jogo: “PIB recorde mostra risco de superaquecimento”.

Claro está, o Brasil não pode crescer – mesmo quando, com a crise dos países centrais, tem o caminho aberto para crescer. Se a economia cresce, está “superaquecida” - e aumento de juros em cima dela, coisa que o sr. Meirelles fez algumas horas depois, na mesma quarta-feira.

Não havia a inflação, que estava em queda, como pretexto. Logo, o problema era o “excesso” de crescimento, que, claro, iria causar “tensões inflacionárias futuras”. Mas a taxa de investimento está crescendo mais que o consumo. Portanto, não havia ameaça inflacionária futura. Ora, leitor, desde quando uma questiúncula dessas embaraçou o Meirelles?

Com o aumento dos juros básicos em 0,75 pontos percentuais, o Brasil continua com a maior taxa real de juros do mundo (5,2%), e com uma taxa real que é mais que o dobro da segunda colocada (a da China, 2,4%; a terceira é a da Indonésia, 2,2%; e a quarta é a da Rússia, 1,7%). Enquanto isso, a taxa real dos juros básicos nos EUA está em -1,9% (menos 1,9%); na Alemanha em -0,2% (menos 0,2%); na França em -0,7% (menos 0,7%); na Inglaterra em -3,1% (menos 3,1%).

Uma taxa de +5,2% serve para travar o crescimento e para que os especuladores entrem aqui com montanhas de dólares, para aproveitar o diferencial entre as taxas dos seus países e a taxa daqui – em suma, serve para que eles saqueiem os recursos do país e causem a hipervalorização do real, que diminui a competitividade da produção nacional, barateando os produtos importados em relação aos fabricados pela indústria nacional. Assim, o câmbio pseudo-flutuante e os juros são um dumping a favor das importações.

O resultado é que estamos com um déficit em transações correntes (saldo comercial - remessas para o exterior + recursos enviados por brasileiros residentes no exterior) que, somente entre janeiro e abril, chegou a US$ 16,7 bilhões. Nos 12 meses até abril, esse déficit atingiu US$ 36,1 bilhões – 2% do PIB.

Mas, voltemos, por um momento, ao suposto “superaquecimento”.

A “Folha” publicou, logo na primeira página, uma tabela colorida, comparando o 1º trimestre de 2010 com o de 2009. Segundo o jornal do Otavinho, o Brasil teve um crescimento (9%) acima da Índia (8,6%), e quase colado na China (11,9%).

Trata-se de uma tabela perfeitamente idiota, se não fosse manipulação. A Índia e a China cresceram 8,6% e 11,9%, por comparação com um 1º trimestre de 2009 em que, respectivamente, haviam crescido 5,8% e 6,1% (também em relação ao 1º trimestre do ano anterior). Já os 9% do Brasil foram por comparação com um 1º trimestre de 2009 em que o PIB caiu 2,1%. Para superar a China, bastaria comparar o primeiro trimestre com um período anterior de queda ainda mais funda. Assim, poderíamos inaugurar uma fábrica de números e de “superaquecimentos” e nem por isso a realidade mudaria em nada. Seria somente vigarice. Infelizmente, os 9% do Brasil refletem algo diferente dos 8,6% e 11,9% da Índia e da China. Refletem, sobretudo, a queda no 1º trimestre de 2009.

Evidentemente, “superaquecimento” é o mote para enfiar uma camisa de força naquilo de que mais precisamos – o crescimento. Lamentavelmente, somos forçados a reconhecer que o nosso governo caiu nessa cilada. Mas nada que não se possa recuperar, tão logo a realidade seja reconhecida.

Sejamos claros, até óbvios: a “Folha”, o “Estadão” e ”O Globo” preferem Serra porque não querem que o país cresça, que o povo melhore de vida, que o país seja independente e desenvolvido. Já dizia Murtinho, ministro da Fazenda de Campos Sales: essas coisas são apanágios da “raça anglo-saxã”.

Para que não cresçamos, dizem que estamos crescendo demais. Em relação ao 4º trimestre de 2009, o crescimento foi 2,7%. Logo alguns proclamaram que o Brasil está crescendo 11% ao ano. O truque é velho, muito usado pelos norte-americanos, que multiplicam por quatro o resultado de um trimestre, como se naqueles que vêm a seguir, o crescimento fosse o mesmo. Em suma, futurologia de trapaceiro.

Como o presidente já declarou, seu programa não é promover um voo de galinha.

Portanto, essa mediocridade de berrar “superaquecimento!” e “mais juros!” diante até de um moderado crescimento, nada tem a ver com o programa de seu governo. Certamente, existem problemas para o crescimento. Mas há alguns que, ao invés de enfrentá-los, preferem o atoleiro dos problemas da estagnação. No entanto, não há nada para solucionar os problemas do crescimento que já não tenhamos feito em outras épocas, com menos recursos, com uma economia menos poderosa, e com menos experiência. Quais são esses problemas a solucionar para que o crescimento não seja estrangulado?

O primeiro é a política altos juros e contenção do crescimento, instalada no BC. Aliás, a razão pela qual não está sendo muito difícil derrotar Serra é porque pouca gente neste país quer que essa política tome todo o governo. O segundo problema é o problema externo.

No 1º trimestre, as importações aumentaram 13,1% e as exportações aumentaram 1,7%. No trimestre anterior, as importações haviam aumentado 13,3%, enquanto as importações aumentavam 3,3%. Exportamos US$ 54,4 bilhões de janeiro a abril; mas o saldo comercial foi de quase irrisórios (para a magnitude que exportamos) US$ 2,2 bilhões, porque as importações foram de US$ 52,2 bilhões. De um saldo, em 12 meses, nas transações correntes, de US$ 13,6 bilhões (dezembro de 2006), passamos para um déficit de US$ 28,2 bilhões (dezembro de 2008), e, agora, para um déficit de US$ 36,2 bilhões.

Há quem tenha ainda a ilusão de que vamos financiar esses déficits – isto é, cobrir esse rombo - com capital estrangeiro, e a curto prazo os países centrais vão se recuperar e aumentar as compras de mercadorias daqui. Se o atual castelo de cartas europeu não for suficiente para mostrar que isso é quase uma alucinação, existem a fábrica de dólares do banco central dos EUA, a política do governo Obama de aumentar o saldo comercial a fórceps e o ambiente de barata-voa em todos os países centrais.

Como diz um economista: “... O desfecho dessa estória (…) é sempre o mesmo: parada súbita da entrada de capitais (...), o que leva a uma depreciação violenta (...) da taxa nominal de câmbio, o que força a adoção de políticas monetária e fiscal fortemente contracionistas, levando o país a recessão” (José Luiz Oreiro, “É a restrição externa, estúpido”, Valor Econômico, 09/06/2010).

A base da nossa economia somente pode ser o nosso mercado interno – país que depende do mercado de outros, em breve será país falido. Há 15 anos o Japão está aprendendo tal verdade.

O nosso problema, então, está na desnacionalização extensa da economia - com o aumento das remessas para o exterior e das importações - e no câmbio, com o real hipervalorizado devido, sobretudo, aos juros altos. Filiais de multinacionais são, essencialmente, exportadoras de lucros e importadoras de bens intermediários de suas matrizes, para montagem do que, supostamente, fabricam aqui. Ou aumentamos o grau de nacionalização da economia e acabamos com a manipulação do câmbio, ou certamente as contas externas se transformarão num Procusto do crescimento, cortando as pernas ou a cabeça da economia para que caiba em seu exíguo leito.

O que é ainda mais necessário porque o câmbio tange as empresas nacionais a também importarem bens intermediários e insumos para a sua produção, mesmo quando existem (ou existiam) outras empresas nacionais que fabricam esses bens no mercado interno.

Crescer não é uma maldição a ser exorcizada com aumentos de juros. Pelo contrário, é a benção de um país e de um povo que lutam para ser livres.

CARLOS LOPES


Nenhum comentário: