domingo, 1 de fevereiro de 2015

Boko Haram: o braço armado para desestabilizar a Nigéria (IV)


Carlos Bake e Olivier A. Ndenkop*
Michelle Obama e o marketing de drones norte-americanos na Nigéria

Para compreender melhor o envolvimento dos EUA na desestabilização da Nigéria, é necessário levar em conta as últimas ocorrências no país. A mais recente é a inconteste campanha "Traga Nossas Meninas de Volta" iniciada pessoalmente pela primeira-dama dos EUA. Durante os primeiros meses de governo de seu marido, Michelle Obama apareceu como uma pessoa reservada mas, a partir desse momento, se transformou na mascote do complexo industrial-militar norte-americano. Ao iniciar a campanha no facebook chamou a atenção para o destino das 200 garotas raptadas pela seita islâmica.
Mas o que não é dito é que a primeira-dama acaba de encontrar um novo céu para os drones, e um novo terreno de operações para os marines e demais forças especiais dos Estados Unidos. Em nome da busca pelas 200 garotas, o presidente norte-americano decidiu enviar 70 militares ao Chad. A operação "Traga Nossas Meninas de Volta" permite facilitar a ocupação do Oeste da África e estabelecer o eixo Mogadíscio-Ouagadougou, com 12 países sob a influência de Washington. Até hoje 29 países africanos concederam aos EUA o direito de utilizarem os seus aeroportos.
Boko Haram: um jogo mentiroso e 
muito rentável


Boko Haram significa em francês: "a escola ocidental é um pecado". Contudo é surpreendente constatar que o Boko Haram não se choque com os interesses ocidentais, que segundo a definição dos "especialistas" são seus inimigos objetivos. Na Nigéria, as grandes marcas ocidentais saltam à vista, especialmente as companhias de exploração de petróleo, que constituem a principal fonte de divisas do país.


Contrariamente ao Boko Haram, o Movimento para a Sobrevivência do Povo Ogoni e o Movimento para a Emancipação do Delta do Níger se opõe abertamente aos interesses do ocidente. Os dois movimentos atacam diretamente as multinacionais do petróleo e seus negócios na Nigéria. Em 1992, três anos antes de ser enforcado o escritor Saro-Wira (assassinado com oito de seus companheiros do Movimento para a Sobrevivência do Povo Ogoni), em Port Harcourt, a 10 de novembro de 1995 pelo regime Sanni Abacha, ele acusava claramente as companhias petrolíferas dizendo: "A exploração de petróleo transformou o país Ogoni em um imenso terreno onde nada cresce. As terras, os rios e os riachos estão contaminados. O território Ogoni foi devastado por chuvas ácidas e vazamentos de hidrocarbonetos". A petroleira Shell, perseguida pelos familiares das vítimas por ser cúmplice do assassinato de Saro-Wiwa e seus amigos, aceitou pagar indenização de US$ 15,5 milhões em junho de 2009.
O Resgate da Má Gestão
Se o Boko Haram recruta com tamanha facilidade na Nigéria, também é porque a presidência do país perpetrava uma distribuição injusta dos benefícios do petróleo. Uma boa mostra disso é a diferença entre a taxa de escolaridade abismal entre o Norte e o Sul. O mesmo ocorre com a saúde. A cada 100 mil mulheres gravidas na Nigéria, 1,8 mil morrem no Norte, contra apenas 80 no Sul. Frente à miséria imposta pelos políticos corrompidos pelas multinacionais, a população das zonas abandonadas se torna facilmente manipulável.
Depois da Nigéria, Camarões?
Camarões é o alvo ideal para as potências imperialistas ocidentais. Porque o Camarões de Paul Biya? Como presidente centro-africano François Bozize, derrotado por uma coalizão rebelde em março de 2013, Paul Biya teve a má sorte de diversificar os sócios econômicos de Camarões. Assim, esse país considerado há um século como uma fortaleza impenetrável da França, teve suas portas abertas amplamente à China. Ganhando progressivamente todos os grandes projetos: construção das represas Mekin e M’mvelle, a construção da autovia Duala-Yaundé, do complexo industrial-portuário de Kribi, etc.


Camarões também é considerado como o enclave do Golfo da Guiné, assim como o gatilho para toda a África. Também se chama "África em miniatura". Desestabilizar esse país é a garantia para desestabilizar o restante de todo o Golfo da Guiné. Já fazem mais de dois anos desde que as incursões da seita islâmica destróem quase todas as transações comerciais de gado no Norte de Camarões, enquanto que a miséria social é precisamente a razão essencial pela qual os jihadistas recrutam com tanta facilidade. A estratégia do caos está posta em marcha. Até agora os únicos reféns raptados que foram atribuídos ou reivindicados pela seita nigeriana são de... Camarões.
Um novo mapa na África está se desenvolvendo. As fronteiras herdadas pela colonização já não satisfazem aos interesses de quem as estabeleceu naquela época. Algumas informações sérias precedem a constituição de um novo estado reagrupando o Norte da Nigéria, de Camarões, da República Centro-Africana e do Sul de Chade, e que constituirão um emirado islâmico como o que se está organizando no Iraque.
Finalmente a guerra contra Muammar Kadafi na Líbia não teve nada de distinto da que afundou Mali. A diferença entre a derrota de Laurent Gbagbo, na Costa do Marfim, e de François Bozize na República Centro-Africana é a identidade dos presidentes derrotados. Na Nigéria, as ações do Boko Haram satisfazem os mesmos interesses que os da Seleka. E nestes tempos de depressão econômica no ocidente, os países da OTAN, dirigidos pela nova parceria antropofágica, EUA-França, querem conter a penetração da China e recuperar os enormes recursos naturais disponíveis nesta parte do mundo.
É provável que a guerra seja larga e ampla. Como também é a campanha de dissimulação das verdadeiras causas. E a grande força do imperialismo reside no feito de que é esperto no jogo de responsabilizar os demais; o que favorece a compreensão das profundas causas e dos objetivos finais dos conflitos contemporâneos. A este ponto da questão só resta aos africanos duas opções: lutar por sua libertação completa e definitiva, e trabalhar para ser a primeira potência emergente do século XXI; ou aceitar de bom grado uma nova colonização.

*A íntegra da matéria foi publicada no portal Investig’Action sob o título Boko Haram: o braço armado para desestabilizar a Nigéria e expulsar a China do Golfo da Guiné.
http://www.horadopovo.com.br/

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