sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Sete punhais cravados no coração da América -1

FIDEL CASTRO


Leio e releio dados e artigos elaborados por personalidades inteligentes, conhecidas ou pouco conhecidas, que escrevem em diversos meios e tomam a informação de fontes não questionadas por ninguém.
Os povos que habitam o planeta, em todos os lugares, correm riscos econômicos, ambientais e bélicos, derivados da política dos Estados Unidos, mas em nenhuma outra região da terra são ameaçados por tão graves problemas como seus vizinhos, os povos que moram neste continente ao Sul desse país hegemônico.
A presença de tão poderoso império, que em todos os continentes e oceanos dispõe de bases militares, porta-aviões e submarinos nucleares, navios de guerra modernos e aviões de combate sofisticados, portadores de todo tipo de armas, centenas de milhares de soldados, cujo governo reclama para eles impunidade absoluta, constitui a mais importante dor de cabeça de qualquer governo, seja de esquerda, centro ou direita, aliado ou não dos Estados Unidos.
O problema, para os que somos vizinhos dele, não é que ali se fale outro idioma e seja uma nação diferente. Há norte-americanos de todas as cores e todas as origens. São pessoas iguais a nós e capazes de qualquer sentimento num sentido ou outro. O dramático é o sistema que ali se desenvolveu e impôs a todos. Tal sistema não é novo quanto ao uso da força e os métodos de domínio que têm prevalecido ao longo da história. O novo é a época que vivemos. Abordar a questão destes pontos de vista tradicionais é um erro e não ajuda ninguém. Ler e conhecer o que pensam os defensores do sistema ilustra muito, porque significa estarmos conscientes da natureza de um sistema que se apóia no apelo constante ao egoísmo e aos instintos mais primários das pessoas.
Se não existisse a convicção do valor da consciência, e sua capacidade de prevalecer sobre os instintos, não se poderia expressar sequer a esperança de mudança em qualquer período da brevíssima história do homem. Tampouco poderia se compreender os terríveis obstáculos que se levantam para os diferentes líderes políticos nas nações latino-americanas ou ibero-americanas do hemisfério. Em última instância, os povos que viviam nesta área do planeta desde há dezenas de milhares de anos, até a famosa descoberta da América, não tinham nada de latinos, de ibéricos ou de europeus; seus traços eram mais parecidos aos asiáticos, donde procederam seus antepassados. Hoje os vemos nos rostos dos índios do México, América Central, Venezuela, Colômbia, Equador, Brasil, Peru, Bolívia, Paraguai e Chile, um país onde os araucanos escreveram páginas inesquecíveis. Em determinadas zonas do Canadá e no Alaska conservam suas raízes indígenas com toda a pureza possível. Mas no território principal dos Estados Unidos, grande parte dos antigos habitantes foi exterminada pelos conquistadores brancos.
Como todo mundo sabe, milhões de africanos foram arrancados de suas terras para trabalhar como escravos neste hemisfério. Em algumas nações como Haiti e grande parte das ilhas do Caribe, seus descendentes constituem a maioria da população. Em outros países formam amplos setores. Nos Estados Unidos os descendentes de africanos constituem dezenas de milhões de cidadãos que, como norma, são os mais pobres e discriminados.
Ao longo de séculos essa nação reclamou direitos privilegiados sobre nosso continente. Nos anos de Martí tentou impor uma moeda única baseada no ouro, um metal cujo valor tem sido o mais constante ao longo da história. O comércio internacional, em geral, se baseava nele. Hoje nem sequer isso. Desde os anos de Nixon, o comércio mundial se fez com o bilhete de papel impresso pelos Estados Unidos: o dólar, uma divisa que hoje vale cerca de 27 vezes menos que no início da década de 70, é uma das tantas formas de dominar e calotear o resto do mundo. Hoje, porém, outras divisas estão substituindo o dólar no comércio internacional e nas reservas de moedas conversíveis.
Se por um lado as divisas do império se desvalorizam, por outro suas reservas de forças militares crescem. A ciência e a tecnologia mais moderna, monopolizadas pela superpotência, têm sido derivadas em grau considerável para o desenvolvimento das armas. Atualmente não se fala só de milhares de projéteis nucleares, ou do poder destrutivo moderno das armas convencionais; se fala de aviões sem pilotos, tripulados por autômatos. Não se trata de simples fantasia. Já estão sendo usadas algumas naves aéreas desse tipo no Afeganistão e outros pontos. Informes recentes assinalam que num futuro relativamente próximo, em 2020, muito antes que a calota da Antártida se derreta, o império, entre seus 2.500 aviões de guerra, projeta dispor de 1.100 aviões de combate F-35 e F-22, em suas versões de caça e bombardeiros da quinta geração. Para se ter uma idéia desse potencial, baste dizer que os que dispõem na base de Soto Cano, em Honduras, para o treinamento de pilotos desse país, são F-5; os que forneceram às forças aéreas da Venezuela antes de Chávez, ao Chile e outros países, eram pequenas esquadrilhas de F-16.
Mais importante ainda, o império projeta que no transcurso de 30 anos todos os aviões de combate dos Estados Unidos, desde os caças até os bombardeiros pesados e os aviões cisterna, serão tripulados por robôs.
Esse poderio militar não é uma necessidade do mundo, é uma necessidade do sistema econômico que o império impõe ao mundo.
Qualquer um pode compreender que se os autômatos podem substituir os pilotos de combate, também podem substituir os operários em muitas fábricas. Os acordos de livre comércio que o império trata de impor aos países deste hemisfério implicam em que seus trabalhadores terão que concorrer com a tecnologia avançada e os robôs da indústria ianque.
Os robôs não fazem greves, são obedientes e disciplinados. Vimos pela televisão máquinas que recolhem as maçãs e outras frutas. A pergunta cabe ser feita também aos trabalhadores norte-americanos. Onde estarão os postos de trabalho? Qual é o futuro que o capitalismo sem fronteiras, em sua fase avançada do desenvolvimento, atribui aos cidadãos?
Havana, 5/8/2009

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