terça-feira, 10 de fevereiro de 2009


Cesare Battisti: por que tanta polêmica?
A polêmica em torno da decisão do governo brasileiro de conceder asilo político a Cesare Battisti – ex-membro de uma organização de esquerda nos chamados ‘anos de chumbo’ na Itália – só pode ser entendida se a considerarmos como absolutamente política e não técnica.
O presidente Lula que não goza nem um pouquinho da simpatia da mídia monopolista brasileira, colocou os pingos nos is, fechando as portas para as tentativas do governo italiano de continuar interferindo em assuntos internos do Brasil. Mesmo assim, a polêmica continua.
Nossa “decisão está amparada na Constituição brasileira (Artigo 4º, X), na Convenção de 1951 das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados e na legislação infraconstitucional (Lei 9474/97).
A concessão do refúgio e as considerações que a acompanharam restringem-se a processo concreto, tendo sido proferida com fundamento nos elementos e documentos constantes num procedimento específico”, disse Lula. Ou seja, trata-se de uma questão de soberania nacional e ponto final.
O ministro Tarso Genro, antes de sua decisão de conceder o asilo político a Battisti, recebeu um abaixo-assinado com cerca de 400 assinaturas de escritores, professores, representantes de inúmeras ONG’s e personalidades ilustres – dentre as quais Oscar Niemeyer – no qual afirmam: “O revanchismo punitivo com relação à década revolucionária de 1970, na Itália, não é democrático e é um retrocesso político”.
DELAÇÃO
Outra questão! Os críticos do governo Lula fazem questão de ‘esquecer’ um detalhe importante relacionado com o instrumento da ‘delação premiada’. Uma pessoa que aceita transformar-se em dedo-duro para se livrar de uma pena é um caso complexo. Regra geral, o delator, com a auto-estima praticamente anulada e com o moral arrasado depois de anos de prisão, é capaz de imputar ao ‘companheiro’ – como fez Pietro Mutti contra Battisti – crimes do arco-da-velha que o mesmo nunca cometera.
O Prof. Dalmo Dallari que estudou minuciosamente o caso, comenta, por exemplo, que “dois desses crimes foram cometidos no mesmo dia, em horários muito próximos e em lugares muito distantes um do outro”. Então, teria ele realmente participado dos crimes?
O que me intriga em toda essa história não é o fato de que a direita – italiana e brasileira – esteja ouriçada. Isto é normal porque é a forma que ela tem de se colocar na ofensiva (na Itália, a ultra-direita berlusconiana, no poder, ‘queimada’ por ter dado apoio à política terrorista-de-estado de Bush; e no Brasil, a elite branca, secundada pelos partidos de direita como o PSDB e o ex-PFL, como forma de desgastar o governo nacional, democrático e popular do presidente Lula).
O problema são os dois pesos e as duas medidas de sempre que alguns intelectuais e cientistas políticos utilizam para sustentar suas posições de apoio à interferência do governo italiano em assuntos de nossa soberania nacional. Senão, vejamos.
Emir Sader lembra uma questão importante: “Os três maiores terroristas de direita italianos estão no exterior, com refúgio. (...) Delfo Zorzi, que responde a processo por atentado que causou oito mortes, está no Japão e recebeu cidadania japonesa. O governo italiano pediu extradição e não deram.
O governo ficou quietinho, não fez nenhum escândalo. Por quê? Porque eles diferenciam os terroristas. Querem criminalizar os de esquerda e absolver os de direita”.
Historiadores e cientistas políticos brasileiros que gostam de fazer média com a mídia, racionalizam quando questionados sobre o fato de, à época de FHC, o ditador paraguaio Alfredo Stroessner, que assassinou e desapareceu com um número considerável de ativistas políticos de esquerda, conseguiu asilo político no Brasil e ninguém criticou o ex-presidente tucano. “Ah – dizem –, o ditador paraguaio não foi julgado no seu país, etc”. Pergunto: e precisava?
A própria França deu abrigo a Battisti por mais de 10 anos à época de François Mitterrand. A Itália não fez nenhum estardalhaço como está fazendo agora contra o Brasil com a ajuda, inclusive, de muitos intelectuais ‘de esquerda’. Ou seja, a Itália encolhe-se diante de países ‘poderosos’ – como a França e o Japão – e quer cantar de galo frente a um do Terceiro Mundo.
Emir Sader diz ainda: “Não está em questão o fato de ele [Battisti] ser ou não inocente. É o direito de asilo”.
EMERSON LEAL Doutor em Física Atômica e Molecular e vice-prefeito de São Carlos
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