quarta-feira, 19 de junho de 2013

Explode indignação popular contra tarifas do transporte

Rentistas vaiam Dilma no estádio para lhe extorquir mais uns jurinhos   
Sujeitos que pagaram até R$ 1.300 para assistir ao jogo do Brasil com o Japão no estádio que leva o nome do glorioso Mané Garrincha, não vaiaram a presidente Dilma porque a passagem de ônibus é cara ou porque gastam muito com o transporte coletivo.


Atos de SP, RJ e outros foram grandes. Mídia, após atacá-los,
recuou e agora quer dizer o que manifestantes devem reivindicar
Na terça-feira pela manhã, quando encerramos esta edição, a mídia, que começou a semana anterior tentando mandar para o pelourinho os que se manifestavam contra o preço das passagens de ônibus, agora insistia na tentativa de desvirtuar o movimento, supostamente adulá-lo e dirigi-lo para seus mesquinhos objetivos golpistas. Mas não estava dando certo – e, certamente, não dará certo. Apenas resta anotar que a berraria anti-partido – como se os partidos não tivessem, legitimamente, direito a participar no movimento – era claramente puxada pelos ínclitos cavalheiros e damas de "O Globo" & assemelhados. Certamente, eles querem ser o partido dominante sobre o povo; a presença dos partidos verdadeiros sempre é um obstáculo para o fascismo.
O outro fato notável, depois que 130 mil pessoas, na segunda-feira, ocuparam as ruas de São Paulo (v. matéria na página quatro), 100 mil percorreram o Rio e outras milhares atravessaram 11 capitais do país, é que governadores de vários Estados e prefeitos das capitais começavam a anunciar reduções no preço das passagens ou suspensões dos aumentos: em Recife, o governador Eduardo Campos anunciou redução (por exemplo, o percurso denominado "anel A", cuja passagem era de R$ 2,25, passou a ter o preço de R$ 2,15); em João Pessoa, o prefeito Luciano Cartaxo (PT) reduziu as tarifas na capital paraibana de R$ 2,30 para R$ 2,20.
Porém, mais notável ainda é que o preço das passagens ainda não tinha sido revisto em São Paulo, onde o preço de R$ 3,20 não é apenas o maior do país, como é, evidentemente, uma aberração, considerando o nível salarial e, sobretudo, a modalidade de lixo que se oferece como serviço.
No entanto, até a Associação Nacional dos Transportes Públicos (ANTP), que reúne a maioria das empresas do ramo, admitiu na segunda-feira que desde 2005 os aumentos nas passagens ultrapassaram a inflação em, pelo menos, 14 pontos percentuais (+64% contra +50% do IPCA) – mas isso em relação ao conjunto do país (mais especificamente, "a 75% das cidades com mais de um milhão de habitantes"); o caso de São Paulo, que é pior, encontra-se detalhado na página 4 desta edição.
PREÇO
É bastante possível que a admissão da ANTP de que, considerados em conjunto, os aumentos na maior parte das grandes cidades foram acima da inflação no período 2005-2012, seja uma subestimação. Porém, mesmo que não fosse (ou não seja), basta essa admissão para se ter um instantâneo da situação, pois é evidente que o normal, considerando o aumento do número de usuários, seria a queda no preço (a ideia de que os aumentos, independente do custo do serviço, deveriam ser iguais à inflação é, por si só, absurda, pois significaria que preço algum jamais cairia, mas a margem de lucro das empresas de ônibus sempre subiria ou tenderia a subir).
Para dar um exemplo: no último dia 13, na mesma direção de uma liminar obtida na Justiça que suspendeu os aumentos de passagem em Porto Alegre, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Rio Grande do Sul constatou uma virtual fraude no cálculo desse aumento – em resumo, disse o TCE, o aumento (de R$ 2,85 para R$ 3,05) não considerava "os efeitos da desoneração da folha de pagamento das empresas de transportes, concedida por lei federal ainda em 2012, e da isenção de PIS e Cofins (que somam 3,65%) sobre o faturamento do setor, garantida pela Medida Provisória 617" da presidente Dilma. Além disso, "a planilha apresentada contém erros na apuração dos custos de rodagem dos ônibus, incluindo aí itens como combustíveis e manutenção". Apesar desses problemas – para usar uma palavra educada - o aumento fora homologado pela Prefeitura da capital gaúcha no dia 21 de março. No entanto, foi barrado na Justiça – e agora no TCE.
As manifestações espalharam-se pelo país. Nem todas são a mesma coisa, ou representam a mesma coisa, ou têm o mesmo objetivo.
Evidentemente, aqueles sujeitos que pagaram até R$ 1.300 para assistir ao jogo do Brasil com o Japão no estádio que leva o nome do glorioso Mané Garrincha, não vaiaram a presidente Dilma porque a passagem de ônibus é cara ou porque gastam muito com o transporte coletivo. Convenhamos que de coletivo ali não há nem cacoete – muito menos eles pisaram, há algumas décadas, se é que alguma vez pisaram, num ônibus ou num metrô (exceto se for em Paris, onde esse pessoal acha bonito tirar fotografia em lugares como a Gare d’Austerlitz).
Esses são os parasitas que, infelizmente, a política do sr. Mantega continuou cevando – gente ingrata, muito ingrata, cuja principal queixa do governo é a redução dos juros, que fez com que mamassem um pouco menos na "renda fixa", isto é, nos títulos do governo. Mas o senhor Tombini já está providenciando (v. matéria na página 2) para satisfazer esses heróis do progresso – e nem por isso eles vão deixar de vaiar a presidente Dilma, pelo contrário.
COPA
Apareceram também algumas manifestações (Belo Horizonte, Brasília, mas não apenas) supostamente contra os "gastos com a Copa". Não é à toa que a Miriam Leitão adorou. A direita sempre foi contra gastar dinheiro com a Copa, com os Jogos Olímpicos, etc., etc., e tal.
Entretanto, se há algo que o presidente Lula fez de certo (e não foi só isso, mas aqui está o seu descortino de estadista...) está em trazer para o Brasil a Copa e as Olimpíadas. Imagine o leitor se não fossem os gastos públicos para a Copa e para as Olimpíadas – o país estaria muito mais paralisado do que está, o sr. Mantega teria levado mais dinheiro para o superávit primário, isto é, para os bancos sob forma de juros, os salários já teriam virado o cabo das Tormentas (para baixo) e os empresários nacionais estariam em estiagem de recursos e de encomendas ainda pior que a desses últimos dois anos.
Portanto, protestar contra gastos e eventos que permitiram ao país ficar com o nariz acima d’água é besteira – e, também, é servir de marionete para o que há de mais reacionário no país, para os tucano-americanos, adeptos do deserto absoluto para que meia dúzia encha as burras com juros, com o dinheiro do Tesouro, com os recursos e a propriedade do povo.
No entanto, as manifestações contra o preço das passagens se tornaram as mais numerosas e maiores desde o impeachment de 1992. Há, em torno delas, um clima peculiar, sucintamente: um mal estar singular no país. Bem ou mal, consciente ou inconscientemente, clara ou confusamente, as pessoas que viram, no governo Lula, o país sair do pântano para o qual Fernando Henrique Cardoso e os tucanos haviam-no arrastado, percebem agora – para ser sintético - que o país parou ou deixou de andar para a frente, como andava para a frente no governo anterior.
Eis uma diferença que não é apenas psicológica – mas também econômica e política. Aqueles que tanto falam nas "expectativas", deveriam atentar para o efeito causado pela derrubada do crescimento logo em seguida a um período de grandes esperanças quanto a este crescimento.
Não há marketing que possa alterar o que as pessoas estão sentindo. Sobretudo quando a solução do governo é voltar ao tucanismo, com seus leilões do petróleo, ou de rodovias, ou de ferrovias, ou de portos – ou de qualquer propriedade pública e nacional, como se estivéssemos hipotecando o futuro na bacia das almas. Aí, só se pode esperar que qualquer combate se transforme numa luta pública e nacional.
CARLOS LOPES

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