sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Mantega dá carta branca à GM para demitir à vontade

Deletou cobrança de Dilma sobre empregos

Multinacional embolsou incentivos e pôs na rua 1.189 trabalhadores no espaço de doze meses

O ministro Mantega declarou que a GM “cumpre o compromisso de não demissão e geração de empregos”, em troca das desonerações e dinheiro do BNDES, que fizeram as remessas da filial no Brasil triplicar sua participação no faturamento da matriz nos EUA. Quanto às 2 mil demissões na GM, depois de 1.189 demissões desde julho do ano passado, o ministro declarou que “não cabe ao governo entrar neste tipo de detalhe”, pois “é uma questão de administração interna”.


Mantega: demissões da GM não são problema do governo

“Nós só damos incentivos para garantir o emprego, não é por outra coisa”, havia declarado a presidente Dilma


Segundo o ministro Mantega, a General Motors é uma extraordinária maravilha da ética empresarial (só falta ele descobrir, nesse gênero, a indústria bélica norte-americana).

A GM, disse Mantega, é uma empresa que “cumpre o compromisso de não demissão e geração de empregos”. E, enlevado pela reconhecida maviosidade da própria voz: “No conjunto das fábricas [da GM] no país, há um aumento de empregos”. Como é que ele soube disso? Ora, simples, leitor: “verificamos os números da GM e estamos vendo que ela está com um saldo positivo de empregos”.

O homem sabe ler números! Mas... que números? Bem, os números que a GM lhe deu para ler, é claro. Literalmente: “a GM mostrou os dados e no conjunto das fábricas há aumento de empregos. Há problemas localizados na fábrica em São José dos Campos e não cabe ao governo entrar neste tipo de detalhe, é uma questão de administração interna”.

O “detalhe” a que Mantega está se referindo é a demissão de dois mil trabalhadores – pais, mães e arrimos de família - por uma multinacional que sobrevive como vampiro do Estado, grudada na carótida dos cofres públicos: dinheiro do BNDES, desonerações e outras inúmeras benesses públicas (p. ex., cf. “A GM no Rio Grande do Sul: notas sobre um negócio nada exemplar”, HP 27/04/2011).

Mantega sabe perfeitamente que está mentindo. Se não quisesse mentir, bastaria não confiar – ou não fingir que confia – nos números que a GM lhe forneceu.

No entanto, ele prefere ser um papagaio da GM.

Desde julho do ano passado, a GM, com todo o dinheiro do BNDES e todas as “desonerações” que o governo lhe concedeu, demitiu, já descontadas as admissões do mesmo período, 1.189 trabalhadores – nas unidades de São José dos Campos, 1.044 trabalhadores, nas de São Caetano, 349 trabalhadores, e somente nas unidades de Gravataí (RS) é que houve algum saldo positivo nos empregos, ainda que ínfimo: 204 admissões. Todos esses números estão em levantamento do Dieese – e não incluem os 356 trabalhadores demitidos recentemente através de um terrorista “plano de demissão voluntária”. Agora, a a GM anunciou a demissão de mais 2 mil trabalhadores em São José dos Campos.

Esse é o “detalhe que não cabe ao governo entrar”. Dinheiro público - dinheiro dos impostos, portanto, dinheiro do povo – para a GM é missão de governo; agora, impedir que a GM demita o povo que paga esse dinheiro, que é dono desse dinheiro, jamais, pois demitir é uma questão interna da GM. Deve ser por isso que a ministra Ideli declarou que o governo não aumenta o salário dos funcionários públicos para garantir o emprego dos que trabalham em empresas privadas... Vê-se.

Não há como deixar de concordar com o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, Antônio Ferreira de Barros, sobre a declaração de Mantega: “infeliz, irresponsável e mentirosa”. Além de bajulação indecente a um carcomido monopólio, como disse um especialista em GM, Michael Moore, de ineficiência estúpida exceto para “demitir milhares de empregados”.

Por fim, é um desrespeito à presidente Dilma, que, apenas 24 h antes, declarara: “nós só damos incentivos para garantir o emprego, não é por outra coisa”.

O presidente do Sindicato relatou que os trabalhadores propuseram à GM, para manter e aumentar os empregos, que passasse a montar aqui o Sonic, em vez de importá-lo. A proposta foi recusada. A GM deixou de montar o Corsa, o Meriva e o Zafira. Em São José dos Campos, a GM pretende montar um único modelo, o Classic. E haja desonerações, dinheiro do BNDES e desemprego para esse formidável resultado.

A GM é a terceira maior montadora no país e a 14ª maior empresa em vendas, com um faturamento líquido no Brasil de US$ 8,819 bilhões (8 bilhões e 819 milhões de dólares). A participação da filial instalada aqui no faturamento mundial da GM triplicou desde o início da crise dos países imperialistas – devido às remessas de lucros do Brasil para os EUA, turbinada até o desespero.

Aliás, temos aqui uma desgraça que o sr. Mantega tem o cinismo de apresentar como contribuição ao crescimento – e não é à toa que o crescimento não aparece. Diz ele que “o setor” pretende investir de 2012 até 2015, R$ 22 bilhões. Deve ser com dinheiro do BNDES, pois, diz Mantega: “Isso só vai ocorrer se o mercado de veículos estiver crescendo, se houver vendas de veículos, se houver exportações, se tivermos condições de competitividade. Para dar essa competitividade, para dar esse impulso ao mercado que tinha se contraído por causa da indústria internacional, tomamos estas medidas”.

O mercado “tinha se contraído por causa da indústria internacional”? Caramba! O sujeito não é economista, é mágico. O fato dos preços de monopólio dos carros estarem acima da capacidade do mercado de absorvê-los, virou “contração por causa da indústria internacional”. A solução para o problema, de acordo com a lei da oferta e da procura, evidentemente, era as empresas baixarem os preços dos carros. Porém, montadoras são filiais de monopólios estrangeiros. Assim, foram fazer lobby no Ministério da Fazenda, que tomou medidas para que elas possam aumentar ainda mais a sua margem de lucro, e, ao mesmo tempo, baixar ligeiramente os preços. Tudo, às custas do Estado – ou seja, da sociedade.

Desde 2008, o governo concedeu R$ 26 bilhões em “desonerações” (ou seja, renúncia de impostos) às montadoras automotivas multinacionais. No mesmo período, essas filiais de multinacionais enviaram US$ 14,6 bilhões em lucros para suas matrizes – o que, convertido em reais, significa que elas enviaram para fora uma quantia aproximadamente equivalente às desonerações que receberam do governo (cf. “Indústria automobilística teve isenção de R$ 1 milhão por emprego criado”, OESP, 02/07/2012; e Leonardo Sakamoto, “E se os lucros das montadoras ficassem no Brasil?”, 03/07/2012).

Para isso, serviram as desonerações – para serem transformadas em remessas de lucros ao exterior. E nem falamos do dinheiro do BNDES.

No mesmo período, as importações de carros e autopeças aumentaram +175,41% e a de autopeças, isoladamente, +126,22% (cf. SINDIPEÇAS e ABIPEÇAS, “Relatório da Balança Comercial de Autopeças”, ed. nº 6, janeiro/2012 e ed. nº 10, maio/2012; IEDI, “Veículos e Autopeças: O Dinamismo do Mercado Interno e as Importações”, agosto/2011).

Como demonstra o Sindipeças/Abipeças, 80% das importações de autopeças são realizadas pelas montadoras multinacionais.

Em suma, as montadoras embolsaram o dinheiro público e passaram a importar mais, tanto peças quanto carros. Em linguagem de gente: estamos, com “desonerações” e dinheiro do BNDES, pagando para ser roubados – e ainda ficarmos desempregados.

Com o beneplácito do ministro da Fazenda.
CARLOS LOPES

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