quinta-feira, 30 de agosto de 2012

A América ladeira abaixo rumo à pobreza


PAUL CRAIG ROBERTS*

Os Estados Unidos entraram em colapso economicamente, socialmente, politicamente, legalmente, constitucionalmente, ambientalmente e moralmente. O país de hoje não é nem mesmo uma sombra do país em que nasci. Neste artigo tratarei do colapso econômico da América. Em artigos seguintes tratarei de outros aspectos do colapso americano.
Economicamente, a América desceu a ladeira rumo à pobreza. Como diz Peter Edelman , "os baixos salários já são uma pandemia".

Na atual América da "liberdade e democracia", "a única superpotência do mundo", um quarto da força de trabalho tem empregos que pagam menos de US$ 22.000 [por ano], a linha de pobreza para uma família de quatro pessoas. Algumas destas pessoas mal remuneradas são jovens licenciados em faculdades, sobrecarregados com empréstimos para a educação, que partilham o mesmo teto com três ou quatro outros na mesma situação desesperada. Outras delas são pais solteiros com problemas médicos ou desempregadas.

Outros podem ter PhD e ensinarem em universidades como professores adjuntos por US$ 10.000 anuais ou menos. A educação ainda é apregoada como o caminho para sair da pobreza, mas torna-se cada vez mais um caminho para a entrada na pobreza ou para o alistamento nos serviços militares.

Edelman, que estuda estas questões, informa que 20,5 milhões de americanos têm rendimentos inferiores a US$ 9.500 por ano, o que equivale a metade da definição de pobreza para uma família de três pessoas.

Há seis milhões de estadunidenses cujo único rendimento é o do auxílio-alimentação (food stamps). Isso significa que há seis milhões de americanos que vivem nas ruas ou em casas de parentes ou amigos. Republicanos cruéis continuam a combater o estado de bem-estar (welfare), mas Edelman afirma que "basicamente o estado de bem-estar já se foi".

Na minha opinião, como economista, a linha oficial de pobreza está desde há muito ultrapassada. A perspectiva de três pessoas a viverem com US$ 19.000 por ano é descabelada. Considerando os gastos com a casa, eletricidade, água, pão e refeições, uma pessoa não pode viver nos EUA com US$ 6.333,33 por ano. Na Tailândia, talvez, até o dólar entrar em colapso, isso possa acontecer, mas não nos EUA.
Como Dan Ariely (Duke University) e Mike Norton (Harvard University) mostraram empiricamente, 40% da população, os 40% menos ricos, possuem 0,3%, isto é, três décimos de um por cento, da riqueza pessoal da América. Quem possui os outros 99,7%?

Os 20% do topo têm 84% da riqueza do país. Aqueles americanos nas classes C e D – essencialmente a classe média da América – têm apenas 15,7% da riqueza da nação. Uma distribuição tão desigual do rendimento é sem precedentes no mundo economicamente desenvolvido.

No meu tempo, confrontado com tamanha disparidade na distribuição do rendimento e da riqueza, uma disparidade que obviamente coloca um problema dramático para a política econômica, a estabilidade política e a macrogestão da economia, os democratas teriam exigido correções e os republicanos teriam concordado com relutância.

TUDO POR DINHEIRO


Mas não hoje. Ambos os partidos prostituíram-se por dinheiro.
Os republicanos acreditam que o sofrimento dos americanos pobres não está ajudando os ricos suficientemente. Paul Ryan e Mitt Romney comprometeram-se a abolir todo programa que trate de necessidades que os republicanos ridicularizam como "consumidores inúteis" ("useless eaters").

Os "consumidores inúteis" são os trabalhadores pobres e a antiga classe média cujos empregos foram deslocados para outros países de modo a que executivos corporativos pudessem receber muitos milhões de dólares de pagamento em compensação pelo desempenho e os seus acionistas pudessem embolsar milhões de dólares com os ganhos de capital. Enquanto um punhado de executivos desfruta iates e garotas Playboy, dezenas de milhões de americanos mal conseguem sobreviver.

Na propaganda política, os "consumidores inúteis" não são somente um fardo para a sociedade e os ricos. Eles são sanguessugas que forçam contribuintes honestos a pagar pelas muitas horas de lazer confortável em que desfrutam a vida, assistindo eventos desportivos e pescando trutas, enquanto o trabalhador tem de vender seu corpo no MacDonalds mais próximo.

A concentração de riqueza e poder nos EUA de hoje vai muito além de qualquer coisa que os meus professores de ciência econômica pudessem imaginar na década de 60. Em quatro das melhores universidades do mundo que frequentei, a opinião [predominante] era que a competição no mercado livre impediria grandes disparidades na distribuição do rendimento e da riqueza. Como vim a aprender, esta crença era baseada numa ideologia – não na realidade.

O Congresso, ao atuar com base nesta crença errônea da perfeição do mercado livre, desregulamentou a economia dos EUA a fim de criar um mercado livre. A consequência imediata foi o recurso a toda ação que anteriormente era ilegal para monopolizar, cometer fraudes financeiras e outras, destruir a base produtiva dos rendimentos do consumidor americano e redirecionar rendimento e riqueza para os um por cento.

O "democrático" governo Clinton, tal como os de Bush e Obama, foi subornado pela ideologia do mercado livre. O governo Clinton, vendido ao grande capital, aboliu o Bolsa Família. Mas este descarte de americanos batalhadores não foi suficiente para satisfazer o Partido Republicano. Mitt Romney e Paul Ryan querem cortar ou abolir todo programa que amenize a situação de americanos atingidos pela crise e que os impeça de caírem na fome e ficarem sem casa.

Republicanos afirmam que a única razão para a existência de americanos carentes é o governo utilizar dinheiro dos contribuintes para subsidiar os que não querem trabalhar. Da forma como os republicanos veem, enquanto nós trabalhadores esforçados sacrificamos nosso lazer e o tempo com as nossas famílias, a ralé do estado de bem-estar desfruta o lazer que os nossos impostos lhes proporcionam.

CRENÇA MÍOPE


Esta crença míope, de presidentes de corporações que maximizam seus rendimentos deslocando empregos de milhões de trabalhadores americanos para outros países, deixou cidadãos na pobreza e cidades, municípios, estados e o governo federal sem uma base fiscal, o que resulta em bancarrotas o nível estadual e local, bem como déficits orçamentais maciços a nível federal que ameaçam o valor do dólar e o seu papel como reserva de divisa.

A destruição econômica da América beneficiou os mega-ricos com muitos milhares de milhões de dólares com os quais desfrutam a vida e o seu séquito de acompanhantes caros sempre que queiram. Enquanto isso, longe da Riviera francesa, o Ministério do Interior (Homeland Security) está acumulando munição suficiente para manter americanos pauperizados sob controle.

[*] Ex-secretário do Tesouro dos EUA e antigo editor associado do Wall Street Journal.

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