sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

O nacionalismo entreguista do sr. Haroldo Lima



O diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Haroldo Lima, dirigiu - supostamente aos funcionários que chefia – uma carta em que diz sobre a recém acontecida refrega que foi a 10ª Rodada de leilões de áreas petrolíferas: “Os riscos à soberania brasileira que alguns advertiam revelaram-se inexistentes, na verdade nunca existiram, em um processo dirigido por um governo sintonizado com o ideal de um Brasil soberano”.
Lima sabe perfeitamente que não há ninguém discutindo que o atual governo é não apenas “sintonizado com o ideal de um Brasil soberano”, como tem, concretamente, defendido a nossa soberania. Quem não está sintonizado com o “ideal” nem com a soberania é ele, Haroldo Lima. O governo, pelo contrário, colocou-o na ANP para zelar pelas nossas reservas petrolíferas, e não para entregá-las ou impedir que a Petrobrás arremate blocos em leilão, como ele tentou fazer na oitava rodada, e só não o fez em virtude da mobilização contra essa aventura - e de uma sentença da Justiça.
O sr. Haroldo Lima sabe bem que está sofismando. Por isso, depois do trecho que citamos, achou necessário acrescentar que a ANP é “dirigida, entre outros, por eu próprio, nacionalista militante de várias décadas”.
O problema desse velho truque – acrescentar outro sofisma para ofuscar o primeiro – é que ele é uma confissão de que o autor sabe que está trapaceando. Ninguém está discutindo o passado do sr. Haroldo Lima, as “várias décadas” em que foi “nacionalista militante”. Nunca pomos em dúvida o seu passado. Porém, o que se está discutindo é o seu presente. E este, convenhamos, tem pouco a ver com qualquer “nacionalismo”. Vejamos o trecho da carta de Lima que se segue ao que acabamos de mencionar:
“Das multinacionais que ganhariam de ‘mão beijada’ os blocos em oferta, só uma de fato apareceu e ganhou cinco blocos no São Francisco. E se tivessem aparecido em maior quantidade e arrematado mais blocos, nem por isso a soberania brasileira estaria ameaçada”.
Eis um exótico nacionalista: aquele que acha que tanto faz se o petróleo nacional é explorado pela nação ou pelos inimigos desta mesma nação – pois é isso o que são multinacionais, daí o seu nome, que descreve o seu caráter imperialista, antinacional.
Mas, segundo o sr. Haroldo Lima, a nacionalidade da empresa que explora o petróleo não tem importância. Ora, um nacionalista que não se preocupa com a nacionalidade das empresas que exploram as riquezas da sua nação é um entreguista - ou seja, o antônimo de um nacionalista. Porém, diz Lima, o que importa é que “os contratos que teriam que assinar salvaguardam precisamente o interesse nacional”.
Os contratos atuais, sob o regime de concessões estabelecido pela lei do petróleo do governo Fernando Henrique Cardoso, dão às empresas estrangeiras todo o petróleo que extraírem. A propriedade das reservas – isto é, do petróleo que ainda não foi extraído – é da União, o que, na prática, não serve para nada. Portanto, o que os contratos NÃO salvaguardam é precisamente o interesse nacional.
O sr. Haroldo Lima omite tal coisa – que é o xis da questão - sem sinal de remorso. E, como já lembramos, foi a sua profícua gestão na ANP que tentou proibir a Petrobrás de arrematar os blocos que quisesse nos leilões, o que daria mais espaço para as multinacionais açambarcarem o nosso petróleo.
Não por acaso, Lima acha que o fato de uma multinacional ter levado cinco blocos petrolíferos no São Francisco é uma prova de que a soberania nacional foi respeitada... Logo no São Francisco, que em outras épocas era chamado de “rio da unidade nacional”!
No entanto, o sr. Haroldo Lima fez duas descobertas importantes: a primeira é que a Petrobrás é uma estatal. Diz ele que “a Petrobrás, a grande estatal construída pelo povo brasileiro, arrematou 27 dos 54 blocos concedidos, exatamente 50% do conjunto”. Ele acha uma vantagem que a Petrobrás haja cedido 50% do que poderia levar a empresas particulares, inclusive uma estrangeira. Mas, há apenas nove meses, em entrevista à revista “Istoé”, Lima havia dito que a Petrobrás não poderia ser a operadora da União no pré-sal porque “em boa parte é constituída de capital estrangeiro ou capital privado”. Ele não considerava a Petrobrás uma empresa estatal, apesar de, ao contrário de outros, não ter explicitado sua posição, exceto desta forma oblíqua. Entretanto, sua conclusão revelava qual era essa posição: era preciso, disse ele, fundar uma empresa estatal para administrar o pré-sal. Naturalmente, tirar a Petrobrás da frente é tudo o que querem a Exxon, a Shell e outras desse naipe.
A segunda descoberta do sr. Haroldo Lima é que a maioria esmagadora do povo deseja que o pré-sal seja explorado pela nação. Implicitamente, é o que ele reconhece quando diz que “o pré-sal é todo no mar. A 10ª Rodada não continha nenhum bloco em mar. Por razões dessa inconsistência, os apoios foram fugindo do chamado movimento pela suspensão da 10ª Rodada”.
A última parte não é verdade – tanto assim que a ANP chamou a polícia para reprimir a manifestação contra a 10ª Rodada, o que resultou em 50 feridos, alguns internados em hospital.
Mas que o controle do país sobre o petróleo da camada pré-sal é uma questão mais candente do que qualquer outra para o povo brasileiro, é verdade.
Não que o sr. Haroldo Lima seja a favor do controle nacional efetivo – não apenas formal – sobre o pré-sal. Como ele diz, “não que sejamos contrários a que empresas estrangeiras, devidamente reguladas, estejam em petróleo e gás no Brasil. Isto ocorre em todo o resto do mundo [que “resto do mundo”, Haroldo? Todas as maiores e principais reservas do mundo estão sob controle de estatais.]”.
No mais, a carta de Lima, no caso de não ser apenas por crassa ignorância, é uma demagógica arenga sobre o suposto papel da pequena empresa petrolífera no progresso municipal (!!!). Uma conversa que já era maluquice na década de 30, quando se estabeleceu o consenso de que a única forma de se opor à voracidade dos gigantescos monopólios petrolíferos é através de uma grande empresa pública, estatal. O que a Petrobrás só fez confirmar desde sua fundação por Getúlio Vargas, em 1953.
CARLOS LOPES

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