terça-feira, 22 de abril de 2014

O programa de eventual governo Aécio, segundo o ‘ministro’ Armínio Fraga


Já nomeado ministro da Fazenda pelo jornal O Estado de S.Paulo, o ex-presidente do Banco Central (BC) e hoje banqueiro Armínio Fraga nos revela numa longuíssima entrevista recente dada ao jornalão paulista seu diagnóstico do país e suas receitas para o candidato tucano a presidente da República este ano, senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Por este diagnóstico do Fraga, o Brasil vai mal. Tem baixo crescimento, inflação em alta, déficit de conta corrente, taxa de investimentos estagnada, a de crescimento público idem, principalmente via BNDES que, segundo ele, são créditos dados sem levar em conta a qualidade das decisões e do risco.
Pela ótica de Fraga, o país vai mal também em energia. A Petrobras está asfixiada em seu fluxo de caixa sem o aumento do preço da gasolina, fora a “intervenção” do governo impondo uma política industrial que, segundo ele, não deu resultado. Segundo Fraga, pior é a situação do etanol, prejudicado pela contenção dos preços da gasolina.
Jornal levanta a bola para Fraga chutar no gol
Nossa infraestrutura, para Fraga, virou (sic) um gargalo seríssimo. Mas para ele o pecado mortal mesmo é a perda da credibilidade da política fiscal e a fragilidade do tripé juros-câmbio-superávit. Há ainda a crise do estado da saúde, educação e segurança. No setor de energia elétrica, diz ele, faltou planejamento. A Petrobras foi descapitalizada; as termelétricas pressionaram os custos e as tarifas; a perda de confiança paralisa os investimentos; e o BNDES insiste em emprestar a juros subsidiados. O modelo se esgotou, é preciso mudar, sentencia o ‘ministro da Fazenda’ do Estadão e de Aécio.
O jornal paulista, como faz nessas entrevistas, levanta a bola para Fraga  chutar no gol… – e o jornalão traz uma por semana, aos domingos, de uma ou mais páginas, com ex-dirigentes da economia no tucanato de FHC, com preferência para ex-presidentes do BC. O que fazer já em 2015? Fraga diz. Sem entrar no mérito do seu diagnóstico catastrófico, típico do discurso dominante da mídia. Armínio não se faz de rogado, só esconde o que pensa ou o que contém esse programa deles quando perguntado sobre medidas impopulares, arrocho salarial, corte de gastos, reforma trabalhista, preços congelados, mudanças das regras do cálculo do aumento do salário mínimo e dos benefícios da Previdência.
Vamos às suas propostas:
- restabelecer o tripé juros-câmbio-superávit com metas plurianuais;

- aumento dos juros e do superávit;
- racionalizar a atuação de bancos públicos (sic) para reduzir o prêmio de riscos que o Brasil paga;
- privatizar a infraestrutura via concessão, parcerias público-privadas (PPPs), regulação e execução;
- reforma tributária com simplificação de gastos abaixo ou igual ao crescimento do PIB;

Fraga se recusa a dar um número para o saldo primário. Fala de populismo, diz que só presta assessoria ao senador Aécio, mas que não tem procuração dele e que as medidas impopulares podem ter um custo menor que não tomá-las. Defende o Bolsa Família dizendo que é mentira que vão acabar com ela, mas que no país há, também,  o Bolsa Empresário (não usa o termo, disfarça…), que é preciso discutir para onde vai o dinheiro…
O crescimento, segundo Fraga, vem do investimento em capital e educação, com mais e maior produtividade. Não basta a demanda e sim mais produção, emprego, mais investimento. Ele “acha que estamos bem, é só arrumar a casa”. O que, muitas linhas abaixo na entrevista, contradiz exatamente seu diagnóstico aterrador, pelo visto,  eleitoreiro.
Quando perguntado sobre privatizações em geral, divaga. Prefere falar em concessões na infraestrutura e que precisamos dar qualidade aos investimentos, em saúde, educação e segurança. Perguntado sobre o salário mínimo, diz que “cresceu muito ao longo dos anos”. Não só o salário mínimo, “mas os salários em geral”, observa. Dizendo, no entanto, que não tem uma receita pronta nem para o salário mínimo e muito menos para a reforma tributária, as desonerações e os preços congelados, tenta justificar que não vai incursionar por aí porque este é o “terreno da política” onde ele não se sente “à vontade”.
Não se conformam, eles querem acabar com o MERCOSUL
Depois desanca a política externa dos governos Lula e Dilma Rousseff. Defende a necessidade de acordos bilaterais, o fim das relações com “Cuba e outros exóticos”, e prioridade a Europa, Estado Unidos e China. Nesse ponto retoma o discurso tucano para acabar com o MERCOSUL, dizendo ser preciso repensar o Bloco, trocando a união aduaneira por um tratado de livre comércio. De resto, propostas já antecipadas pelo candidato  Aécio, ainda na semana semana, em conferência em Porto Alegre.
Apesar da manifesta simpatia pela Organização Mundial do Comércio (OMC), por seu diretor-geral, o diplomata brasileiro Roberto Azevêdo, e por acordos multilaterais, diz que a tarefa é difícil e critica os Estados Unidos sobre a agenda agrícola e antidoping. Depois faz a tradicional defesa da autonomia do BC, por lei, com o mandado fixo – a chamada autonomia operacional – já que as metas sao decididas pelo governo, via Conselho Monetário Nacional (CMN). Aliás, essa autonomia também foi defendida, ontem, pelo presidenciável do PSB, Eduardo Campos.
Várias vezes na entrevista, Fraga volta a carga contra o BNDES, contra os subsídios, contra o que falta de transparência do banco e diz que seu papel “será menor” e que a “maioria das atividades não precisa de subsídios”, mas de “ambiente bom para trabalhar”. Para ele “subsídio aumenta o juro para o não favorecido”.
Quando chega ao tema de indústria, desconversa e não diz nada. Apenas que precisa atacar problemas de “infraestrutura, tributários e a integração com as cadeias globais”, dizendo ser “natural” o crescimento do setor de serviços. Afirma que não tem medo dessa área – industrial -, mas vê muitas dificuldades. No final se coloca à disposição de Aécio Neves.
Nada sobre o povo. Governo Aécio não teria povo
Relendo as propostas de Armínio e deixando de lado o fato que ele desconsidera todos os avanços e transformações dos últimos 12 anos, constatamos que não se trata de um programa de governo, e sim da velha, tradicional e já fracassada política ortodoxa de ajuste econômico. Não é um programa para uma nação em desenvolvimento e para o Brasil do século 21. Não há uma palavra sobre a reforma política ou do Estado, sobre a distribuição de renda e inclusão social, condições para o nosso desenvolvimento e crescimento. Nada sobre o povo. Tudo indica que este não existiria, nem contaria num governo Aécio.
Quando fala desse tema é para classificar a distribuição de renda e a inclusão social como “ainda muito ruim” e que o atual modelo falha no crescimento e na distribuição de renda. Mas não se esquece de propor salários e gastos sociais menores e um tarifaço. E propõe aumento dos juros e do superávit, aquela velha receita que já conhecemos e sabemos que leva a recessão e ao desemprego.
Sobre a reforma agrária, sobre o seu caráter regressivo, social e regional, nenhuma palavra. Nada, também, sobre como melhorar a saúde e a educação, onde avançamos, e muito, na última década. Sobre a infraestrutura, nenhuma proposta que não esteja na agenda do atual governo. E na política externa propõe um retrocesso – a volta à área de influência e hegemonia dos Estados Unidos, aos tratados de livre comércio (TLCs)  e ao fim da integração regional.
Sobre o câmbio e protecionismo, nada; sobre a política industrial, nada; sobre como aumentar a poupança e os investimentos, nada. Em síntese, seu programa – que é, na verdade o do Aécio, de um eventual governo tucano se voltasse – toda a longa entrevista é permeada por uma questão: a confiança dos mercados. Só. A mesma que levou ao Brasil do FHC em 2002 – falido, sem crédito externo, com altas de taxas de inflação, desemprego, um país sem autoestima e sem rumo. No fundo, bem tucano. O Brasil daquele 2002 e o Brasil que Fraga desenha para um eventual governo Aécio. No qual, pela ótica dele, tudo se resolverá com austeridade e choque de gestão.

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