terça-feira, 3 de maio de 2011

Copom faz terrorismo com a inflação por juro “prolongado”

Órgão do Banco Central diz que os juros devem subir por causa das “incertezas”


A última ata do Comitê de Política
Monetária do Banco Central (Copom), publicada no dia 28, sintetiza assim, em seu parágrafo 30, as suas conclusões: “O Copom entende, de forma unânime que, diante das incertezas quanto ao grau de persistência das pressões inflacionárias recentes, e da complexidade que envolve hoje o ambiente internacional, o ajuste total da taxa básica de juros deve ser, a partir desta reunião, suficientemente prolongado” (grifo nosso).
“Incertezas”? “Complexidade”? “Ajuste total”? “Suficientemente prolongado”? Nenhum empresário, nenhum trabalhador, nenhum cidadão do país tomaria a decisão de quebrar a sua empresa, sacrificar a família ou morrer de jejum porque não sabe o que vai acontecer, ou porque as coisas são muito “complexas”. No Brasil, somente o Copom/BC faz isso – e com toda a economia nacional.
Por que aumentos de juros, e juros altos “prolongados”, se o BC não tem certeza alguma sobre a “persistência” das supostas “pressões inflacionárias”? Naturalmente, porque o objetivo desses aumentos de juros não é combater a inflação.
O que o BC está fazendo é aumentar ainda mais os atrativos (isto é, o diferencial de juros em relação aos EUA e outros países onde os juros estão negativos) para que bilhões de dólares desvalorizados invadam ainda mais a nossa economia, hipervalorizem o real, e, com essa monstruosidade cambial, dando um subsídio, aliás, aumentando o dumping cambial a favor das mercadorias importadas. Em suma, o BC está devastando a indústria, portanto o crescimento, tanto pela ação direta dos juros, quanto pela ação do câmbio aberrante que esses juros provocam.
Para isso, recorre pura e simplesmente ao terrorismo. Vejamos a terrível inflação que é o tema dos dois primeiros parágrafos da ata:
“A inflação medida pela variação mensal do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) situou-se em 0,79% em março, depois de registrar alta de 0,80% em fevereiro. Assim, a inflação acumulada nos últimos doze meses alcançou 6,30% em março (6,01% em fevereiro e 5,99% em janeiro), 1,13 ponto percentual (p.p.) acima da observada no acumulado em doze meses até março de 2010. O aumento da inflação nesse período refletiu, basicamente, o comportamento dos preços livres, que variaram 7,04%, enquanto os preços administrados se elevaram em 4,53% (4,67% no mesmo período de 2010). Especificamente sobre os preços livres, cabe destacar que a variação dos preços dos bens comercializáveis alcançou 6,04%, e a dos não comercializáveis, 7,93%. A inflação no setor de serviços continua em patamar elevado e, no acumulado em doze meses até março, atingiu 8,53%, maior variação desde agosto de 1997. Em síntese, o conjunto de informações disponíveis sugere que a aceleração de preços observada em 2010, processo liderado pelos preços livres, mostra persistência”.
Entretanto, apesar dessa anunciação do apocalipse, a inflação está dentro da meta definida pela Fazenda e pelo BC no Conselho Monetário Nacional. Então, qual o significado dessa diarreia vocabular na ata do Copom? Vejamos a publicação do IBGE de onde o Copom extraiu os números acima.
 
Constata o IBGE que o aumento no IPCA de março foi devido, em mais da metade, aos transportes (+1,56%) e aos alimentos e bebidas (+0,75%). Quanto ao último item, houve redução nos aumentos desde janeiro, e, no caso das carnes, redução de preço (-2,81% em fevereiro e -1,42% em março). Em relação ao ano passado, a própria ata do Copom menciona que “a alta observada no grupo alimentação e bebidas ficou abaixo da inflação observada para esse grupo entre janeiro e março de 2010”.

Quanto aos transportes, “destacaram-se as passagens aéreas que (…) tiveram aumento de 29,13%. Lideraram assim, a relação das principais contribuições individuais [ao aumento no preço dos transportes]” (cf. IBGE, “Índices Nacionais de Preços ao Consumidor IPCA e INPC”, grifo nosso).

Devemos convir que um aumento dos transportes “liderado pelas passagens aéreas” está longe de ser uma tragédia para o controle da inflação. As outras “pressões inflacionárias” neste item foram:

1) três reajustes (em Curitiba, Fortaleza e Porto Alegre) dos ônibus urbanos, que, mesmo assim, tiveram “o ritmo de crescimento de preços reduzido de 1,30% para 0,95%” (cf. IBGE, op. cit.);

2) alguns outros reajustes, com peso quase insignificante no cômputo geral: ônibus intermunicipais (SP e PR), metrô de São Paulo e trens (SP e RJ);

3) o aumento de preço do etanol (+10,78% em março), que contaminou a gasolina (+1,97%).

Quanto aos reajustes dos ônibus urbanos, é óbvio que eles não se repetem a cada mês. Quanto ao etanol, os juros não vão combater o que é uma consequência da monopolização e desnacionalização da sua produção – o mais provável é que os monopólios repassem qualquer aumento de custos aos preços. A única solução para esse problema é combater a monopolização e a desnacionalização – ou, dentro em breve, estaremos reféns de alguns gangsters externos do etanol, se é que já não estamos.

Com isso, leitor, não estamos dizendo que a inflação não existe. Mas o que o Copom/BC está fazendo é mero terrorismo inflacionário para aumentar os juros. Nada tem a ver com a inflação real.

Voltando aos alimentos, a principal origem dos aumentos de preços é externa – a especulação nas bolsas dos EUA. Aqui, a solução é reconstruir as defesas contra a especulação externa, vale dizer, sobretudo, estoques reguladores sob controle do Estado. Como pode o país viver à mercê de alguns achacadores que nunca viram um tomateiro, mas determinam, à distância, o preço do tomate?

No entanto, o que diz o Copom/BC? O seguinte: “riscos baixos para a inflação subjacente no curto prazo tendem a reduzir incertezas em relação ao comportamento futuro da inflação plena. (…) riscos baixos para a inflação subjacente no curto prazo tendem a potencializar os efeitos das ações de política monetária [i.é, do aumento de juros]”.

Inflação “subjacente” é aquela que é expurgada dos itens que tiveram maior aumento de preços. Portanto, o BC está pregando (e praticando) que se reprima a demanda (isto é, que se force a redução do consumo) daqueles itens que não influenciaram o aumento da inflação, pois sabe que o aumento de juros é inútil para combater os aumentos de preços reais, o aumento da inflação real. De passagem, a ata diz que “um risco importante reside na possibilidade de concessão de aumentos de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade e suas repercussões negativas sobre a dinâmica da inflação”.

Como qualquer trabalhador sabe, não existem “aumentos de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade” porque os empresários não são malucos – nem o governo. Portanto, o BC está, simplesmente, pregando o arrocho salarial.

Em suma, como os juros não têm efeito algum sobre o que realmente determina a inflação, que o povo consuma menos o que não tem relação com a inflação.

Naturalmente, isso não resolve qualquer problema, mas eles acham que o índice de inflação fica uma beleza - às custas do arrocho e sofrimento da população. E, antes de tudo, os bancos, com juros maiores, ficam com os cofres mais cheios.

CARLOS LOPES

Nenhum comentário: